Jardim botânico, actual Tunduru: primeiras imagens (1/)

Neste primeiro artigo sobre o nascimento do Jardim Botânico, antigo Vasco da Gama de Lourenço Marques (LM) e actual Tunduru de Maputo acompanharemos o que Alfredo Pereira de Lima (APL) escreveu no livro "Pedras que já não falam" com as fotos que ele conhecia há 50 anos, juntando-lhes as nossas próprias observações e algumas informações adicionais.  
Segundo APL em 1885 uma associação de nome Sociedade de Arboricultura e Floricultura foi formada com o objectivo de criar um jardim e arborizar o pântano. O Governo ainda em 1885 entregou-lhes os terrenos que se viam nas FOTOS 1 e 2 e que são nas cercanias do topo mais baixo e a sul do jardim actual e que foi por onde ele se iniciou. Estas fotos são do álbum de Mc Murdo e foram feitas por Fowler que acompanhou em Moçambique a construção do Caminho de Ferro para Ressano Garcia entre 1885 e 1887: 

FOTO 1
Donde até há pouco teria sido pântano olhando para a encosta/barreira.
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Para localizarmos melhor estas fotos, este pântano que circundava o burgo de Lourenço Marques no seu lado norte chegava até perto do início da encosta para a zona alta, o que na parte central seria um pouco acima de onde é actualmente o cruzamento das actuais Av. Samora, antigas D. Luis e Aguiar e Av. Manganhela, antiga Álvares Cabral. 

FOTO 2
Do fim da encosta olhando para o antigo pântano e com o burgo ao fundo.
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Os terrenos destas fotos estavam nas zonas de transição entre a encosta e o pântano. A drenagem da zona foi feita com valas ou canais de drenagem e supõe-se a água daqui recolhida seria conduzida até à enseada da Maxaquene a oriente da Baixa, o que na FOTO 2 estava para a esquerda.. 
Na sua tese de doutoramento "Conservação da arquitetura e do ambiente urbano modernos: a baixa de Maputo" (apresentação no HoM - descarregar aqui) que cobre em detalhe a génese do jardim, na página 397 e relativamente à FOTO 2, Lisandra Franco de Mendonça (LFM) refere-se à "vedação do Jardim com sebes e colunas de alvenaria, lago e pequeno coreto rodeados de pequenos canteiros de desenho irregular e plantas de eucalipto". De facto vê-se na FOTO 2 do meio para o fundo vê-se duas fiadas de colunas e é à primeira que LFM se refere. Como se sabe também, este terreno do jardim a sudoeste (dizemos aqui a sul para simplificar) era limitado pela "vala do esgoto" ou seja pelo canal de drenagem que devia assim devia passar próximo para lá dessa fiada de colunas. Na FOTO 2 não se consegue distinguir a vala depois da sebe mas isso seria de esperar pois tratava-se de uma trincheira tosca que teria talvez uns 2-3 metros de largura e em cujas bordas irregulares em terra rápidamente cresceria capim e caniço reintegrando-se com a natureza envolvente. Quanto à FOTO 1 como tento mostrar mais em baixo, presumo que tenha sido tirada também em posição a norte da vala (entre a vala e a encosta) e ela estaria a passar do lado direito do fotógrafo. 
LFM escreveu também interpretando texto da época que "escavaram, na parte mais baixa, um lago grande sobre o pântano". Vê-se esse lago da esquerda para a direita principalmente na FOTO 2 e para além da função paisagistica ele serviria de bacia de retenção para as águas que desciam a encosta ou de fontes naturais nas proximidades. Evitava-se assim a sua passagem para o pântano que se tinha sido começado a drenar uns cinco anos antes. O lago permitiu que a sul do jardim o canal de drenagem fosse colocado mais longe da encosta em comparação com o que aconteceu noutros locais. 
Suponho que tal terá sido de interesse para o seu projecto e explicará o interesse do Estado em apoiar a Sociedade de Arboricultura e Floricultura. Havia uma ligação estreita entre as duas entidades visto que o lider da colectividade Armando Longle era também chefe de secção das Obras Públicas e o seu colega major Joaquim Lapa era também dirigente. Essa complementariedade foi sublinhada num texto que Alfredo Pereira de Lima (aqui transcrito por maputo100anos) escreveu no livro Pedras: "... no  próprio relatório do governador do Distrito ... de 1887 pode ler-se: “A Sociedade de Arboricultura e Floricultura ajardinando uma parte do Pântano e a secção de Obras Pùblicas plantando de eucaliptos e de outras árvores uma outra, iniciaram um trabalho de que há a esperar os melhores resultados." 
Nas duas fotos de cima e como se poderá rever na montagem seguinte aparecem os primeiros elementos decorativos do jardim em torno do lago, os utensílios de trabalho e os viveiros para as plantas (eucaliptos e casuarinas) que foram depois plantados pela cidade. Presume-se tudo o que aqui se vê esteja para norte da vala e por isso seja da responsabilidade do jardim mas não temos a certeza.

                                             MONTAGEM 1
a e b: ponte (ver aqui sobre belveder) e uma estátua (que vai ter um artigo especial)
c e d: bancos de madeira, regador e vasos com plantas (viveiros)

Em termos de localização actual podemos adiantar que na FOTO 2 aproximadamente entre as duas fiadas de colunas, um pouco a sul = para lá da primeira mas não exactamente na mesma direcção seria agora a Av. Manganhela, antiga Álvares Cabral. A actual Av. Samora, antiga D. Luis que é perpendicular à Manganhela passaria para lá = poente das duas casas que se vêm juntas à direita da foto e a meio do pântano. Veremos melhor a relação entre estes tempos e os mais recentes para este local noutros artigos. 
Quanto ao álbum de McMurdo que contém as FOTOS 1 e 2 de Fowler esta é sua capa:

FOTO 4
Álbum de McMurdo, com as fotos de C.S. FOWLER, publicado em 1887
Continuaremos nos artigos seguintes a ver mais elementos de interesse no jardim até à actualidade.
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Tese de doutoramento de Lisandra Franco de Mendonça - descarregar daqui
Pormenores sobre a história do jardim, implantado sobre o terreno sito na “Machamba dos Soldados” e “Machamba do Governador” - página 393 baseada em texto de 1881 de J. Armando Longle: "O Governo entregou à Sociedade de Arboricultura e Floricultura um terreno às portas da vila, com uma superfície total de pouco mais de treze hectares, “confrontando pelo norte com a Estrada da Ponta Vermelha (HoM: que passava entre o jardim e a linha entre o Hospital e a Igreja antigos); sueste, com o Cemitério dos Mouros; sudoeste, com a vala do esgoto, e noroeste, com a avenida projetada pela dita sociedade”. O terreno era todo alagado na parte inferior, “o que junto à grande quantidade de detritos vegetais, dava uma terra humosa, riquíssima”, mas na parte mais alta era seco e arenoso. Por volta de novembro de 1885, a Sociedade deu início às obras: o terreno foi delimitado por uma cerca, o mato decapado e trataram de enxugar a parte alagada por meio de drenos “num comprimento total de mais de 200 metros”. Escavaram, na parte mais baixa, um lago grande sobre o pântano, abriram ruas e principiaram as plantações mas, uma vez que as obras tinham iniciado já em plena época das chuvas, “só na gestão seguinte, é que se formaram os primeiros viveiros” ".
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Hipótese de como as duas fotos foram tiradas 
Parece ser a única possibilidade se a FOTO 1 tiver sido tirada a norte da vala,
pois a vala claramente nâo aparece à vista no terreno até ao lago

Como na FOTO 1 onde está o antes nâo aparecem os eucaliptos jovens que estão em primeiro plano onde marquei o depois na encosta, para esta a hipótese ser válida, a pré-condição é que tenham sido tiradas em épocas diferentes. Isso é materialmente possível pois o seu autor, C.S. Fowler (um agrimensor ou surveyor da companhia de caminhos de ferro criada por McMurdo) deve ter estado em LM talvez por dois anos mas não temos a certeza que isso tenha acontecido com estas fotos.

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