Num artigo anterior lembramos que um porto moderno é o culminar de avanços e saberes técnicos acumulados ao longo de séculos e aplicados num local e contexto operacionais muito específicos. Condições naturais não chegam e por exemplo é preciso dragar periódicamente sem o qual o porto ficará limitado em termos do calado de navios que dele se podem servir, ou se a profundidade diminuir em relação ao registado nas cartas os navios podem (ou podiam) encalhar. Assoreamento devido aos materiais trazidos pelos rios a montante para o estuário do Espírito Santo aconteceu no porto de Lourenço Marques por volta de 1907 o que levantou protestos das "forças vivas" e talvez seja a justificação para vermos a FOTO 1 em baixo com uma draga de aspecto moderno e poderoso.
FOTO 1
Draga Matolla cerca de 1910 no estuário do Espírito Santo Foto via delagoabayworld.worldpress.com |
FOTO 2
O plano hidrográfico é um elemento fundamental para a operação dum porto pois indica as medições de profundidade do leito do mar. Para a zona entre a entrada no estuário e o início do cais sublinhei no plano de baixo o mais importante.
Antes de haver a ponte de cais de Lourenço Marques os navios de carga amarravam ao largo e as mercadorias tinham de ser transbordadas para barcaças que acostavam depois em pontões para descarregar, o que duplicava o trabalho e era muito mais lento, custoso e perigoso para a carga e pessoal. Só com a construção do cais Gorjão no estuário puderam os navios principais atracar e descarregar/carregar directamente.
Passando para a actualidade e modernos meios tecnológicos marquei na imagem do Google Earth (GE) o que me pareceu ser a zona mais profunda, quer dizer a mais escura.
Nesta imagem do GE nota-se bem pela cor mais arenosa onde se acumulam as aluviões trazidas pelos quatro rios (Tembe, Matola, Umbeluzi e Infulene) que desaguam no estuário (o rio Maputo desagua na baía fora do estuário fluindo de sul para norte passando pela Bela Vista). O que parece ser a zona mais profunda do estuário no GE como é natural fica mais ou menos no ponto intermédio entre as suas margens mas depende também da forma delas e do fluxo das águas.
Comparando-se as linhas azuis escuras de maoir profundidade no GE (aparente) e no plano hidrográfico (registada) vê-se que são mais ou menos semelhantes. Isso quer dizer que é mais ou menos por um canal centrado nessa linha que os grandes navios devem circular no estuário e por isso onde as dragas devem limpar para manter a profundidade do leito do estuário (pois não adianta andar a dragar onde não vão passar navios).
Iniciou-se recentemente um grande trabalho de dragagem do porto de Maputo no valor de 115 milhões de dólares de que temos as imagens em baixo. |
Uma draga moderna e
suponho o navio auxiliar.
Cidade da Matola para as costas, resto do estuário com a saída para a baía para o fundo Cidade de Maputo à esquerda, Catembe à direita |
FOTO 5
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Na foto de cima o canal a dragar para a baía fica em frente. A cidade de Maputo e a ponte de cais
do seu porto estão à esquerda (para norte).
Informação de 1959 | |
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Comentários
Quanto ao assunto, Draga "Matola", da draga existente em 1910, não sei qual e quando foi o fim dela. Sei que em 1952, foi construída nos estaleiros da Sociedade Comercial Solma, Lda, para substituir a anterior. Porém em 1959, foram construídas, uma nova draga "Matola" e uma outra a "Búzi", no estaleiro naval da CUF. Segundo julgo saber, durante a guerra colonial, houve a ideia de afundar essa draga, no canal de acesso ao porto de Lourenço Marques ou da Beira. Penso que nada disso aconteceu mas, desta e da anterior nada mais sei.
Cumprimentos,
João Celorico
Tenho outro artigo sobre o Cais de Minérios da Matola aqui: https://housesofmaputo.blogspot.com/2017/09/porto-de-lourenco-marques-cais-de.html
O que me fez vir aqui, foi a busca sobre uma draga "MATOLA". Fui surpreendido pela existência duma, construída em 1952 e fiquei a saber que já em 1910, haveria outra. Como participei na construção doutra, construída em 1959, fiquei curioso de saber mais alguma coisa.
Como também informei, embora tenha cometido um lapso relativamente à inauguração oficial do cais da Matola, foi em 1964 e não em 1965. Não tenho fotos nem posso lembrar realmente como estava o cais, com alguns armazéns. Só recordo que largámos do Cais Gorjão, cerca das 07.00h rumo e cerca 08.00/09.00, no cais apareceu o Presidente da República, em passo de corrida e retornámos ao Cais Gorjão.
Dei uma vista de olhos pelos links que me enviou e posso dizer que há uma incorreção quando, em "PORTO DE LM em funcionamento", onde se mostra uma foto dizendo que "O navio Angola da CNN da foto acima foi construído em 1948".... O facto é que este navio "ANGOLA", é o 3º deste nome e que em 1948, tomou o nome de "NOVA LISBOA". Portanto, esta foto é anterior a 1948.
Mais uma vez, o meu obrigado
JoãoCelorico
No The Ship List encontrei informação sobre esse navio Angola em linha com a sua mas com o pormenor do nome ter sido mudado para Nova Lisboa em 1946, presumo que porque o novo Angola estivesse já em construção.
Quanto à draga Matola, o que você diz da construção duma em 1959 coincide com o artigo que coloquei ao fundo deste artigo e que refere 2 unidades do mesmo tipo inovador encomendadas à CUF para Moçambique (daí o nome Búzi para a outra draga que você refere ser plausível - é o maior rio que desagua na Beira por isso deve ter sido lá colocada).
Como você deve perceber muito mais do tema de portos e navios do que eu, se vir algo mais nos artigos sobre o porto que lhe mereça comentário eu agradecia.
Acerca deste assunto, poderei dizer:
O terceiro, um navio construído em 1912 (lançado à água em 30 de Junho e entregue em Dezembro) nos Estaleiros John Cockerill, Hoboken, Bélgica, com o nome de “Albertville” (também já o quarto com esse nome), para o serviço da Compagnie Belge Maritime du Congo, era já um cargueiro de razoáveis dimensões, com 7.050 tons deadweight, 439,5 pés de comprimento, 55,7 pés de pontal e 37 pés de boca. Tinha acomodações para 164 passageiros em 1ª classe e 136 em 2ª; 2 propulsores; motor John Cockerill, Seraing, de 8 cilindros, 964 bhp, que lhe permitia atingir uma velocidade de 14 nós; dois conveses e um convés de abrigo.
Durante a 1ª Guerra Mundial, foi requisitado pelo governo britânico e utilizado como navio hospital no período de 1914/1915.
Só em 24/4/1923,quando foi adquirido pela CNN, recebeu o nome de “Angola” e após uma completa revisão nos estaleiros construtores, em 16/6/1923 deixou Antuérpia, rumo a Lisboa, ficando então ao serviço da companhia.
No ano dessa foto, 1937, desde Fevereiro a Novembro, o navio “Angola” esteve 8 vezes no porto de Lourenço Marques (4 na viagem ascendente e 4 na descendente).
A última viagem, como “Angola”, terá sido em Agosto de 1945 para ir a Timor, buscar militares e repatriados civis e:
No dia 13 de Fevereiro de 1946, dois dias antes da sua chegada a Lisboa, já se noticiava:
“ O “Angola”, o terceiro navio deste nome da Nacional, e que, quando era belga (1925), se chamava “Albertville”, já não sairá mais do Tejo com aquele nome. Passa a ser “Nova Lisboa”. O futuro “Angola” terá 17.000 toneladas.”
Quanto a portos, pouco saberei. Apenas posso informar que como fazendo parte da tripulação do “Angola”, entre 1963 e 1966, também estive na inauguração, suponho que oficial, do cais de Nacala, com a presença do Presidente do Malawi, dr. Hastings Banda.
Quanto a todos os navios “Angola” e aos construídos nos Estaleiros Navais da CUF, poderei dizer mais alguma coisa.
A draga de sucção “Búzi” (idêntica à “Matola” e construída ao mesmo tempo), destinada a operar em Moçambique, nos anos 60 durante a guerra colonial quando, juntamente com outra draga, procedia à operação de dragagem dum canal, suponho que no porto da Beira, chegou a ser posta a hipótese de ser provocado o seu afundamento em caso de necessidade de defesa.
João Celorico
Portugal apoiou a Rodésia e o RU pensou em desembarcar para tomar o porto da Beira que era vital para o abastecimentp da Rodésia por exemplo em combustivel.
Por fim o RU decidiu fazer só um bloqueio ao porto da Beira e por isso afundar a draga para atrasar o desembarque não foi necessário.
E por fim segundo o blog em baixo parece que Portugal resistiu mesmo ao bloqueio e o RU optou por abandoná-lo, mas seria necessário confirmá-lo. Entretanto a Rodésia também podia ser abastecida pelo lado da África do Sul e por LM e linha do Limpopo pois esse lado não foi bloqueado.
https://pinderico.blogspot.com/2018/05/beira-mocambique-1965-cont.html