Grande incêndio no porto de LM em 1902: velhos "aliados" (1/2)

As três primeiras são fotos com poucos pixels do arquivo da Missão Suíça de Lourenço Marques (LM) agora chamada DM-Echange et Mission disponibilizadas através da USC digital library que tinham como legenda "fogo nas forragens em 1901/1902".

FOTO 1
Fogo ao fundo e parece que se estão a retirar sacos da zona mais em risco

FOTO 2
Fogo visto de mais perto em montes que se verá serem de feno
Deduz-se pela (estranha) locomotiva que o fogo é no recinto dos caminhos de ferro, o que se confirma na foto seguinte com vista para sul-poente tirada duma barreira.


FOTO 3
Mesmo fogo ao longe perto da borda do estuário
Na FOTO 3 temos depois do declive da barreira uma zona plana que pela extensão só pode ser o antigo pântano da zona ocidental = poente da cidade, nessa altura quase enxuto e aterrado. Foi aí que surgiu mais tarde a zona de actividades para o fim da actual Av. 25 de Setembro (chamada oficialmente Alto Maé B) e de facto vê-se na FOTO 3 um edifício do género destas fábricas que sabemos foram instaladas por aí. 
Podemos reforçar essa localização comparando a vista da FOTO 3 com a imagem seguinte recuperada dum postal mostrando também o recinto do porto a partir da barreira do Alto-Maé/Malanga. Na GRAVURA 1, mais ou menos ao centro e penetrando no estuário, está o cais holandês que ficava alinhado com o fim da citada avenida.  

GRAVURA 1
Vista da alta da cidade para o antigo pântano da zona baixa ocidental, 
o estuário e a Catembe na sua margem sul
Noto que tanto na GRAVURA como na FOTO 3 vê-se ao centro esquerda uma interessante casa nos caminhos de ferro com telhado de abas muito largas que é o matadouro velho.  
Tendo-se assim localizado o fogo podemos saber mais sobre ele porque foi, muito provávelmente, relatado na revista inglesa "The Sphere"O título do artigo fazia referência a dois acidentes, um longe da redação da revista que foi o de LM e outro perto que foi uma tempestade na Grã Bretanha e que apaguei. O sub-título é "destruição pelo fogo das reservas do governo britânico em Lourenço Marques" e a legenda da foto maior é "grandes quantidades de reservas do governo em LM antes do fogo".


FOTO 4
Azul: não se vê bem a data 190?
Vermelho: ver em baixo
Rosa: palavras importantes que não se vêm

Percebe-se por alto e rápidamente que bens do governo Inglês foram destruidos pelo fogo no porto de LM que durou 6 dias. Embora a data no artigo não seja clara para se poder comparar com a de 1901/1902 das fotos da DMR+, as palavras sublinhadas a vermelho no texto apontam para ser o mesmo fogo pois duas palavras são sinónimos do fodder (forragem) do título das fotos. Vemos no texto forage e hay (feno) e também aparece grain (grão) que seria relativo aos sacos da FOTO 1. O feno (forragem) que ardeu devia ser para alimentação dos cavalos do exército britânico pois devido à guerra e exílio/prisão de muitos boers a produção agrícola no Transval ocupado não devia ser suficiente e devia ter de ser importado e aqui armazenado antes de seguir na linha férrea para Pretória. 
A mesma foto de cima aparece em versão mais completa aqui:


FOTO 5
1903-Vast-Mountains-Of-Government-Stores-Piled-High
A legenda desta versão é também mais completa que a da anterior e dizia aqui: "Isto não é uma cadeia de montanhas, mas sim um vasto monte de produtos do governo empilhados em Lourenço Marques. Reparem nos homens a subirem ao topo de um dos montes e que parecem formigas. É dito que grandes quantidades desses produtos se perderam devido ao descuido das autoridades e que grandes remessas de cereais foram destruídas pelo fogo".
Podemos assim confirmar que estes depósitos estavam colocados junto ao limite a sul do aterro. Dado verem-se aí vagões pode dizer-se que entre os montes e muro de suporte do aterro passava uma linha férrea e para o lado de cá desse muro estava o leito do estuário, nesse momento sem água. A esse respeito nota-se que à direita, e onde seria o leste ou o lado da ponte Holandesa, estavam barcos de pesca em cima do muro.
O artigo de THE SPHERE dá também uma alfinetada nos portugueses dizendo que a perca não foi completa porque em última instância foram as tripulações de navios ingleses que atacaram o incêndio com as suas bombas. Também diz que os "espectadores" locais se regozijaram com a destruição, o que é capaz de ser verdade. Apesar da "velha aliança" entre os dois países, os portugueses "de base" durante a guerra anglo-boer tomaram o partido dos boers, lembrando-se do ultimato de 1890 e do antigo apoio inglês aos vátuas. Vencida a guerra pelos ingleses, oficialmente era de interesse mútuo voltar às aparências de normalidade, mas os rancores não devem ter desaparecido logo ...
Uma graçola sobre o pouco profissionalismo português na secção dos passaportes e imagens deste tipo costumam aparecer à venda nos sites ebay ou amazon.


GRAVURA 2
Funcionários públicos portugueses muito ocupados com os clientes à espera.
No cartaz ao fundo Lourenço Marques. Imagem ILN pictures.
Novo artigo sobre o fogo aqui.

Comentários