Defesa de LM em 1894 - barricadas viradas a norte nas travessas da Baixa (7/14)

Continuo a série sobre o cerco de Lourenço Marques, actual Maputo da segunda metade de 1894 e falando ainda sobre as barricadas na Baixa, o último reduto para a resistência da cidade à sublevação dos povos ronga. Conforme vimos pelo cronograma dos acontecimentos principais elaborado segundo Eduardo Noronha (EN) no livro "Defesa de Lourenço Marques" disponibilizado pelo site malhangao maior ataque, o do dia 14 de outubro, não passou da linha exterior de defesa (blockhaus). Por isso nenhuma dessas barricadas chegou a fazer fogo a sério mas com o sono, o nervosismo e a falta de práctica dos voluntários alguns tiros foram disparados esporádicamente a partir delas.
Mostramos na planta do artigo anterior relativa ao pós 14 de outubro de 1894 cinco barricadas viradas a norte marcadas a preto e que seriam as mesmas ou modificações das que tinham sido aí instaladas em setembro e que apareciam marcadas aqui de A a E. A foto seguinte é duma dessa barricadas como veremos a seguir (foto e legenda do livro Xilunguine de Alexandre Lobato). 

FOTO 1
 "Estacadas artilhadas em LM em 1894 barricando na Av da República
o acesso às travessas da Baixa. De serviço os Voluntários da Defesa Civil

Como fazia face à Av. da República, actual 25 de Setembro esta era uma das barricadas para as travessas que segundo EN estavam tapadas com zinco e madeira. A madeira parece evidente nesta foto e para termos uma ideia mais geral do que se fala nesta foto dos voluntários estrangeiros pode estar uma das referidas placas de zinco (ferro zincado). 
Note-se que a constituição desta barricada era diferente da que depois foi erigida na praça e virada para norte e que como vimos aqui era feita de barricas de ferro e trollies. Sei que todas as barricadas foram reforçadas a partir de 4 de outubro mas como o que foi feito para cada uma delas pode ter variado e como não sei a data exacta da FOTO 1 não sei dizer a situação exacta do que aí se vê, se anterior ou posterior ao reforço.  
Vê-se na FOTO 1 que a barricada estava guarnecida maioritáriamente por civis mas também não é partir daí que consigo dizer se seria uma das A a E iniciais ou das pós 14 de outubro. O importante é notar que as barricadas nestas travessas foram instaladas em 24 de setembro, contráriamente às da praça 7 de março que só o foram depois de 14 de outubro de 1894.
Vejamos então de novo a posição das últimas barricadas da Baixa, tal como se viu aquiNote-se que neste PLANO a Av. D. Carlos, actual 25 de setembro donde foi tirada a FOTO 1 parecia estar bem definida mas na realidade embora tivesse já lancis de passeio não estava pavimentada (talvez nem estivesse completamente aterrada nomeadamente do lado oposto ao que se pode observar e que seria o do antigo pântano).

PLANO DE ARAÚJO de 1892 / 95 
com a estimativa das barricadas de pós 14 de Outubro de 1894
Laranja claro: Av. D. Carlos, actual 25 de setembro e donde foi tirada a FOTO 1
Pretos: barricadas nas travessas dessa avenida para a Rua da Gávea
 e D. Luis, actual Consiglieri Pedroso, uma delas seria a da FOTO 1
Verde médio: praça 7 de março, actual 25 de junho com as suas barricadas "finais"
Roxo: actual Av. Samora, antiga Aguiar
Branco: actual Av. Marx, antiga Central, depois Manuel de Arriaga
Branco e preto: Av. Paiva Manso, actual Magaia
Outras cores: não interessam agora

Na FOTO 1 as direcções dos dois canhões coaduna-se com as direcções em que se esperaria que o ataque à Baixa fosse feito. Se tivessem rompido as defesas exteriores, os rebeldes presumivelmente viriam a descer uma das avenidas da parte alta (caso das que têm as marcas "branco" e "branco e preto" no PLANO) ou viriam do lado do pântano do Maé surgindo do oeste pela Av. D. Carlos (do lado esquerdo no PLANO, à direita na FOTO 1). No primeiro caso os defensores disparariam a peça ao centro e no segundo a peça à direita da FOTO 1. 
Penso que a travessa da FOTO 1 seria uma das que ficavam para ocidente = esquerda da Travessa da Fonte, que a partir de o mais tardar 13 de outubro de 1894 passou a ser defendida pela barricada "verde escuro" e por isso sem barricada face à Av. D. Carlos, actual 25 de setembro. Podia dar-se o caso da barricada da FOTO 1 ser anterior a essa data mas a foto não me parece mostrar a entrada na Travessa da Fonte que é aqui a rua "verde escuro" onde o primeiro prédio à direita = oeste tinha telhado a quatro águas, enquanto que o da FOTO 1 tinha duas águas. 
A FOTO 1 poderia ter então sido tirada em frente às travessas da Laranjeira, da Porta da Linha, do Baluarte Norte, da Palmeira e à actual Rua da Mesquita, nomes e posições que se viram aquiPelos poucos e anódinos edifícios aí à vista e pela falta doutras fotos contemporâneas da zona que permitam comparar, não consigo localizar exactamente qual dessas cinco travessas seria mas, por exclusão de partes, a mais provável seria a do Baluarte Norte, a central nas barricadas "pretas" no PLANO. Parece-me que EN confundiu os nomes de algumas dessas travessas, esta seria a "C", mas se não o for seria uma das do lado.
Sobre as barricas escreve EN na pág. 93 imprimida: "A policia e as forças de caçadores n.° 3 e 4, soldados e officiaes, fizeram serviço de campanha, dia e noite, durante 76 dias. A força de marinheiros, todos os officiaes que estavam em diferentes commissões, todos os operarios e pessoal menor das repartições, todos os funccionarios, bombeiros voluntarios e bastantes habitantes, perderam 46 noites guarnecendo as barricadas, ao relento, á chuva, alguns dias ao sol, de espingarda ao hombro, promptos a fazer frente ao que viesse" e acrescenta que por esse motivo houve posteriormente muitos casos de doença que necessitaram de hospitalização. 
No próximo artigo veremos como estes acontecimentos foram seguidos internacionalmente e depois que implicações estratégicas tiveram e poderiam ter tido para a região.

Comentários