Compagnie Générale d'Eléctricité - central geradora da Baixa, local antigo e actualmente (2)

Já conhecemos a FOTO 1 que é dum original de Lu Shih Tung. Tem vista para norte e foi tirada da Baixa para a alta da cidade em 1955 e mostra o escritório e o pavilhão principal da central geradora da Compagnie Générale d’Eléctricité (CGd'E) de Lourenço Marques, actual Maputo. Essas instalações situadas na baixa frente à Av. Manuel de Arriaga, actual Marx pertenceram à primeira central geradora de electricidade da cidade e falámos primeiro delas no artigo anterior. 

FOTO 1
Verde médio: Av. Álvares Cabral, actual Manganhela 
vista de oeste = poente = esquerda para leste = nascente = direita
Laranja claro: actual Av. Marx
Vermelho: (telhado do) edifício do escritório da CGd'E
 na esquina noroeste do cruzamento das duas avenidas
Azul: pavilhão principal da central geradora
Vamos agora começar por conhecer melhor o que se passou no sector da electricidade na cidade combinando informação da investigadora universitária Idalina Baptista (página da Universidade) , da tese de V. Zamparoni (capítulo 5.2 LUZ NAS TREVAS) a quem já nos referimos e outros dados.
Complementando o que se disse no artigo anterior a Compagnie Géneralé d'Electricité de Lourenço Marques (CGd'E) passou a ser em 1897 a concessionária para o fornecimento de energia eléctrica e para a iluminação pública em LM. Essa concessão dava exclusividade no fornecimento de luz eléctrica (presumo que quer dizer de electricidade sem distinção do uso) dentro dos limites da cidade e a autorização para fornecer energia às indústrias mas estas podiam produzir para consumo próprio. 
Em 1899, cerca de um ano depois da entrada ao serviço da central e da rede de iluminaçáo pública, Montague Jessett escrevia no livro "Delagoa Bay: A key to South Africa" sobre a electricidade em LM e a localização da CGd'E: "The company has got its works upon part of the space formerly occupied by the swamp, which does not appear to affect materially the health of those employed on the staff of the company". E aparentemente sobre a rede de iluminação pública também incluída na concessão e provávelmente sobre a concessão em geral escrevia: "Lourenço Marques has now an excellent electric light installation, and can vie in this respect with any South African town. The concession is in the hands of a French company called the Compagnie Generale d'Electricite de Lourenço Marques, who will doubtless do extremely well out of this in the future. Electric lighting is a great boon to a town (HoM: antes eram usadas lâmpadas a petróleo e houve uma pequena experiência com lâmpadas a gás na praça 7 de Março). ... Upon taking a walk through the town after sundown, one observes the change in the lighting of the streets, all of which are now well lit up with the electric light. The French company, which has got a concession, appears to be doing its work well, and has extended its operations right up to the end of Reuben Point (Ponta Vermelha).
De notar que um Comandante ou Major Campbell teve uma disputa com o Estado português (ver aqui) o qual para a solucionar propos-lhe em 1912 a concessão de electricidade em LM. O Estado aceitaria que o Major vendesse a concessão à sociedade «African Agricultural Estates Limited» e a receita serviria de indemnização do seu prejuizo inicial mas essa venda não se concretizou pelo que Campbell acabou por receber outra concessão não relacionada com electricidade. Ora esta situação aponta a que em 1912 a concessão de electricidade da DBDC (que a tinha adquirido em 1910 à CGd'E segundo Idalina Baptista) podia estar em risco ou de ser cancelada ou de entrar em concorrência com outra. 
V. Zamparoni dá ideia de dificuldades no desempenho da concessão da DBDC até ao final dos anos 10 e depois de uma melhoria a partir dos anos 20 no texto seguinte: "Até o final dos anos dez, a iluminação era extremamente precária, interrompia-se várias vezes por dia e os usuários reclamavam contra a baixa potência da energia particular e pública. O serviço parece ter melhorado nos anos vinte e trinta pois, segundo o Anuário de Lourenço Marques, em 1932, a iluminação pública estendia-se por cerca de 30 km de ruas, tendo mais de 1.200 postes com uma lâmpada, vários com mais de uma e cerca de 20 mil lâmpadas de 30 watts instaladas em casas particulares, tornando-a tão ou mais bem iluminada do que muitas cidades sul-africanas e européias de igual porte. Desnecessário dizer que tal benefício concentrava-se nas áreas da cidade de cimento, cujos moradores podiam pagar a taxa mínima obrigatória de 6 shillings e 3 pences, o que equivalia a Esc. 31$25 por mês, em 1932"". 
A esse respeito Idalina Baptista informou também que a CGd'E (com a sua concessão) foi adquirida em 1910 pela concessionária dos carros eléctricos DBDC. Como esta tinha uma central própria desde 1903/04 na Av. 24 de Julho decidiu passar para lá toda produção em 1912 pelo que esta central da Baixa deixou de funcionar nesse ano. Suponho no entanto que no local tenham continuado parte dos serviços concessionados da electricidade e/ou das águas da DBDC e que em 1947 esses terrenos tenham sido adquiridos à DBDC pelos Serviços Municipalizados de Água e Electricidade (SMAE), ao final da concessão mais os dois anos em que tinha sido prorrogada. 
Relembramos com a bem conhecida foto de entre 1901 a 1910 duma fábrica que se concluiu ser a central geradora da CGd'E e em vista para nordeste (ver também aqui e onde no ponto 4 expliquei os princípios das máquinas a vapor).  

FOTO 2
Verde médio: Av. Manganhela, antiga Álvares Cabral
Verde claro: ala nascente do Mercado Municipal
Azuis: pavilhões iniciais da central
Branco: pavilhão adicional da central mais recuado
Preto: chaminé da central
Laranja escuro: torre de arrefecimento
Laranja claro, à direita: Av. Marx, antiga Central e depois Manuel de Arriaga
Podemos observar nos mapas de 1915 e de 1925 que a central (rectangular) aparece com tamanhos diferentes mas fica-se com a ideia geral de como era constituida. O edifício do escritório que ficava na esquina aparece na posição e tamanho correctos. 

Mapas de 1915 e 1925
Círculo preto: posição da chaminé da central estimada a partir da FOTO 2
Círculo castanho: posição da torre de arrefecimento, idem
Laranja escuro: direcção da chaminé à rua mais próxima, Av. Manganhela
Vermelho (Y): escritório da CGd'E
Verde médio: actual Av. Manganhela
Laranja claro: actual Av. Marx
Azul: pavilhões da central frente à actual Av. Marx
Carmesim (à esquerda): actual Av. Magaia
Rosa: Rua da Electricidade
Verde claro: ala nascente da fachada do Mercado
O mais importante é podermos ver como os pavilhões da central frente à actual Av. Marx se expandiram nos dez anos de intervalo entre os dois mapas, notando-se que no de 1925 surgiu um acrescento entre o pavilhão inicial que ficava mais a norte da parcela e o edifício do escritório na esquina.
A partir destes mapas e da observação das fotos tentei marcar na imagem do Google Earth de 2005 onde teria sido a central completa do inicio do século XX (20) que se via na FOTO 2. Escolhi 2005 porque ainda o terreno estava vazio antes de em 2007 se ter aí iniciado a construção dum parque de estacionamento que veremos ao fundo. Em medalhão coloquei outras imagens antigas da central geradora e a legenda para o que nao explicito será também a mesma da dos mapas de cima:

FOTO 3 (inclui parte relevante da FOTO 2)
Azul: dois primeiros pavilhões da central como era na FOTO 2 e mapa de 1915. 
Já vimos que em 1925 chegava mais perto do edifício do escritório
Branco: pavilhão separado da central 
que não está desenhado nos mapas mas que se vê nas fotos
Vermelho (Y): escritório da CGd'E
Outra foto gentilmente cedida por Fernanda Simões mostra a central geradora também vista do lado do mercado nos anos 50. Pode-se ver aqui o edificio do escritório na esquina mais claramente do que na FOTO 2 pois a FOTO 4 foi tirada de posição mais elevada:

FOTO 4
Azul e branco: pavilhões da central geradora
Vermelho: escritório da CGd'E
Verde médio: actual Av. Manganhela
Laranja claro: actual Av. Marx
O (muito provável) local do escritório da Compagnie Générale d’Eléctricité de Lourenço Marques (CGd'E) e da primeira central geradora eléctrica da cidade foi convertido no recente parque de estacionamento automóvel que se vê em baixo, o qual fica na esquina a noroeste do cruzamento das actuais Av. Marx (que sobe para a alta da cidade) com a Av. Manganhela (que é paralela ao estuário).

FOTO 6
em primeiro plano: antigo Prédio Ja Assam (aqui e aqui)
ao fundo à esquerda: novo parque de estacionamento automóvel
Suponho que o terreno do parque de estacionamento devia pertencer ou à EDM, sucessora de parte dos antigos SMAE ou ao Conselho Municipal, o proprietário dos antigos SMAE. Lamentávelmente a EDM no site não dá informação sobre os primórdios da sua rede mas certamente deverá existir informação escrita do tempo português que poderá validar ou não estas ideias e que deveria mercer a atenção dos estudiosos.

Num artigo seguinte especularei sobre como teria sido feito o fornecimento do carvão mineral que alimentava esta central.

Comentários