Demarcação de fronteira com a ZAR em 1890 - no rio Uanetsi (6)

Neste artigo continuamos a acompanhar o estabelecimento da fronteira entre Portugal (Moçambique) e a ZAR (Zuid-Afrikaansche Republiek ou SAR dos boer) realizada em 1890, agora na zona da portela do rio Uanetsi nos montes Libombos. Este rio passa cerca de 80 km para norte do Rio Sabié que vimos no artigo anterior  sendo ambos afluentes do Rio Incomati que passa em Ressano Garcia de oeste para leste mas flecte depois, primeiro para norte num percurso de 28 km ("paralelo" aos montes a uns 22 km de distância em média) e a seguir para nordeste.
A zona da portela do rio Uanetsi onde foi colocado o marco I fica aqui no google maps. Vê-se que o rio actualmente tem muitos nomes (N'wanetsi, Nwanedzi na África do Sul e Vaneteze em Moçambique) mas equiparáveis ao dado em 1890. 
Vemos a seguir o rio no vale em 1890:

FOTO 1
web_n3254 rio Uanetsi sul 
Escreve Freire de Andrade (FA) na página 24/25: "No dia 31 (de Junho, após quase um mês de percurso), partíamos de novo na direcção norte, tendo os (africanos) que haviam partido a reconhecer o terreno vindo dizer, que ahi se encontrava um rio bastante largo, rio este que as nossas cartas não indicavam. Um dos carros quebrou ao passar uma ravina, o que nos demorou a marcha, e de tarde acampámos junto do rio Xicangane, depois de percorridas umas 8 milhas, durante as quaes o terreno não apresentava modificações algumas. Logo depois de armadas as barracas seguimos a ver o tal rio, que se reconheceu ser o Uanetsi, affluente do Incomati, que atravessava os Libombos, em vez de, como o mappa o indicava, ter a sua origem na vertente oriental das montanhas. Os Libombos que eram até ali formados apenas de largas ondulações de terreno, tomam o aspecto áspero e abrupto que tinham junto do Incomati."
E continua FA um pouco mais à frente na página 25/26: "O curso do rio (Uanetsi) é de tal modo apertado pelas margens, que durante o pouco tempo que o percorremos, para a collocação do marco I, foi necessário passar repetidas vezes de uma para outra margem, porque de quando em quando, completamente a pique, eram perfeitamente intransitáveis. A vegetação é extraordináriamente forte e vigorosa, e os juncais no rio e nas ilhotas formados pelas suas alluvioes, em grande número. No local do marco a rocha eleva-se a grande altura, formando um verdadeiro precipício, na beira do qual foi aquelle construído. As pedras que se soltavam de cima caíam até ao fundo do valle quasi perpendicularmente". O precipício ao alto do qual o marco I estava poderia ser o que se via ao fundo da FOTO 1 na margem de "lá" onde estava o comissário europeu mas não sabemos.
Não neste caso porque FA diz que não foi possível fotografar o marco I (pág. 173/174) mas em geral estas fotos nunca nos "dizem" se em determinado local onde se espera ter havido um marco se ele não se vê porque não tinha ainda sido erigido ou se o tinha sido mas não ficou na objectiva.
Como se vê pela passagem de cima o relatório, especialmente na parte de FA, e se for ilustrado pelas fotos pertinentes melhor, pode ser lido como um livro de aventuras de um ocidental em terras desconhecidas e esse é só uma amostra porque FA fala po exemplo também de caça e das populações e costumes locais. 
Aqui tento focar e nestes primeiros artigos transcrevo principalmente o que ajuda a compreender por onde a comissão passou e colocou marcos e mais para a frente haverá artigos mais gerais mas sobre esses temas.
O rio Uanetsi, tal como o Sabié, atravessa os Libombos em direcção próxima da oeste - leste mas na FOTO 1 não sei para onde ele corria, qual era a margem norte e a sul e por isso se Moçambique estaria para a direita ou para a esquerda (lembro que nas fotos do Sábié soube-o pelas carretas).
Segundo a legenda original no actd, temos a seguir outra vista do rio Uanetsi sul mas a partir das alturas dos Montes Libombos:

FOTO 2
web_n3255 rio Uanetsi sul
Vê-se que para a frente o vale do rio vai-se alargando pelo que assumo que para aí seja Moçambique e o seu caminho para o rio Incomáti mas não posso garantir. De notar que a elevação na planície do lado leste = oriental dos Limbombos na zona que vemos aqui é em torno de 150 metros e na junção do rio com o Incomáti a oeste de Magude (google maps) é de cerca de 30 m. Como a distância em linha recta é de cerca de 60 km esse declive de 120 metros é pouco pronunciado e daí o rio formar meandros (google maps) nessa quasi planície.  
Se de facto Moçambique estiver para o fundo da FOTO 2 ela tirá sido tirada do lado sul da portela. Em relação à FOTO 1, como FA diz havia aí escarpas a pique dos dois lados (mas nem sempre) não sei que a que margem corresponderia esta elevação da FOTO 2 que no entanto me parece mais elevada do que o morro à vista do lado de lá na FOTO 1. 
Noto que FOTO 2 aparece um senhor africano com escudo (de pele de animal) e suponho lança que presumo fosse um dos dois senhores (locais ou dos auxiliares da comissão) que estavam próximos na FOTO 1 e que terão acompanhado FA nesta tomada de fotos (o que confirma também que as fotos são nas margens do mesmo rio).
No próximo artigo voltamos um pouco atrás para percorrer a fronteira desde o rio Sabié até ao Uanetsi, comparando os dados da carta de 1892 e do texto e tabela do relatório de FA. Veremos aí por exemplo porque nas legendas destas duas fotos não aparece só rio Uanetsi mas sim Uanetsu sul.

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