Caminho de ferro entre Lourenço Marques e Pretória - reconstrução da ponte da Matola ao km 26.7

Continuamos com as fotos de Manuel Romão Pereira (MRP) que são disponibilizadas com péssima qualidade pelo CPF e com as de Fowler que o são com boa qualidade pela BNP dos primeiros tempos da linha férrea entre Lourenço Marques e Ressano Garcia. 
As fotos de Fowler, de que já conhecíamos muitas, foram feitas durante a construção da linha em 1886/1887 e não tinham legendas que as localizassem, salvo as feitas até ao vale do Infulene.
As de MRP que temos apresentado últimamente foram feitas depois das cheias e são bem localizadas. Assim se se conseguir encontrar equivalências entre as fotos dos dois autores será possível localizar pela primeira vez "na idade contemporânea" as obras das fotos de Fowler e ficar a conhecer melhor a linha e os locais que percorria. 
Há dois casos em que parece-me que o consigo e neste artigo temos o primeiro. Verifiquei inicialmente que há quatro fotos de Fowler para uma mesma obra e mostro agora a que é mais semelhante a uma das fotos de MRP (as outras três de Fowler aparecem em baixo na montagem). 
Foto de Fowler em 1886/87, em local até agora desconhecido
Olhando para a foto em baixo de MRP (foto #2) localizada na Ribeira da Matolla tenho quase a certeza de que se trata da mesma ponte e por isso a(s) foto(s) de Fowler fica(m) agora também localizada(s). Neste caso a ponte original não caiu com as cheias mas deve ter tido de ser reparada em 1889/90, talvez reforçada nas cabeceiras e foi por isso que MRP a fotografou.
MRP em 1889/90 - Ponte sobre a Ribeira da Matolla
antes das reparações ao Km 26.7
Pontos de equivalência entre as duas fotos eram o tramo metálico da ponte que tem 14 divisões grandes + 2 médias + 2 pequenas que se vêm bem na foto de cima e se confirmam mais ou menos na de baixo e os pilares da ponte que eram em par de tubo metálico nos dois casos. 
Na montagem seguinte pode-se ver as duas fotos de cima mais outras três de Fowler para o mesmo local. Tento aí do lado esquerdo comparar também as árvores entre as duas fotos de cima, o que talvez seja credível se considerarmos que mais de um ano se terá passado entre as suas datas. Clique nas montagens para aumentar.
MONTAGEM da MATOLA
MRP: Ponte da Ribeira da Matola antes de reparações 
Fowler: Quatro fotos tiradas nesse local durante a construção, 
penso que três das quais no sentido oposto à de MRP
Noto que esta é a úníca ponte no conjunto de fotos de Fowler onde se via uma margem canalisada (ao fundo, no canto inferior esquerdo). A Ribeira da Matola era o que agora se chama rio Matola e era o maior curso de água e talvez o mais constante atravessado pela linha férrea, por isso foi normal terem tido aqui esse cuidado. Na foto de MRP não se vê se havia água a correr, se estava muito seco ou se a ribeira tinha sido desviada para ser fazer a reparação em 1889/90.
Vejamos a situação da viária da Matola e as pontes sobre o rio cerca de 1950:
Linha vermelha: linha férrea saindo de LM e passando
por Machava e Matola em direcção a Ressano Garcia (RG)
Círculo vermelho: ponte da linha férrea para RG
Círculo preto: ponte da linha férrea para RG
Círculo verde: ponte da estrada nacional antiga sobre o rio Matola
Setas azuis: afluentes do Rio Matola
A explicação para a diferença de largura de rio e comprimento de ponte entre a que ficamos a conhecer agora que fica mais a norte e a ponte da estrada que já há muito conhecíamos devem ser os muitos afluentes que o rio recebia entre um ponto e outro do seu trajecto em direcção à foz. 

Por falarmos em água e chuvas, quando Portugal deu o prazo final a McMurdo de 9 meses para recuperar a linha original que tinha ficado afectada primeiro em 1888 e para fazer o que faltava até à fronteira, esse prazo decorria penso que do princípio de Outubro de 1888 ao fim de Junho de 1889, mais mês menos mês. McMurdo não fez nada durante muito tempo, com novas cheias em Janeiro de 1889 a situação agravou-se e quando o prazo começou a findar Mc Murdo pediu mais três meses. Um dos argumentos que apresentou foi que esses 9 meses decorriam na época das chuvas em Moçambique (que serão de Janeiro a Março) e que por isso não tinha podido trabalhar até que o tempo seco voltasse. Portugal respondeu que tanto em África como na Europa sempre se tinha trabalhado com chuva, por isso o argumento de Mc Murdo não foi considerado e a linha foi nacionalizada ao fim do prazo estipulado. 
De facto penso que o argumento de Mc Murdo não era totalmente descabido mas Portugal estava já em atitude de ruptura para o poder considerar. Analisando com mais atenção, Mc Murdo construiu a linha inicial em tempo seco (trabalhos técnicos de cerca de Maio a Outubro de 1887). E uma coisa é fazer uma ponte com o leito seco ou ter de suster ou desviar um pequeno fluxo de água, outra coisa é fazer uma ponte atravessando um grande caudal. E com o tempo seco e desconhendo a zona, tanto Mc Murdo como os fiscais portugueses da obra devem ter facilitado durante a construção inicial, não adivinhando como tudo se podia transformar em caso de chuva torrencial e enxurradas. Assim os pilares das pontes ficaram desprotegidos, as cabeceiras ficaram muito próximas da corrente e foram acabadas em terra, não foram feitos aquedutos para desviar águas, etc, etc e o resultado foi a destruição que se tem visto e que se verá por exemplo em mais duas pontes na mensagem seguinte. 
Resumindo Mc Murdo teve culpa porque ou não tinha recursos ou não os quis usar nesta aventura, Portugal não ficou nada bem na foto porque escolheu o traçado, fez as especificações principais, fiscalizou a construção e aceitou a obra até Incomáti, por isso quando ficou tudo destruido não devia ter simplesmente lavado as mãos. Mas lavou e o resto é história.

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