Enseada e aterro da Maxaquene - as elevações do Paiol entre 1918 e 1920 (4/16)

Continuaremos as falar da enseada da Maxaquene e do seu aterro. Tenho agora à disposição três novas fotos da ARPAC (no facebook) da pasta “Maputo Cidade XI, Monumentos e Locais Históricos” que são muito interessantes. A interpretação do conjunto não é fácil e num artigo seguinte tocamos ao de leve na análise dos mapas desta zona ao longo dos tempos. 
A primeira das novas fotos vale muito mais que as tradicionais "mil palavras" principalmente porque nunca tinha visto nada semelhante (clique nas fotos para aumentar):

FOTO 1 (ARPAC)
Estado dos trabalhos do aterro da praia da Maxaquene em 15-3-1920

A FOTO 1 mostra a barreira da Maxaquene à direita e a Baixa da cidade para o fundo. Vê-se o resultado dos trabalhos relacionados com o aterro de que se conheciam relatos escritos e que se não estavam terminados estavam quase. Essa é a zona plana que fica abaixo da barreira da Maxaquene mais a ocidente = poente = oeste e que confina, tendo a separá-las a Av. Elias Garcia/Augusto de Castilho/actual Lenine, com a zona também em declive da Villa Jóia e do Jardim Botânico. Como se pode ver na FOTO 7 em baixo parte da nova superfície plana criada ao fundo da FOTO 1 veio depois a ser ocupada pelos recintos desportivos do Grupo Desportivo e do Sporting LM/CD Maxaquene, englobando desde a piscina do primeiro mais a oeste até ao seu campo de futebol mais a leste (ver aqui a zona em fotos antigas e modernas). 

FOTO 1 (ARPAC) com marcas (aproximadamente)
Amarelo: Paços do Concelho de 1901
Losango branco: onde esteve a colina com o paiol
Círculo verde: vagão para as obras do aterro
Roxo: ver em baixo na MONTAGEM 5, FOTO Y
Traços brancos: onde havia elevações de terra que foram removidas
 nestes trabalhos criando uma escarpa (aproximadamente)
Laranja: onde havia escarpa alta que foi escavada (aproximadamente)
Castanho escuro: ver explicação em baixo
Na FOTO 1 vê-se dentro do círculo verde um vagão e notam-se carris na sua direcção. Foi uma instalação de via férrea feita únicamente para o transporte da terra e pedra removida das elevações pré-existentes na zona para serem utilisados no aterro da antiga enseada.
Com as três imagens seguintes podemos ver o que existia antes dos trabalhos efectuados na barreira cujo resultado aparece na FOTO 1, tomando como referência principal o paiol construído sobre uma pequena colina:

MONTAGEM 2
Amarelos: Paços ou a posição aproximada onde foram depois construídos
A.a vista da barreira da Maxaquene para a Baixa, não havia os Paços
B vista da barreira da Maxaquene para a Baixa, já havia os Paços, depois de 1901
A.b vista da zona baixa para a barreira com o Paiol, não havia os Paços

Uma parte do aterro da Maxaquene aparece do lado esquerdo da FOTO 1 mas a maior parte dele será vista na FOTO 3 que deve ter sido tirada na mesma ocasião e do mesmo ponto da barreira. A FOTO 3 será assim uma vista da barreira em 1920 olhando para a zona de ligação entre o estuário e a baía, vendo-se aí no horizonte mais à esquerda o que veremos neste artigo é a muralha de protecção exterior da doca de pescadores (depois do CPD), ao centro a entrada nessa doca e do centro para a direita e um pouco mais baixo o muro de suporte do aterro.

FOTO 3 (ARPAC)
Vista da barreira para sudeste com o aterro já bastante seco e nivelado 
e limitado ao fundo pela doca de pescadores e pelo seu muro de suporte

Vê-se na FOTO 3 à direita uma locomotiva que pela direcção que leva não deve ser da linha da Polana que antes do aterro seguia junto à barreira e depois passou a vir na direcção da futura Av. da República, actual 25 de Setembro mais ou menos a meio da largura do aterro entre a barreira e o muro de suporte. Como também vimos um vagão na FOTO 1 é natural que fosse uma das locomotivas transportando material retirado da barreira para o aterro.  
Na zona em torno do Paiol vista nas FOTOS 1 e 2 os trabalhos de remoção de terra e pedra para utilização no aterro foram importantes (marca branca). Para oriente deles = lado de cá escavou-se substancialmente a escarpa alta existente (marca laranja) e segundo Lisandra Franco de Mendonça foram também feitos trabalhos de consolidação no resto da barreira, presumo que para melhorar a segurança e a paisagem (marca castanha). Na FOTO 1 na zona marcada a castanho ou na FOTO 3 que cobre a barreira (escarpa) para o lado nascente parece não ter havido intervenção humana recente, olhando para a vegetação na barreira e para as árvores na base desta, pelo que se devia estar, em relação à FOTO 1 para cá da zona marcada a laranja,
Na FOTO 3 parece ainda que uma parte da barreira estava saliente para o lado do aterro e que por isso só terá sido cortada depois. Nestas fotos a zona castanha terá então sido mais de consolidação do que de escavação mas é difícil  dizer exactamente onde e quanto aconteceu. No artigo seguinte vê-se a barreira numa foto de 1920 pelo lado do estuário o que também parece mostrar que a área mais fortemente intervencionada, tanto respeitante às colinas em torno do paiol como à barreira, foi para o lado ocidental que vimos na FOTO 1.
A nova foto de baixo mostra o aterro em execução mas em situação muito anterior à vista na FOTO 3.

FOTO 4 (ARPAC)
Vista da barreira para o estuário sobre a enseada/aterro mais ou menos na direcção sul

Na FOTO 4 temos a enseada murada pelo muro de suporte ao fundo com partes mais ou menos aterradas. Em primeiro plano notam-se claramente superfícies mais profundas e que parecem ainda húmidas por isso nem drenadas nem aterradas.
A FOTO 4 complementa quase perfeitamente para o lado direito = poente = da Baixa a FOTO 4 do artigo anterior e tal como ela deve também ser de Novembro de 1918. Mas comparando a FOTO 4 (ARPAC) que será de 1918 com a FOTO 3 que é de 1920, olhando para a zona junto ao muro de suporte na FOTO 4 o aterro parece mais adiantado (vê-se menos o muro de suporte) enquanto que devia estar aí mais no início. Explicação mais plausível será ter-se feito aterro para oeste (o que se vê na FOTO 4) primeiro do que para leste (o que se vê na FOTO 3). Em relação ao aterro mais próximo da barreira, ele estava ainda com água na FOTO 4 enquanto que parecia mais adiantado na FOTO 1, pelo que aí a evolução coadunava-se melhor com as datas das fotos (a FOTO 1 é mais de um ano posterior à FOTO 4).

Voltamos agora à zona mais ocidental sob a barreira da Maxaquene que vimos no início deste artigo. O objectivo da montagem seguinte foi representar na foto do GE recente da zona (Z), a partir da FOTO 1 (X) e doutra de Lisandra Franco de Mendonça mostrada no artigo anterior (Y), onde ficou o limite da barreira depois destes trabalhos de 1920. Dá-me a impressão que numa fase posterior dos trabalhos (ou noutros feitos separadamente) se terá suavizado o declive da escarpa que surgiu à direita da FOTO 1 (ou X) porque nas traseiras actuais das instalações do Desportivo há uma transição gradual entre as partes plana e a mais elevada que depois se liga gradualmente, embora com maior inclinação, à parte alta da barreira agora existente.    

MONTAGEM 5
Amarelo: Paços do Concelho
Losango preto e branco: Paiol
Cinzento: primeira fase de remoção de elevações junto ao paiol
Roxo: limite da primeira fase de remoção de elevações
Branco (junto à barreira): escarpa criada pela escavação das elevações junto à barreira e/ou limite da escavação da escarpa onde ela já existia,
 posteriormente aos trabalhos do Cinzento-Roxo
Traços paralelos brancos: zona agora plana onde estiveram 
elevações originais que foram removidas 
Laranja: zona onde havia barreira e foi escavada, aproximadamente
Castanho escuro: zona onde a barreira foi principalmente consolidada 
Rosa: um dos diques internos construídos no início dos trabalhos do aterro
Vermelho: Prédio 33 no lado de cá = leste da
 Av. Lenine antiga Elias Garcia/Augusto de CastilhO

Relativamente às marcas Cinzento-Roxo da MONTAGEM 5 duma primeira fase da remoção das colinas, via-se na FOTO B da MONTAGEM 2 de cima que parecia ter já sido removida uma parte da do Paiol pois naturalmente ela não teria um fim tão abrupto. Nota-se agora na FOTO Y da MONTAGEM 5 que essa escavação tinha prosseguido tendo-se atingido o limite antes de se ter de demolir o Paiol. Dá ideia que se foram removendo as elevações para nascente do Paiol deixando-o o máximo de tempo possível em pé e que só quando foi preciso obter o grande volume de terra para se completar o aterro - que recebeu também terra de dragagens feitas no estuário e baía - é que as elevações do paiol e para oeste dele foram removidas e o paiol foi lógicamente demolido. Quanto aos trabalhos de consolidação da barreira mais afastados dessa zona é natural que não tenham sido muito importantes dado o foco ter sido fazer-se o aterro e ao obter-se a terra suficiente para ele deve-se ter parado o esforço.
Para complementar as ideias de cima do que foi removido das elevações e da barreira para se fazer o aterro e de que pode não ter sido feito numa só fase, temos mais uma montagem de duas fotos já conhecidas onde aparecem a barreira, as elevações próximas, os Paços do Concelho e o Paiol. A primeira foto é da enseada como existia anteriormente ao aterro (foi tirada aproximadamente onde havia a praia do Albasini mas já se tinha feito um muro na costa) e a segunda de quando a sua execução estaria ainda na fase inicial. Essa fase inicial foi provávelmente de 1915 quando penso se construiu o muro de suporte até cerca de digamos o início de 1918, periodo em que principalmente se terá tratado de drenar a enseada e não terá sido necessário grande volume de terras. Só na fase subsequente entre 1918 e 1920 se terá aterrado em larga escala e terá sido necessário remover completamente as elevações, operação que como se viu na FOTO 1 parecia estar muito adiantada em Março de 1920. 

MONTAGEM 6
Amarelos: Paços do Concelho
Seta preto e branco: para onde estaria o paiol mas não se vê na foto
Losango preto e branco: por cima do Paiol
Roxo e cinzento: como nas imagens anteriores, resultado do que terá sido 
uma primeira fase de remoção das elevações
Branco: elevações junto à barreira que foram removidas numa
 segunda fase também até ao nivel da ilha inicial da Baixa
Laranja: zona em que a barreita foi escavada (aproximadamente)
Castanho: zona em que a barreira natural foi principalmente consolidada
Na última imagem deste artigo podemos ver de cima da barreira a zona frente aos Paços do Concelho onde esteve o paiol e que da esquerda da foto até ao muro que a divide passou a ser do Grupo Desportivo Lourenço Marques. A foto é anterior a 1929 e pouco se deveria ainda ter alterado no local depois dos trabalhos que vimos na FOTO 1 aparentemente a concluírem-se em 1920.


FOTO 7
Amarelo: Paços do Concelho
Losango preto e branco: projecção para o solo do local
onde esteve o paiol, aproximadamente
Roxo e cinzento: zona donde foram removidas elevações numa primeira fase
Branco: zona donde foram removidas elevações na fase final dos trabalhos
Azul: Capitania e armazém
Rosa: zona que foi aterrada para sul das traseiras dos Paços até ao muro de suporte 
e para poente = oeste daí até à Capitania / Inamar.
Vermelho: bombeiros onde está actualmente o Prédio 33 indicando o limite 
para poente = oeste na direcção norte-sul até onde estes trabalhos foram
Resumindo este artigo, vimos aqui três imagens novas e a partir delas tentamos perceber melhor o que já se sabia ter acontecido ou seja como se removeram as elevações (provávelmente começando por usar dinamite) entre a zona ocidental da barreira e a Baixa para se obter uma parte do material de enchimento para o aterro da Maxaquene, um dos maiores trabalhos públicos efectuados no início do século XX (20) em Lourenço Marques, actual Maputo.
Ver aqui mais informação e fotos sobre o PaiolSobre este assunto ver também as teses de doutoramento de Lisandra Ângela Franco de Mendonça e Teodoro Cândido Vales referidas.

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