Edifícios rurais do sector da saúde nos anos 50 - Bela Vista (2/4)

Continuo o tema do artigo anterior com base numa publicação cujos autores são João Miguel Couto Duarte * e José Luís Doria ** que coordenou também e o restauro e fotografia foi de Luís Filipe Marto ** (* CIAUD – Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa UTL; ** Instituto de Higiene e de Medicina Tropical IHMT da Universidade Nova de Lisboa UNL)
A mesma equipa fez uma apresentação ao CONGRESSO INTERNACIONAL SABER TROPICAL EM MOÇAMBIQUE: HISTÓRIA, MEMÓRIA E CIÊNCIA e uma nota de investigação em que aprofundam a estratégia de cobertura, pessoal e construções no campo da saúde para o Ultramar português. Esta foi sendo proposta / seguida ao poder político pelo IHMT, o grande centro português de ensino e investigação nesse campo,  e seus especialistas desde a década de 20 e o que é relatado é muito interessante para quem estiver interessado no tema da "hospitalização da população indígena em Moçambique na primeira metade do século XX". 
Aqui olharemos mais para as estruturas físicas que faziam parte desse plano e primeiro mostro uma foto do arquivo do IHMT da enfermaria em Matutuíne / Bela Vista.


FOTO 1 
Enfermaria regional do (na altura distrito do) Maputo, 
o nível superior previsto para assistência à população indígena
Este complexo sanitário estava à entrada da antiga vila da Bela Vista que vimos aqui e podemos vê-lo na FOTO 2 no Google Earth no estado actual. Coloco a FOTO 2 em perspectiva semelhante à da FOTO 1 com a alameda que estrutura a vila e que passa pela frente do recinto aparecendo na parte superior das duas imagens.
Naturalmente notam-se diversas alterações mas a estrutura geral é ainda identificável com a que tinha na FOTO 1 com dois edifícios nos cantos do recinto do lado da entrada, um edifício maior centrado entre esses dois e outro em frente desse mais para o fundo e com vários rondáveis ao centro:

FOTO 2
Centro de Saúde da Bela Vista ou formação sanitária de Matutuine / Maputo 
(ver aqui no Google Images com o norte para cima)
A publicação do IHMT e CIAUD das UTL e UNL diz que esta instalação foi construída no início da década de 1930 baseando-se no esquema das “Enfermarias Regionais” preconizado cerca de 1923 pelo médico Francisco Ferreira dos Santos e de que mostra imagens ilucidativas. Diz a publicação que "cada formação comportava o edifício hospitalar, as residências para o médico e o enfermeiro europeu, enfermarias / habitações para a população indígena e uma zona de isolamento para os doentes com patologia infeto-contagiosa. Estas formações deveriam integrar uma vasta rede estendida a todo o território", com um número total que seria de largas centenas contando com os vários níveis previstos. 
Segundo a  apresentação ao congresso feita pelos mesmos autores, em 1931 Ferreira dos Santos tinha preconizado 42 enfermarias regionais como esta da Bela Vista - que mais tarde se passaram a chamar hospitais de 2a classe - mas em 1941 27 delas estavam ainda incompletas. Esse plano depois era completado por postos sanitários de nível inferior e a sua implementação pela administração portuguesa ficou aquém do previsto mas segundo os autores esta é ainda a base actual da estrutura de cuidados de saúde em Moçambique.  
A configuração destas enfermarias foi-se adaptando aos tempos, locais e circunstâncias. Por exemplo as cubatas ou palhotas que estavam inicialmente previstas para ser micro enfermarias (individuais ou familiares) de forma a se adaptarem melhor aos usos das populações acabaram por ser substituidas por pavilhões convencionais quando se concluiu que as populações reconheciam os benefícios da medicina ocidental moderna e das suas prácticas instituidas. Como se vê na FOTO 1 já nos anos 50 as palhotas do plano inicial tinham sido substituidas por rondáveis (com o mesmo formato mas aplicando materiais industriais) que foram adoptados para alojamento dos familiares dos doentes ou do pessoas ou formadores/alunos de cursos ministrados nestas estruturas. 
Nos documentos do IHMT há uma foto dos rondáveis da Bela Vista / Matutuíne em 2006 que se nota na FOTO 2 terem sido reduzidos em número pois parte do seu espaço inicial foi ocupado (quando?) por duas construções rectangulares que presumo fossem os pavilhões de enfermaria entretanto julgados mais eficientes.


FOTO 3
Veremos no próximo artigo um pouco mais destas instalações e do programa de assistência de saúde rio em que estavam integradas no tempo português em Moçambique.

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