Porto de LM no início - trabalhos no lado leste da PCA (24/)

Continuando a série sobre a evolução da zona mais a leste do porto de Lourenço Marques (LM), actual Maputo até c. de 1900 recordo os dois pontos seguintes:
(i) no artigo 21 vimos o que parecia ser uma pequena doca interior (PDI) a sul do segundo coberto da Alfândega, por volta de 1897/98; 
(ii) no artigo 23 com base no que parecia ser um molhe "azul escuro" paralelo à costa coloquei inicialmente a hipótese da abertura dessa PDI para o estuário ser principalmente a leste onde iria até à posição do canto a SE da futura Plataforma do Cais da Alfândega (PCA). Do lado sul a PDI estaria na maior parte fechada por esse molhe "azul escuro" que a leste terminava por uma escadaria, o que era confirmado por esta fotoe a oeste estaria ligado a uma ponte / molhe construida cerca de 1889/90 a SE da Casa da Alfândega. 
Neste artigo vamos procurar em mais fotos o que poderá mostrar essa hipotética situação do lado a leste da referida PDI, antes e depois da PCA ter sido concluída. Na realidade as imagens que aqui apresento tinham já sido mostradas noutros artigos mas penso que só agora a interpreto correctamente. 
A FOTO 1 provém do Arquivo Histórico de Moçambique (Colecção Iconográfica da Câmara Municipal de Lourenço Marques) - Icon 99. Mostra para o fundo o lado nascente = leste da praça 7 de março, actual 25 de junho (aqui referida como praça) na Baixa de LM para o fim do século XIX ou início do XX (20), numa vista para norte a partir duma construção no estuário.

FOTO 1
Vista da cidade a partir dum molhe em construção penetrando no estuário
 com o lado leste da praça para o fundo

Via-se para a frente na foto, para a direita = leste da direcção do novo molhe, a praia do estuário do Espírito Santo e mais para norte estavam muros que impediam que a água quando a maré subisse invadisse a praça, que da sua extensão inicial devia ter já sido ampliada para sul.
Junto a seguir a FOTO 1 a um postal relativo à mesma zona do lado leste = nascente = jusante no estuário da zona genéricamente conhecida como Cais da Alfândega (CA) e destaco-lhes os pontos principais:. 

MONTAGEM 1 com FOTO 1 e POSTAL (clique para aumentar)
Rosa: lado a leste do telhado dum longo armazém do porto
Verde escuro: lado a leste da base desse armazém. construído sobre aterro 
Ocre: telhado de pequena cabine a sul desse armazém
Castanho escuro: posição de muro de suporte a sul da cabine que estava em obras na FOTO 1
 e de que tento representar a sua (anterior) posição no POSTAL
Roxo tracejado: só se vê no POSTAL, muro-cais a sul da plataforma do CA
Azul escuro: teria sido a face exterior = sul do molhe paralelo à costa, aqui do mesmo lado
Preto: tabuleiro superior da Ponte de Passageiros (PP)
Vermelho e branco: rua Tavares d'Almeida, a do lado leste da praça 7 de março
OUTROS ELEMENTOS NA FOTO 1
Seta castanha clara: DAIRY, quer dizer leitaria de que nunca tinha ouvido falar
Seta preta: entrada e armazém da Casa Holandesana esquina entre
 a praça e a rua de NS Conceição, actual de Timor Leste
Azul normal: frente e lado a sul do quartel do batalhão n. 4, depois Capitania do porto
Púrpura, à direita: cortina oeste da Fortaleza, com porta e janelas abertas
Amarelo: torreão adicionado a sudoeste da Fortaleza inicial, foi demolido depois
Verdes claro e normal: muros / plataformas sobre a praia, paralelos ao estuário

A cabine "ocre" e o armazém "rosa" por exemplo certificam que se trata do mesmo local mas veremos que em tempos diferentes. Podemos afirmar que o POSTAL é no mínimo de 1897 e que é posterior à FOTO 1 porque é só nele que se vê postes de electricidade "azuis verticais" que estariam ligados à central eléctrica inaugurada nesse ano. Mas a FOTO 1 até pode até ser posterior a 1897 pois não sabemos quando chegou a distribuição de energia eléctrica a essa zona junto ao porto. 
O fundamental é parecer-me que na FOTO 1 se preparava o crescimento para sul (o lado de cá nas duas imagens) do lado a leste da Plataforma do CA (PCA) que até aí tinha estado limitado pelo muro de suporte "castanho escuro". No POSTAL, uns tempos depois, esse limite da PCA tinha passado a ser o muro-cais "roxo tracejado" o qual estava mais afastado da cabine "ocre" do que o "castanho escuro" da FOTO 1. As obras em curso na FOTO 1 seriam então para se aumentar a PCA para sul para o que se ocuparia o que tinha sido a (hipotética) abertura para leste da PDI. Devo no entanto dizer que esse espaço no POSTAL (por ex. onde estão as grades) me parece maior do que na FOTO 1, onde teria sido entre as linhas "castanho escuro" a norte e "roxo tracejado" / "azul escuro" a sul. Mas os ângulos de visão são um tanto diferentes nas duas imagens e de qualquer modo reduzidos de modo que a sua observação não dá boa noção da profundidade e não vejo alternativa a esta interpretação.
Assim os sacos de areia / pedra que aparecem na FOTO 1 estariam sobre o que teria sido a abertura a leste da PDI. Foi o seu conteúdo que serviu de enrocamento para a construção em alvenaria da PCA que vemos por exemplo aqui c de 1899 - 1900.  As grades metálicas serviriam para que os sacos não se desviassem para o lado do estuário. 
As duas imagens da MONTAGEM dão então ideia de que a construção da PCA, do lado a sudeste, terá tido duas fases, na primeira o seu limite terá sido o "castanho escuro" da FOTO 1 e na segunda e definitiva o "roxo tracejado" do POSTAL. Terá sido só depois da segunda fase ou seja depois dos trabalhos que se viam na FOTO 1 estarem terminados e partindo do seu canto a SE que se construiu a PP do Cais da Alfândega, a estrutura em madeira e metal que aparece marcada a "preto" no POSTAL. Do outro lado da PCA, no seu canto a SW, lembro que se via aqui cerca de 1900 a Ponte da Alfândega saindo do mesmo muro-cais que marquei em cima a "roxo tracejado" mas aí marcado a vermelho.
Recordo que a hipótese da existência da PDI com abertura a leste e SE se baseou muito na observação do molhe "azul escuro"  e combinando as informações penso que a FOTO 1 terá sido tirada duma posição próxima da escadaria na ponta a leste desse molhe. O POSTAL foi fotografado em posição mais para sul (onde o estuário era mais profundo) do que a FOTO 1 e certamente sobre a PP e para a direita = oeste do seu ângulo que se via aqui.
Como dissemos não há cartas que mostrem a evolução que intuo destas duas imagens que presumo tivesse ocorrido em curto espaço de tempo. A carta mais pormenorizada do local é de 1903 e mostra já a Plataforma do Cais da Alfândega (PCA) e a PP do POSTAL, isto é a situação imediatamente anterior à construção da ponte-cais Gorjão e à transformação desta zona na primeira doca. Acrescento à planta o que descrevo em cima e que penso que a precedeu.

CARTA de 1903 (Salm)
Original na planta, situação do POSTAL
Preto: Ponte de (desembarque de) Passageiros (PP), no POSTAL à direita
Carmesim: Plataforma do CA completa com três lados face ao estuário (Este, Sul e
W = Oeste) mais as duas pontes projectando-se para sul 
Roxo tracejado: lado sul da plataforma do CA, assim marcado no POSTAL junto à água 
e que tinha sido antes o molhe "azul escuro" que estaria para as costas na FOTO 1
Branco e vermelho: berma a leste da rua Tavares d'Almeida, passava ao lado da parte central da praça
Amarelo e vermelho: berma a oeste da rua Tavares d'Almeida
Verde: parte centro e sul da praça já ampliada para sul ("verde claro")
Púrpura: Fortaleza
Azul e branco: presumo que muro separando o corredor de acesso para passageiros de terra à PP do resto da PCA (grade superior aqui no canto inferior esquerdo)
Elementos da situação anterior, a da FOTO 1:
Castanho escuro (horizontal): estimativa donde teria estado o muro de suporte a sul da PCA
ao tempo da FOTO 1, pode ter sido um pouco mais a N ou a S
Castanho (vertical): aproximadamente onde teria estado o molhe que fechava a PDI a NE
Amarelo: parte da construção que estaria em curso na FOTO 1
Circulo ocre: posição aproximada da cabine da MONTAGEM 1, voltaremos a falar dela

Como dissemos antes a conclusão que tiro é que a parte "amarela" nesta carta corresponderia ao local da obra para completar a PCA a leste em curso na FOTO 1. Essa obra iria mais para a esquerda = oeste do que se consegue ver na FOTO 1 de modo a cobrir o interior da PDI mas no meridiano norte - sul à vista na foto teria ido desde: 
(i) a norte, a linha "castanho escuro" (mais visível na FOTO 1) e que era o limite a norte da PCA numa primeira fase, até
(ii) a sul, mais para dentro no estuário, à linha "azul escuro" que era a do molhe no estuário que terá passado a ser a parte mais a sul da PCA. 
A parte "amarela" teria então correspondido grosso modo à abertura da Pequena Doca Interior (PDI) descontando-se-lhe o molhe "castanho" que fechava a PDI a NE e que como já disse no artigo anterior penso que acabou por ficar integrado no interior da PCA - ver aqui a planta aproximada do antes e depois.
Ainda de notar que na carta as direcções "preto" da PP e "carmesim E" da PCA estavam alinhadas, pelo menos aproximadamente, com a berma a oeste da rua Tavares d''Almeida "branco e vermelho" e o  mesmo aconteceria ao tempo do POSTAL e presumo que tivesse sido o mesmo ao tempo da FOTO 1 embora tal pormenor não fosse aí muito visível.
No artigo seguinte continuaremos a falar destas construções que estavam do lado leste da plataforma do CA e da PP.
Série completa aqui sobre o desenvolvimento do porto até ao início do século XX.

NB: Como dissemos em cima, a PP do CA foi posterior à Ponte da Alfândega (PA) que saía para o estuário a partir da mesma plataforma mas do seu canto a SW. Por exemplo nesta foto com a PA em primeiro plano (foto de origem holandesa e que pode ser de 1895) a PP parecia não existir ainda dado que não aparecia à esquerda / para o fundo a sua extremidade a sul como deveria acontecer se existisse. Mas a PA e a PP do CA já existiam em 1901 como se comprova em duas fotos (1A e 2A) dos Lazarus publicadas nesse ano.

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