Tullio Cianetti de ministro fascista italiano a empresário em Lourenço Marques (2/2)

Desenvolvendo o artigo anterior passo para aqui o que diz respeito à presença de Tullio Cianetti, o antigo ministro do governo fascista de Itália chefiado por Mussolini, em Lourenço Marques (LM) depois de 1944/45. Como tinha dito aí, J. Pimentel Teixeira escreveu uma resenha do livro "Os Italianos em Moçambique na Época Portuguesa / Gli italiani nel Mozambico portoghese (1830-1975)" de Augusto Massari em que aparece uma foto desse personagem de que mostro a parte relevante em baixo e com a legenda completa. A resenha não tem outro texto a acompanhar e também não sei o que diz o livro. 

FOTO 1
"Tullio Cianetti, ex-ministro de Mussolini, dono da Sociedade Industrial do Maputo,
recebe homenagem em Bela Vista"

Concretamente sobre Tullio Cianetti em LM, primeiro encontrei a seguinte informação numa carta escrita por Italo Morgera ao Corriere della Sera em 2009, aqui com ligeiras adaptações:"... em 1964, numa viagem de negócios a Moçambique, fui convidado, com outros, para caçar patos numa quinta na margem do rio Maputo, não muito longe da capital que então se chamava Lourenço Marques. Fomos convidados para jantar e descobrimos que o gerente dessa fazenda, onde se cultivava algodão, se chamava Tullio Cianetti. Perguntei-lhe sobre a história da carta de desculpas que ele enviou a Mussolini à noite depois de votar (HoM: a favor da destituição deste) em 25 de Julho de 1943. Ele respondeu que devia toda a sua carreira a Mussolini e incluindo o ter sido nomeado Ministro das Corporações do seu governo, e que suas desculpas eram motivadas por um sentimento de gratidão. Disse que, tendo escapado da prisão de Verona, fugiu para Portugal e de lá para Moçambique. Pareceu-me uma pessoa serena que vivia modestamente de seu trabalho.". 
Ora a legenda da FOTO 1 dizia que Tullio Cianetti era o dono da "Sociedade Industrial do Maputo" enquanto que na carta de cima dizia-se que era gerente duma plantação e assim aparentemente um empregado. São contradições aparentes entre as duas fontes mas quanto ao local parece haver correspondência pois a Bela Vista referida na legenda da foto é a única grande povoação nas margens do rio Maputo que corre ao sul de LM, actual Maputo e referido na carta.
Em segundo lugar, encontrei um relatório duma missão económica italiana que esteve em Moçambique em 1962 e que falou com Tullio Cianetti:
Antigo ministro Tullio Cianetti estava em 1962
completamente desintoxicado da ideologia do passado (fascista)

Este relatório esclarece também a dúvida de cima pois é dito que Cianetti era: 
a. um óptimo e afortunado industrial e juntando os dados sê-lo-ia da Sociedade Industrial de Maputo; 
b. um ótimo agricultor. Por isso seria sócio-gerente da plantação que foi visitada por Italo Morgera e este ao dizer que Cianetti "vivia modestamente do seu trabalho" dá uma impressão um tanto enganadora mas podia ser verdade pois (e há quem não tenha pensado nisso) há patrões que também trabalham e podem viver modestamente.
Dado novo que motiva esta revisita ao tema é nas fotos de Harrison Forman e reproduzidas do site da Universidade de Wisconsin Milwaukee (UW-M) aparecerem fotos do porto de LM onde se viam sacos de produtos da "Sociedade Industrial de Maputo" prontos para serem embarcados. 

FOTOS 2

Sacos de cal agrícola produzidos pela Sociedade Industrial de Maputo

Ora eu tinha já informação de que uma fábrica de cal nas terras do Rio Maputo a sul de LM e que segundo um leitor seria em Salamanga e que a meados dos anos 50 tinha o escritório na Baixa de LM (na Rua Araújo?), era propriedade ou administrada por italianos mas não sabia o nome dessa firma nem quem seriam essas pessoas. Com a FOTO 2 conclui-se que essa fábrica era a Sociedade Industrial de Maputo e com a informação mostrada acima confirma-se que realmente seria relacionada com italianos, dado que Tullio Cianetti seria o seu dono ou gerente. Quanto à faceta agrícola de Tullio Cianetti que foi referida por Italo Morguera (de que cultivava algodão) e pela missão económica, fica por agora menos clarificada.
Quanto à fábrica de cal ela ou uma predecessora é mencionada pelo Padre Gonçalves num relatório de 1928  para o Portugal Missionário nos seguintes termos. "Existem, entre Bela Vista e Salamanga, uns «fornos de cal», onde se fabrica boa cal, que é exportada para o mercado de Lourenço Marques; o fabrico, porém, é em pequena quantidade". E escreve mais à frente: "Já nos referimos ao fabrico de cal no Maputo e, quando o fizemos, dissemos que era pequeno. Assim é, na verdade, mas devido, apenas, á falta de iniciativa, pois que a pedra, própria e remuneradora, abunda desde a Bela Vista até muito alem de Salamanga e em outros sitios."
Como disse não sei que informação adicional terá o livro de Massari sobre a vida de Tullio Cianetti em LM onde faleceu em 1976, já depois da independência de Moçambique e com um governo marxista-leninista no poder. Pessoalmente passo aqui o sinal a quem souber mais sobre o tema para deixar o seu testemunho pelo meio de comunicação que lhe convier mais pois Cianetti acabou por estar em África mais de 30 anos da sua vida e sendo a mesma pessoa que tinha sido antes acho que seria interessante saber-se como ele se adaptou e / ou transformou às / para as novas circunstâncias. Mas para não estar a criar ilusões materiais a quem eventualmente com ele tenha mais ou menos privado, acho que monetáriamente essa informação valerá zero, bola, nicles (do latim) ...

Comentários

Antonio Ughetto disse…
tive oportunidade de ir de barco de carga (sacos de cal) do Porto de L.M. subindo o rio Maputo e na margem esquerda de quem sobe o rio estava a fábrica de cal onde o meu Pai Ludo Ughetto, trabalhou. Sei que estava-mos em 1956/57.
atravessei posteriormente o rio de uma margem a outra em direcção de Bela Vista num batelão que tinha uma corda e era puxado a mão a corda prendia-se as duas margens. ecreio que o batelão dava para dois carros para além das pessoas.Eu teria uns 13 ou 14 anos meu pai era italiano e dizia que o dono era o sr. Cianetti. Trabalhou lá pouco tempo porque regressou a fábrica de sabão "Azul" e refinaria de oleo "Saborel" no Língamo-Matola.
Antonio Ughetto
Sónia Cajada disse…
Este blog sobre Cianetti ainda está activo?
Rogério Gens disse…
Sónia:
Está activo mas se bem me lembro não tenho tido nada para acrescentar neste artigo ao que escrevi em 2019, para além do comentário de A. Ughetto.
Se quiser escrever um mail use sff housesofmaputo@gmail.com
Obrigado.
RG