Moodie e primeira iniciativa para a linha de LM - quintas e ouro (6/6)

Falámos num artigo anterior desta série de Moodie de que o governo da Zuid-Afrikaansche Republiek (ZAR ou República boer do Transavaal) lhe deu em 1875/76 um bloco de 13 quintas no leste do Transvaal (actual Mpulamalanga). 
Terá sido a sua ocupação profissional original como agrimensor (surveyor) da ZAR que lhe terá dado os conhecimentos do terreno e de pessoas influentes que lhe permitiram a partir de 1871 enveredar pelo empreendorismo relacionado com os caminhos de ferro e que foi depois recompensado, numa primeira fase, por essas quintas. Não sabemos como foi decidido onde elas seriam mas Moodie estaria em muito boa posição para saber o que mais lhe interessaria, fosse para uso agrícola ou florestal, para criação de gado ou para outras actividades.
Na legenda da foto seguinte já Barberton era referida, mas salvo o grupo de pessoas e talvez o caminho rural podemos imaginar que o local estaria ainda como quando Moodie terá conhecido esssas terras antes da fundação dessa cidade mineira sul-africana.


IMAGEM 1
Entrada para o ribeiro das Terras Altas em Moodies, perto de Barberton
Voltando ao já citado artigo no S2A3 (ver transcrito no NB 1 em baixo) diz-se aí que em 1876 Moodie tinha deixado de ter interesses nas concessões de caminho de ferro e entrado profissionalmente no sector privado mineiro. Todavia não sei se seria uma actividade paralela ou se há confusão como me parece dado que como vimos antes foi precisamente a partir de 1876 que Moodie terá estado mais ocupado com a Lebombo Railway Company que tinha sido criada em meados desse ano para fazer o projecto da linha de LM avançar para a construção e que ele liderou para o acionista maioritário, a ZAR.
Daí para a frente, como dissemos antes em Abril de 1877 a ZAR foi anexada pelo Reino Unido e o projecto da linha na práctica parou e não sei que ocupação Moodie teve depois. Em 1879 casou em Inglaterra e durante a primeira guerra anglo-boer entre 1880 e 1881 apoiou os boer mesmo sendo de origem inglesa (como dissemos talvez tivesse nacionalidade americana). Quando a ZAR obteve de novo a autonomia em 1881, Moodie foi nomeado seu agrimensor-chefe sucedendo a Melville que conhecemos daqui. Nessa qualidade Moodie participou em 1882 na comissão para estudar de novo a linha de caminho de ferro da ZAR para Lourenço Marques (LM), já na sequência de eventos que levou em 1883 Portugal conceder a concessão a Mac Murdo e na expectativa de que a ZAR o fizesse do seu lado, mas sabemos que a construção completa da linha de LM a Pretória demorou ainda uns 11/12 anos a terminar, por demora dos dois lados mas principalmente do da ZAR. Nessa comissão de 1882 Moodie propôs que a linha seguisse pelo vale do rio Kaap / Cape e passasse por Barberton e por Ermelo, onde teria sido a extremidade a oeste da sua concessão original (essas localidades aparecem nesta carta dum artigo anterior). Não se compreende bem essa proposta de Moodie (que interesses escondidos teria ele?) pois em 1882 e como vimos antes a ZAR teria forçosamente de ter em consideração que em 1881 tinha perdido o controlo da Swazilândia, por onde essa linha teria de passar para seguir para LM. Naturalmente Moodie não foi apoiado pelos outros membros dessa comissão e resignou desse cargo (para mais como se vê na NB 3 em baixo veio a confirmar-se depois e construindo-se só até Barberton que fazer-se uma linha nessa directriz ficaria muito caro).  
Mas pelas estranhas voltas que o destino dá, em 1883/84 foi ocasionalmente descoberto ouro nas terras de Moodie (as quintas Ameide e Oorschot) o que acabou por dar origem à cidade mineira de Barberton (série no HoM aqui). Vimos já que prospectores contactaram Moodie para obterem licenças para explorarem as suas terras mas ele impôs preços altos e só muito mais tarde, em 1892, foram lá abertas minas.
Segue-se uma gravura de instalação industrial mineira no que tinham sido quintas de Moodie na região de Barberton. Noto que se chamavam "farms" mas nunca terão sido cultivadas directamente por Moodie que residia na zona de Pretória. No google maps actual vê-se uma escola com nome Moodie a uns 8 km oeste do centro antigo de Barberton o que coincide com a informação de que as quintas que recebeu em 1875/76 ficavam 3 a 5 milhas para oeste da futura cidade.
A gravura seguinte do site alamy.com tem como legenda "De Kaap Goldfields, Transvaal. Moodie's Mill 1887. The Illustrated London News" e mostra o que deve ser uma exploração inicial numas das quintas de Moodie de Barberton (o centro da qual que aparece na imagem ao lado)


IMAGEM 2 (gravura de 1887)
Moínho de Moodie em 1887 
Vê-se que a roda à esquerda era movida pela corrente superfícial de água e por isso esta máquina tinha de ser instalada numa cova. O eixo da roda fazia mover na vertical os seis martelos pilões que esmagavam a rocha que seria colocada por baixo deles e que descia pela prancha à direita e de modo a poder-se extrair dela o ouro.
Curiosamente a gravura seguinte da mesma revista e ano pela legenda "De Kaap goldfields, Transvaal, South Africa. Water-powered stamping mill for crushing gold-bearing quartz ore, Moodie's Farms, near Brereton" mostra também uma mina a céu aberto numa quinta de Moodie. Mas esta exploração é em Brereton que fica muito para sul de Barberton mas por onde o rio De Kaap / Cape também passará (ver as duas localidades aqui no google maps). Lembro que vimos aqui que Moodie já antes de 1875/76 tinha várias quintas no Leste do Transvaal por isso esta de Brereton podia ser numa delas.


IMAGEM 3 (gravura de 1887)
Moinho muito mais sofisticado que o de cima para se extrair ouro 
de rocha de filão em quartzo numa quinta de Moodie em Brereton
Podemos ver um relatório norte americano de 1884 que dá grande destaque às quintas de Moodie pela descoberta neles de ouro, o que daria origem ao campo aurífero de De Kaap e a Barberton (aí ainda não nomeada). O texto referia também que a exploração mineira no Transvaal passaria forçosamente do estádio artesanal para o superior e que Delagoa Bay / Lourenço Marques (e por isso tudo isto está relacionado) seria o porto de acesso para a maquinaria que lhe seria necessária. Note-se que esta perspectiva foi feita uns 10 anos da  linha de caminho de ferro de LM chegar à África do Sul e por isso ao tempo em que os transportes eram feitos em carreta de bois: Consular Reports: Commerce, manufactures. etc. Volume 14. 45-48 - During this period very little attention was attracted by the vague rumors which occasionally reached the outside world of gold discoveries in the Transvaal, and the field was left entirely in the hands of a small number of inexperienced diggers, widely scattered, and who were without other mining implements than pick and shovel. But this system work has had its day, and whatever wealth lies hidden in the rugged hills of the Transvaal, will in future be developed and brought to the light of day by means of improved mining machinery, which will incur great cost, and therefore available only to the wealthy capitalist. Syndicates have been formed, companies organized, and large quantities of machinery ordered. By the last advices from Delagoa Bay there were seventy wagon loads of mining machinery lying there waiting transportation to the gold-fields, and it is confidently predicted by the sanguine that when this machinery is once set to work the yield of gold will be phenomenal and beyond all former precedent. There are doubtless rich deposits of gold in many parts of the Transvaal country, but the great attraction at present is centered in the Kaap Valley, situated several days' travel southeast from Lydenburg. This entire valley is owned by one G. P. Moodie, formerly surveyor-general of the Transvaal. Mr. Moodie's possessions consist of thirteen farms of several thousand acres each, and it is claimed that a quartz gold-bearing reef is known to run almost the entire length of his propertyShould this report prove to be correct,;the austere, conservative little Republic of South Africa may hope one day to rival what California and Australia were in the last generation. 

Voltando ao artigo que temos citado no s2a3 e como era também mencionado no relatório de cima ("formerly surveyor-general") mas aqui com a data precisa, Moodie deixou de ser agrimensor chefe da ZAR em 1884, por coincidência ao tempo da descoberta do ouro nas suas quintas e não é muito claro o que terá feito depois profissionalmente dado a sua exploração industrial pelo menos nas de Barberton não foi imediata. Já antes Moodie parecia ser "lobista" e por exemplo em 1881 tinha apresentado na SGL de Lisboa um estudo genérico sobre o Transvaal (parece que em português, lido directamente por ele ou por outra pessoa?) o que dá também ideia que os seus contactos com os portugueses de LM devem ter sido frequentes e profundos. Mas Moodie por esses tempos devia ter já problemas de saúde e acabou por falecer em 1891 com 63 anos.

NBs com informação mais completa:
A. S2A3
Moodie, Mr George Pigot (surveying)
Born: 22 January 1829, Grahamstown, South Africa. - Died: 2 November 1891, Cape Town, South Africa.
George Pigot Moodie, surveyor and railway pioneer, was the son of Lieut. Donald Moodie of the Royal Navy and his wife Sophia, born Pigot. In 1850 he assisted John Moreland in surveying land for J.C. Byrne's Colonial Land and Emigration Company in Natal, and in March 1864 was appointed engineer-surveyor for Pietermaritzburg. He hunted and traded in the Transvaal and beyond its borders until 1867, when he settled down as a land surveyor in that territory. From 1870 to 1873 he was a member of the Volksraad for Wakkerstroom. During 1870 and 1871 he travelled to Delagoa Bay (now Baia de Maputo) three times to investigate, at his own expense, the feasibility of a rail link between Lydenburg and the coast, and in 1872 submitted a scheme for a railway to the Transvaal government. In March the next year the Volksraad granted him a concession to build a railway line from Klipstapel (20 km north of Ermelo) to the Lebombo Mountains on the Transvaal border, while soon afterwards he obtained a Portuguese concession to continue the line through Mozambique. The latter concession he ceded to President Burgers of the Transvaal before accompanying the president as his secretary on a visit to Lisbon in November 1875 to conclude a formal treaty for the railway on Portuguese territory. However, nothing came of the project. Moodie was none the less rewarded for his services by being granted a block of thirteen farms in the eastern Transvaal near present Barberton, which came to be known as Moodie's concession.
Towards the end of 1876 he became managing director of the Nil Desperandum Co-operative Quartz Crushing Company and the next year visited Britain to acquire machinery for exploiting a gold concession at Blaauwbank, some 70 km west of where Johannesburg was later laid out. In May 1878 he delivered a lecture at the Royal Colonial Institute in London on "The population, prospects, and future government of the Transvaal", which was printed for private circulation. Three years later a paper by him on the history, native inhabitants and politics of the Transvaal, in Portuguese, was read before the Sociedade de Geographia de Lisboa. On 10 September 1879 he married Rosa Maria Spranger in England. They had two sons and two daughters.
During the First Anglo-Boer War (1880-1881) Moodie was an active supporter of the Boer cause. After the war, in September 1881, he succeeded S. Melvill as Surveyor-General of the South African Republic (Transvaal), a position he held until 1884. At some stage he compiled a map of the Transvaal, a copy of which was donated to Albany Museum, Grahamstown, in 1899. In his capacity as Surveyor-General he was a member of a commission appointed in January 1882 to investigate the construction of a railway from Pretoria to the Portuguese border. He advocated the route he had proposed in 1872, passing close to the site where Barberton was later established and to Ermelo, but finding no support for his views resigned from the commission later that year.
Moodie opened his concession to prospectors in 1892. Gold was found there and he formed Moodie's Gold Mining and Exploration Company. "Moodie's reef" briefly became the most important goldfield in South Africa early in 1884, but the high royalties that he demanded and the discovery of gold in neighbouring regions soon relegated it to a field of minor importance. He retired to Pietermaritzburg, but later decided to settle in Britain. However, his health was poor and finding the climate trying he spent his last years at the Cape. He changed his surname to Pigot-Moodie in 1889. In September 1891, shortly before his death, he donated the ornamental Rondebosch fountain, now a landmark and national monument. 
NB: Pode ver-se imagens dessa fonte conhecida pelo nome Moodie do benemérito aqui nessa localidade do Cabo, foi destruida em 2015 mas em 2018 esperava-se recuperá-la com peças novas.

B. Geni
1881-1884 - Moodie became Surveyor-General to Paul Kruger's government of the Transvaal and pioneered the railway through Portuguese territory to Lourenco Marques. He discovered gold and became the proprietor of Moodie's Gold Mines, Barberton, on land which he had accepted in lieu of salary from the Transvaal government; and became a wealthy man.

C. Site sobre a NZASM
Refere-se GP Moodie em 1882 a propósito duma proposta sua de linha férrea na região: 
Barberton branch line -In 1882, George Pigot Moodie, Surveyor General of the ZAR, suggested that the Oosterlijn (HoM: seria a linha entre Pretória e LM que estava ainda só em plano) needed to reach Ermelo through the Cape River Valley rather than through Nelspruit
This was all later rendered moot, as the discovery of gold in 1884 in the Cape Valley near Barberton required the building of a branch line to the mines. The cost of construction was so significant, given the mountainous terrain, that the ZAR government objected. The local business Lewis, Marks & Watkins formed a syndicate to build the line and the work was contracted to Pettegrew & Co. After heavy rain damaged the bridge, the contractor went bankrupt and the syndicate was dissolved. NZASM took over construction and completed the line in 1896.

Comentários