Caminho de ferro entre LM e Pretória - pontes de Umquanhene e Sucutuini na construção inicial?

Na mensagem anterior sobre a linha férrea para Ressano Garcia entre as estações de Movene (actual) ao km 69 e Chanculo ao km 76 propus a localização precisa de duas grandes pontes ditas aos kms 72 e 73.7 depois da grande reparação de 1889/90. Ficámos a conhecê-las aí das fotos de Manuel Romão Pereira (MRP) e falta saber se estavam incluídas e se eram reconhecíveis nas fotos de Fowler que em 1887 acompanhou a construção inicial da linha pelo concessionário americano Mc Murdo. Já sabemos que as pontes iniciais tinham pilares metálicos (malha de perfil ou cilindros largos) que na maior parte foram substituídos por pilares de alvenaria mas em princípio as partes horizontais das pontes seriam as mesmas e deveriam chagar para a s reconhecer. 
Como as fotos de Fowler não tinham legenda a comparação das imagens do antes e depois tem de ser feita caso a caso, com a dificuldade das fotos de MRP aparentemente terem a resolução limitada pelo Centro Português de Fotografia. Causado por isso ou por serem mesmo assim o que é certo é que as fotos de MRP de depois das cheias e antes da reparação não são muito úteis - a foto da ruína da ponte da ribeira de Umquanhene não mostra nada, a foto da de Sucutuini mostra alguma coisa mas há pormenores que podiam ser aí cruciais que se escapam. 
Penso que as únicas fotos de Fowler duma ponte grande que não esteja localizada no HoM sejam as apresento a seguir nas duas montagens. Há uma outra ponte (a das fotos 2 e 3 desta mensagem) que não reconheço nas fotos de MRP de 1889/90 e que por isso não localizei ainda, mas parece-me que era mais curta do que o necessário para atravessar os vales das duas ribeiras de que vamos ver as pontes em 1889/90. 


MONTAGEM 1 - procurando como teria sido 
a ponte da ribeira de Umquanhene antes das cheias
à esquerda: uma ponte em local desconhecido
à direita: reconstrução de ponte em Umquanhene
Como se disse da ruína da ponte de Umquanhene não se vê nada. Na foto de depois da reparação vê-se que tinha ao centro dois tramos em chapa maciça (o da esquerda dividido em pequenas secções e o da direita em grandes secções) e em redor deles tramos em malha de perfil metálico de comprimentos variáveis. Comparando com a ponte em local desconhecido das fotos à esquerda essa tinha três tramos em chapa maciça. Por isso à primeira vista não são duas pontes no mesmo local.
Passamos a exercício similar para a ribeira seguinte.


MONTAGEM 2 - procurando como teria sido 
a ponte da ribeira de Sucutuini antes das cheias
à esquerda: mesma ponte da MONTAGEM 1 em local desconhecido
à direita: reconstrução de ponte em Sucutuini
que poderá ser a que se via aqui cerca de 2013
A foto da ruína da ponte de Sucutuini mostra que a ponte inicial tinha partes em malha de perfil metálico emalhado. Das peças caidas não se consegue ver se havia tramos em chapa maciça ou não mas fico com a ideia que era tudo em malha. Se assim fosse a ponte que temos à esquerda também não tinha sido aqui. Para mais olhando para a foto de depois da reparação vemos três tramos centrais em chapa maciça. Isso coincidiria com o que temos na ponte à esquerda, a diferença é que os tramos depois da reparação são divididos em grandes secções enquanto que os da ponte à esquerda tinham secções mais pequenas. Por isso à primeira vista o que temos na MONTAGEM 2 também não são  duas pontes no mesmo local.
Temos assim uma situação estranha pois para várias pontes longas da linha não se consegue estabelecer a ligação entre o antes e o depois das cheias, O único caso onde consegui isso foi para Chicongene/Secongene. Penso que parte da explicação podia ser:
i. os fotógrafos Fowler primeiro e MRP depois não fotografaram todas as pontes da linha e as que fotografaram não foram as mesmas, embora para mim seria expectável que tivessem fotografado e publicado todas as grandes de que estamos a tratar:
ii. houve tramos das pontes iniciais que ao tombarem ficaram irrecuperáveis e tiveram de ser substituídos por outros diferentes;
iii. é possivel que na reconstrução se tenham trocado tramos dumas pontes iniciais para outras; 
iv. é possivel que tramos das pontes iniciais tenham sido aproveitados para novas pontes que tenham sido erigidas entre LM e Incomáti e para as que foram feitas na nova parte da linha de Incomáti a Ressano Garcia, pelo que teriam sido substituidos nas pontes iniciais por novos tramos. 
Se destas hipóteses aconteceu tudo um pouco, acabamos com um puzzle insolúvel que parece ser o que temos aqui. Talvez fosse caso para reavaliar a ponte das fotos 2 e 3 desta mensagem mas com os dados que temos ficamos por aqui.

Na MONTAGEM 3 reapresento as fotos que já vimos da mensagem anterior dos restos da suposta ponte de Umquanhene e da ponte actual sobre a suposta ribeira de Sucutuini. Podemos olhar para o que existe no Google Maps (seleccione a opção vista de satélite no canto inferior esquerdo):


MONTAGEM 3
Locais onde suponho estiveram as pontes sobre as mencionadas ribeiras 
entre os kms 72 e 73.7 e que em 1889/90 foram fotografadas por MRP
Os nomes das ribeiras cruzadas pela linha férrea só aparece em grande número no ante projecto da linha feito pelo Engenheiro depois General Machado. Mas o mapa deve ser muito impreciso e não vale a pena tentar identificar os locais das pontes a partir dele. Uma coisa que noto é que aparece desenhado um rio que seguia "quase" na vertical depois de passar pela Moamba e onde a maioria das ribeiras de que temos vindo a falar, incluindo estas duas, iriam desaguar. Na actualidade esse rio não existe e acho que nunca existiu pelo que a credibilidade do mapa fica debilitada. Quanto às duas ribeiras o mapa indica-as mais ou menos onde as temos localizado, quer dizer próximas de onde a linha chega ao Rio Incomáti. 
Em relação aos nomes das duas ribeiras a grafia no mapa é ligeiramente diferente da que tem aparecido na linha (Scutuini em vez de Sucutuini, Umguanhé-na em vez de Umquanhene) e não se sabe o que estaria mais correcto. Mas é preciso ter em conta que deve ter sido a primeira vez que alguém tentou escrever (no papel) estes nomes e que mesmo localmente podia haver divergências orais. Pelo que se observa as autoridades portuguesas procuraram falar com os habitantes locais e registar os nomes tradicionais.

MAPA de 1882-84
Castanho: ante projecto da linha férrea.
Laranja: posição prevista para a ponte da ribeira Umquanhene
Verde claro: 
posição prevista para a ponte da ribeira Sucutuini
Há outras coisas estranhas no mapa para além do que referimos acima. As ribeiras que temos estado a ver onde são atravessadas pelas pontes da linha estão já próximo da sua foz no rio Incomáti enquanto que no mapa e com a linha prevista pareciam muito longe. O rio Incomáti no mapa curvava para cima muito perto da fronteira (a linha recta a preto quase vertical à esquerda) enquanto no Google Earth se vê que ele curva quase na vertical da Moamba. Isso é uma grande diferença numa zona geográfica não muito extensa que não será explicável únicamente por potencialmente terem sido seguidos diferentes métodos de cartografia. 

Com isto tudo, não me admira agora muito que a linha tivesse sido inicialmente prevista pelo Major Machado para ter 82 Km até à fronteira e que só passados uns tempos se concluiu que teria de ter 91 km, assunto que foi parte crucial dos imbróglios das autoridades portuguesas com o concessionário Mc Murdo e que tiveram o desenlace já conhecido.

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