Companhia Union-Castle: história, rotas e cores c. 1905 (3/3)

Já falámos aqui dum artigo da revista Illustrated London News de 1894 que também descrevia os dois canais de entrada na baía de Lourenço Marques (LM) que eram utilisados pelos vapores da "Union and Currie lines" que eram duas companhias de navegação inglesas que serviram a rota de África para os finais do século XIX. Segundo Alfredo Pereira de Lima foi em Janeiro de 1875 que chegou a Lourenço Marques o primeiro navio de passageiros da carreira da Union.
A ligação ferroviária de LM a Pretória foi feita em 1895 e a partir daí tornou-se imprescindível melhorar e aumentar o porto (construção da ponte-cais pós 1900). Surge assim no porto grande movimento de navios e pessoas e aparecem na primeira década do século XX fotógrafos com bons equipamentos e interessados na actividade portuária para criar postais de correio. Esses postais foram enviados pelos viajantes aos milhares para todo o mundo e são deles as fotos que chegam agora até nós. Como a Union-Castle (U-C) se formou em 1900 (pela associação da Union e da Castle que antes de 1876 tinha sido a Currie mencionada no artigo da revista - ver também na wikipediaé já à U-C que pertenciam boa parte desses navios que foram fotografados em LM, embora alguns deles possam vir das duas antecessoras. 
carta das linhas da Union-Castle para África é muito esclarecedora: 
Rotas dos barcos a vapor da U-C, 
por isso pós 1900 mas sem mais precisão
Delagoa Bay = LM
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Pode-se ver que os portos do Índico eram ligados por rotas muito junto à costa (tanto que até é dificil de as ver). Deviam fazer parte do "Round Africa service" que era uma das duas linhas comerciais da U-C servindo LM a partir de 1910 como se descreve a seguir: 
1910-1961 - Round Africa service: London - Southampton - Gibraltar - Tangier (occasional) - Palma de Majorca (occasional) - Marseilles - Genoa/Naples - Tunis (occasional) - Suez - Port Sudan (occasional) - Aden - Mombasa - Zanzibar - Dar-es-Salaam - Beira - Lourenço Marques - Durban - East London - Port Elizabeth - Cape Town - Southampton (and reverse). 
Vê-se que esta linha era circular de Londres a Londres "descendo" pelo Indico (via mar Mediterrâneo e canal do Suez inaugurado em 1869e voltando pelo Oceano Atlântico, mas que se fazia também no sentido contrário. Na lista não está Lisboa mas parece ver-se na carta que era uma das escalas.

1910-1939: Southampton - Cape Town - Port Elizabeth - East London - Durban - Delagoa Bay/Lourenco Marques (occasional) - Mombasa. 
Vê-se que esta linha acostava ocasionalmente a LM.

Como se vê a informação de cima diz respeito a depois de 1910 mas como a linha mais directa para LM era só ocasional dá-me a ideia de que, apesar da importância relativa do porto na região e da forte presença da U-C nas fotos que nos chegaram, LM não era alvo prioritário para a U-C. A U-C certamente jogava com a (possível falta de) concorrência e devia combinar os serviços principais para as cidades do Cabo e Durban (foi por essa altura que a África do Sul se tornou por completo possessão inglesa, Moçambique português era um corpo estranho nesse contexto) fazendo aí transbordo para navios de cabotagem para LM. Por exemplo entre LM e Durban havia ligações marítimas regulares desde o tempo dos veleiros. Não podemos também esquecer que a partir de 1895 entre LM e o Cabo passou a haver combóio via Pretória e que o correio para circular mais rápido entre LM e Lisboa seguia esse caminho. 

Segundo li e parece estranho à luz actual, muitas das primeiras linhas com barcos a vapor da Europa para o Ultramar eram de barcos do correio que levavam passageiros, e os paquetes ou os cargueiros especializados só apareceram depois. Esses textos dão a entender que o volume de correio era tão grande que a capacidade sobrante nos navios para outra carga era reduzida. Imagino que a razão seriam as encomendas postais e a justificação seria de na altura não ser fácil fazer-se envios directos de mercadorias dum porto a outro como se faz agora (contratando directamente a companhia de navegação, usando despachantes, etc) sendo por isso (quase) todo o transporte feito através dos correios. O que é certo é que o correio e o transporte marítimo eram tão interdependentes que a U-C, cujo nome completo era Union-Castle Mail Steamship (barco a vapor) no ano de 1921 foi comprada pela Royal Mail do Reino Unido.  

Temos agora uma questão insolúvel. Nas fotos coloridas do GAUL e do NEWARK CASTLE as cores da chaminé (funnel) surgem como verde em baixo e vermelho em cima mas as cores na chaminé da companhia U-C eram preto e vermelho. A explicação para a discrepância dos postais será ou problema do colorista ao tempo das fotos antigas ou problema recente de reproduções de postais "made in china" como se fossem antigos. Pensei também se o verde e vermelho teriam sido as cores da Union ou da Castle antes da junção mas um dos navios, o Newark Castle, já é posterior à junção por isso essa hipótese é rejeitada. 
 As chaminés são os distintivos das companhias.
Atracados em Lourenço Marques, os navios da U-C:
              Gaul de 1893               Newark Castle de 1902
E há outra foto do cais de Lourenço Marques que aumenta a confusão. Num postal do que diz expressamente que se trata dum navio da Union-Castle pelo que se supõe que seja o que está mais próximo, temos a chaminé castanha clara em baixo e preta em cima.
Não se consegue ver o nome do primeiro navio na popa
Mozambique The Busy Wharf - Lourenco Marques Caes
 by A.W. Bayly 1910s Union Castle Line ship
As cores oficiais da chaminé da U-C, e parecem ter sido assim desde o início embora aqui se mostre navios já dos anos 40 ou posteriores, vêm-se aqui:
Chaminés preta e vermelhas em publicidades das viagens 
da Union-Castle para África em alturas diversas
Mas o desenho e as cores da bandeira da Union-Castle
são inspiradas na Union Jack
Aqui anunciando as carreiras de Lisboa para Lourenço Marques pelo Atlântico e pelo Canal de Suez:
Publicado na Revista Colonial em 1916
Ver aqui site dum antigo tripulante da U-C.

Na mensagem seguinte passaremos destes navios ingleses a navios de outras nacionalidades.

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