Porto de LM no início - PP c. 1900 com os exilados boer (9/)

Continuando o tema da Ponte de (desembarque de) Passageiros (PP) que vimos por exemplo no artigo anterior, as duas fotos de baixo, porque mostram refugiados africanders da guerra anglo-boer de 1899 - 1902 prestes a partir do porto de Lourenço Marques (LM), actual Maputo para exílio na Europa têm a vantagem de ter período bem definido. A FOTO 2 é do final de 1899 e a primeira deve ser dessa altura ou de 1900 e por isso podemos considerá-las de c. 1900. 
Podemos então dizer que estas duas fotos são ainda do tempo em que o Cais da Alfândega (CA) era o melhor equipado e por isso aquele onde se movimentava a maior parte das mercadorias no porto de LM. São então anteriores à construção da ponte-cais Gorjão que se iniciou em 1902 e à criação em frente = para sul do CA da primeira doca que deve ter sido um pouco posterior a 1902.
Temos então nas duas fotos e visto em sentidos opostos o lado a leste = nascente da plataforma em alvenaria chamada Cais da Alfândega e cuja face oposta estava uns 100 metros para oeste, frente à Alfândega antiga. Era desse lado mais a oeste que se tinha projectado para o meio do estuário a Ponte da Alfândega que aparecia, nas versões iniciais, nas fotos de Fowler de c. de 1886 e nas de MRP de c. de 1990 e que foi evoluindo depois.
Nestas duas fotos aparece mais perto o muro com uma vedação metálica que devia separar o terraço do CA onde se movimentavam mercadorias (para a esquerda na FOTO 1 e para a direita na FOTO 2) e ao qual seria autorizado acesso só aos empregados do porto e o corredor que os passageiros seguiam para passar de terra à Ponte de Passageiros donde pequenas embarcações os transfeririam a navio(s) a vapor que estaria(m) fundeado(s) no estuário. 
Na FOTO 1 vê-se à direita uma passadeira em madeira que devia fazer a ligação do corredor na Plataforma do CA (PCA) ao tabuleiro da PP construido nesse material. Do lado oposto, para a esquerda e fundo (norte), aparece a ligação desse corredor à terra firme. Note que ao tempo destas fotos não aparecia no corredor o kiosk que vimos na FOTO 3 do art 6 da primeira doca e que estava colocado digamos a meio da distância entre terra e o início da PP (essa foto pode ser posterior à FOTO 1 de c. 1900, quer dizer pode ser já do tempo da primeira doca).  

FOTO 1, anterior à primeira doca, do tempo do Cais da Alfândega
Branco: corredor no lado a leste da Plataforma do Cais da Alfândega (PCA), 
visto aqui de terra até ao início da PP, à direita
Amarelo: lado virado a poente da Fortaleza
Amarelo e laranja: cortina sul da Fortaleza, na direcção oeste - leste  e face ao estuário
Verde escuro: aprox. canto a SE da Praça 7 de março, actual 25 de junho
Vermelho e amarelo: berma a leste da rua Tavares de Almeida, que passava do lado leste da praça e em frente à Capitania "azul"
Azul: primeira Capitania do porto, antigo quartel, entre a dita Praça e a Fortaleza
Verde claro: plataforma junto a terra e penetrando no estuário
 (vê-la em fotos desse local nos artigos 22 e 23)
Verde normal: muro suporte a oeste do lado mais a sul da Fortaleza

A FOTO 2 seguinte é do final de 1899 e provávelmente mostra o mesmo acontecimento ou um semelhante ao da FOTO 1. Aqui o corredor de acesso à PP está a ser visto do lado de terra e por isso temos a água do estuário à esquerda = leste e o muro com a vedação metálica aparece à direita:

FOTO 2, anterior à primeira doca, do tempo do Cais da Alfândega
Legenda original: "Imagens da guerra do Transvaal: refugiados
esperam um navio a vapor alemão"

Temos então na foto o corredor de acesso à PP, limitado à esquerda pelo limite a leste da PCA e à direita pelo muro com a vedação metálica, que seria a linha marcada aqui (artigo a "azul e branco" na carta de SALM de 1903 onde indico também a posição doutros elementos de que aqui falámos. 
Então para oeste do muro destas duas fotos estava o resto da PCA onde funcionava o cais. Inicialmente a sua ponte de desembarque de passageiros tinha sido a Ponte da Alfândega que se projectava a partir do canto a SW da PCA mas a certa altura deve-se ter pretendido separar o movimento dos passageiros que ia / viam para / de essa ponte da actividade de cargas e descargas de mercadorias. Para esta actividade ficou então reservado o lado a oeste da PCA enquanto que o movimento de passageiros ficou adstrito ao corredor do lado leste da PCA e de que estas duas fotos mostram a actividade.
A situação assim descrita foi anterior à Primeira Doca pois quando esta foi criada embora tivesse continuado a haver uma PP esta foi uma nova construção colocada mais para leste da que existia ao tempo destas duas fotos, tendo o acesso a ela sido deslocado para leste do local anterior que aqui se via (para a esquerda na FOTO 2).
Estima-se na FOTO 1 a partir da posição da berma a leste "vermelho e amarelo" confirma-se na referida planta de 1903 do artigo 24 que a PP e o limite a leste da PCA ficavam aproximadamente na direcção da berma a oeste da rua Tavares d'Almeida (Td'A). Num artigo específico sobre a Td'A veremos que ela agora é outra rua mas aqui é onde esteve a rua Td'A inicial que era a faixa de rodagem imediatamente ao lado da praça, a faixa da actual av. Samora mais do lado da Fortaleza foi aberta só nos anos 50. A entrada de terra para o corredor da PP seria actualmente algures por aqui ao centro da imagem.
Revemos a seguir a foto tirada na zona portuária e que apareceu no artigo sobre a visita do Príncipe Louis d'Orléans e Bragança a LM em 1900.

FOTO 3 (de 1900 e do livro do príncipe)
Legenda no livro: Desembarque em Lourenço Marques

Como temos visto o porto em LM em 1900 ocupava um espaço muito limitado (a PCA com cais a sul e a oeste e um muro cais junto a terra para oeste da PCA) e por isso em princípio não devia ser difícil localizar a FOTO 3 a partir de vários elementos que poderíamos reconhecer nela. Primeiro vê-se ao fundo grades com as varas verticais em forma de lança e que me parece que são duas partes diferentes formando um ângulo recto. Segundo são os braços de vários guindastes à distância, da esquerda para o meio da foto pelo que por aí seria o lado da água. Terceiro são as duas construções, à esquerda uma pequena que podia ser a cabine "ocre" de que falámos noutros artigos e à direita o telhado que podia ser do coberto ou armazém longo também aí falado. Estaríamos então sobre a PCA, até como seria previsível, mas não consigo encontrar a boa orientação do que aqui se veria mesmo invertendo a foto (rodando-a horizontalmente). Como está a foto as grades ao fundo não podem ser uma das que limitavam do lado oeste o corredor para o embarque / desembarque de passageiros na PP no lado a leste da PCA e que vimos nas FOTOS 1 e 2 pois desse lado não haveria guindastes para trás (para aí seria estuário). De notar que havia mais grades desse tipo nessa zona do cais da alfândega como seja esta na vedação exterior e assim fica a localização e orientação exacta da FOTO 3 por esclarecer.
Série completa aqui sobre o desenvolvimento do porto até ao início do século XX.
NB: Este site com pdfs dum artigo da Revista Filatélica diz o seguinte que pode estar relacionado com a situação das FOTOS 1 e 2: "By the end of September 1900 Cape Volunteers, groups of burghers from the Transvaal and Free State crossed the border into Mozambique and exiled themselves voluntarily to avoid capture by the British. The Boers in Mozambique were regarded as internees but no attempts were made to restrict their movements; however, following pressure by the British 1260 adults and 173 children were evacuated from Lourenco Marques to Lisbon during March and April 1901". 
Quanto ao tema principal do artigo, vê-se que a PO Box 21 = Caixa Postal 21 concentrou cartas para P. Berthoud e Frau Eberhardt e em que os locais Delagoa Bay, Tembe e Magude Antioka eram mencionados. Esse nomes eram de missionários e de estabelecimentos da missão suíça em Moçambique por volta de 1900 e com essas referências parece-me que a CP 21 estava relacionada com a missão e não com as duas hipóteses que o autor coloca.
Voltando às As FOTOS 1 e 2, segundo a informação de cima elas poderiam então ser de 1901 mas presumo que tenha havido mais partidas de boers para a Europa logo que a guerra deixou de correr de feição para a suas forças, isto é para o final de 1899.

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