Estação telegráfica e cabos submarinos em LM - mais sobre a E.T., sistemas e tecnologia (13/13)

Para tentar encerrar o tema e usando algumas partes já mostradas antes, apresento mais duas fotos da Estação telegráphica (telegráfica) de Lourenço Marques (LM), actual Maputo e instalada para o cabo que amarrou em Moçambique em 1879. 
Cable station da Eastern Telegraph
Landing Station / Estação telegráphica (telegráfica) ou de cabo submarino

Este edifício foi talvez o mais captado pelos primeiros fotógrafos exercendo em LM a partir dos anos 80 do século XIX. A primeira foto é dos Lazarus e parece ter sido publicada em 1901 e a segunda, olhando-se para desenvolvimento do jardim fronteiro, deve ser de altura semelhante.
Seguem-se alguns dados sobre o cabo que servia Moçambique complementarndo por exemplo o artigo 7/13 desta série. A primeira ligação entre o Reino Unido e a India passando por Portugal, mar Mediterrâneo, Egipto (canal de Suez de 1859 ou por terra) e Aden foi feita em 1870 pela Eastern Telegraph Co. e usou o cabo British Indian de que vemos parte do traçado a seguir.

Mapa do cabo British Indian (BI) 
Secção do cabo British Indian que ligava Suez (Egipto) a Bombaim (Índia) 

Para a ligação ao coração da Europa e daí ao resto do mundo, a secção que vemos no mapa de cima era complementada pela secções Alexandria (Egipto) - Malta e Malta - Gibraltar - Carcavelos (Portugal) - Porthcurno (Grã Bretanha) e por cabo telegráfico terrestre da companhia estatal egípcia entre Suez e Alexandria.
A ligação dessse cabo a partir de Aden para o sul de África com destino final a Durban foi feita em 1879 com os segmentos seguintes (formando o chamado cabo de Durban e que não está aí representado): Aden-Zanzibar-Ilha de Moçambique (que era ainda a capital)-Lourenço Marques-Durban, pela Eastern & South African Telegraph Co certamente uma subsidiária da Eastern Telegraph que era o poder dominante dessa nova indústria na parte oriental do Globo. Como era usual, cada país ligado pelo cabo possuia o seu lado do circuito (half-circuit) e tinham que fazer um acordo com o outro lado para haver as ligações (para isso faz-se um consórcio para utilisar o cabo). 
Este funtastic site tem esta informação para o troço de L.M. para sul:
"Laying COMMENCED 5 July,COMPLETED 21 July 1879. The local representative of the Eastern Telegraph Company gives notice that a cable between Durban and Delagoa Bay has been completed. The section is, therefore, now open to the PUBLIC. The rate from Durban to Delagoa Bay is 1s-3d. per word. The Imperial, Portuguese, and Colonial Governments are entitled to half rates. Aden - Zanzibar was the last link, in service 25 Dec 1879."
Complementado aspectos técnicos de que falámos aqui no artigo 6/13, alguns dados mais técnicos sobre transmissão em parte provenientes da wikipedia:
Como não havia amplificadores submersos, a transmissão era feita com muito alta voltagem para que à estação seguinte do outro lado do cabo chegasse (um mínimo de) sinal. Disto resultava, por razões técnicas dos próprios cabos e dos ambientes submarinos, uma velocidade de transmissão muito baixa pois tinha-se de deixar um intervalo para o cabo "descarregar" a electricidade entre cada sinal telegráfico transmitido (cada letra do alfabeto de cada palavra a ser transmitida era transformada numa combinação única de traços - pontos).
Em cima diz rate 1s-3d per word o que que dizer custava 1 shilling e 3 pence por palavra.
No que respeita a velocidade de transmissão e como se pode ver na tabela que mostro mais em baixo, por exemplo em 1866 um cabo transatlântico transmitia 6 a 8 palavras por minuto (por par de condutores de cobre no cabo, ao principio só havia um par pela impossibilidade de evitar interferências entre eles se houvesse mais) o que era à volta de 10 segundos para transmitir cada palavra. Se elas tivessem 5 letras em média isso dava 2 segundos para poder transmitir cada uma das letras em morse. 
É importante pensar no seguinte: com o risco de ser uma tecnologia nascente, a possibilidade de acidentes catastróficos na instalação e na vida do cabo, investimento inicial brutal, custo operacional elevado (alta tensão para a transmissão, barcos de reserva para reparação), tudo isso para no fim ter um cabo submarino INTEIRO a transmitir só 1 letra de 2 em 2 segundos, quem iria investir as suas poupanças na aventura? Perguntar-se-ia se haveria procura para mandar mensagens intercontinentais a um preço que teria forçosamente de ser extremamente caro? Iriam estes sistemas, se funcionassem, ser rentáveis?  Foram perguntas razoáveis que se fizeram e alguém achou que sim e arriscou embora com o apoio dos governos.
E tinhamos assim LM ligada em 1879 a Portugal/India/UK e daí a todo o mundo no sistema mundial de cabos intercontinentais telegráficos, menos de 10 anos depois da India (a jóia do Império Britânico) ter sido ligada à Europa. Nada mau pois quanto às alternativas o que  o telégrafo conseguia comparado com o correio da altura que era enviado por veleiros ou navios a vapor era um enorme avanço. 

NB técnico 1: Com os primeiros sistemas de cabo submarino se se tentasse transmitir sinais rápidamente haveria erro do lado da estação receptora e por isso até à invenção dos amplificadores submersos (repetidores) que permitiu baixar a amplitude dos sinais aplicados ao cabo, a velocidade de transmissão só era suficiente para utilização com sinais de telégrafo. 
Podemos ver em baixo essa evolução por par de condutores de cobre, dos primeiros sistemas até à utilização dos primeiros repetidores com o primeiro cabo Trans-Atlântico para Telefone (TAT-1) que aparece ao fundo da tabela, o primeiro grande salto tecnológico que permitiu a transmissão de voz. 
CableYearSpeed or Transmission capacity
Cabos telegráficos
Atlantic, Ireland-Newfoundland
1858A few words per hour
Atlantic, Ireland-Newfoundland18666 - 8 words per minute
Long cables with automatic transmitting equipment189840 words per minute
Newfoundland-Azores19282 500 characters per minute (~400 wpm ou seja 400 palavras por minuto em média)
Primeiro cabo transatlântico para telefone
Atlantic, TAT-1(first repeatered cable)
195636 telephone channels (HoM: isto equivale a 2 Mbps transmitidos entre os UK e USA para o CABO INTEIRO, o leitor terá agora em casa ou mesmo no seu smartphone muito maior velocidade de transmissão e só para si. 

Note-se que entre os primeiros cabos submarinos transatlânticos para telegrafia e o início de transmissão de sinal de telefone passaram quase 100 anos pelo se pode dizer que até esse grande salto de 1956 o progresso foi lento mas seguro. Antes de 1956 essas melhorias na velocidade de transmissão terão derivado principalmente da constituição e fabrico dos cabos de forma a que as suas componentes capacitiva e também indutiva, que eram indesejadas, fossem reduzidas.  
Noto ainda que só em 1988, quer dizer só mais de 30 anos depois do TAT-1 (este ainda com condutores de cobre mas com repetidores) foi instalado o primeiro TAT em fibra óptica digital, uma tecnologia revolucionária que resolveu de vez esse tipo de problemas e que permitiu acelerar enormemente a capacidade / velocidade de transmissão dos cabos submarinos.

NB técnico 2: A Eastern Telegraph tinha também cabos submarinos na costa ocidental de África da Cidade do Cabo para a Europe e a informação seguinte indica que faziam um anel.
Interrupções na rota ocidental e nas duas rotas em 1892 e início de 1893

Pelo que se lê, em de 24 de novembro de 1892 até 12 de janeiro de 1893 o cabo da rota ocidental entre Luanda e São Tomé foi interrompido e todo o tráfego foi dirigido para a rota oriental. Mas nesta rota, entre 4 e 11 de janeiro de 1893 o tráfego foi também interrompido entre LM e a Ilha de Moçambique pelo que todas as estações da ET para baixo das de São Tomé e da Ilha de Moçambique entre essas duas datas de janeito de 1893 tiveram comunicações cortadas com a Europa.

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