Porto de LM no início - molhe a sul da praça e entrada a leste (23/)

Prosseguindo a série sobre o porto de Lourenço Marques (LM), actual Maputo no seu início na zona a sul (S) da praça 7 de março, actual 25 de junho (e aqui chamada praça) e a sudeste (SE) da Casa da Alfândegavamos tentar compreender melhor a formação da Plataforma do Cais da Alfândega (PCA). 
Tinhamos visto no artigo 21 uma foto que, suponho eu, mostrava uma fase intermédia do processo de formação da PCA com uma pequena doca interior (PDI) com água do estuário, a qual como mostrámos aqui teria (pelo menos) os três limites seguintes:
a. a oeste (W), a primeira ponte / molhe sobre o estuário que estava em construção em frente à Casa da Alfândega cerca de 1889/90 e que se via nas FOTOS 1 a 3 do artigo 20;
b. a leste (E), um molhe para sul do qual não se conseguia ver nem a largura nem o comprimento e por isso não se podia dizer se a PDI estaria totalmente fechada desse lado = leste ou não;
c. a norte (N), do lado de terra, um muro "castanho escuro" que até podia coincidir ou estar muito próximo do muro "verde escuro" no limite do aterro que tinha servido de base para o segundo coberto da Alfândega (o qual ficava "encaixado" a sul da praça se nos quisermos orientar no espaço actual).
Quanto ao que se passaria a sul (S) da PDI, à primeira vista não seria de esperar que houvesse aí alguma construção pois o mais lógico seria que a progressão das construções e aterros na zona tivesse sido feita gradualmente do lado de terra = norte para o lado do estuário = sul. As plantas da zona levantadas nessa época não mostram a PDI nem como ela terá evoluido até ter aparecido a PCA no seu lugar, PCA que marquei a "carmesim" nesta planta de Salm de 1903. 
Mas vejamos fotos que mostram, embora à distância, o que existia a sul da praça por esses tempos. A primeira que já conhecemos daqui é do ano de 1895 e foi tirada da barreira da Maxaquene para a nascente zona portuária na Baixa. É do Arquivo Histórico de Moçambique (Colecção Iconográfica da Câmara Municipal de Lourenço Marques) - Icon 7.

FOTO 1 de 1895 (clique para aumentar)
Rosa: coberto a sul da praça 7 de março
Verde escuro: marcado sobre o limite a sul da base sobre o qual foi montado esse coberto
Azul escuro: parece ser a face interior = norte de um molhe paralelo à costa
Mancha azul: interior da PDI a sul do coberto com ligação ao estuário a SE
Carmesim: posição do molhe em frente à Casa da Alfândega 
e que veio a ser o lado a oeste da PCA
Castanho claro: Ponte da Alfândega em estacas de madeira, para sul do "carmesim"
Vermelho: para lá dos pilares metálicos do segundo coberto, 
cais formando ângulo recto que viamos na FOTO 1 do artigo 13 a "púrpura - preto"
Laranja médio: lado da Casa da Alfândega junto à sua esquina a SE
Amarelo: baluarte que ficava para SW do canto a SW da Fortaleza
Preto (vertical): mastro dos sinais ainda fora da Fortaleza, mais tarde passou para dentro
Castanho: armazém / coberto a sul e SW da Casa da Alfândega
Púrpura: cabine com respiro no telhado a leste no pátio da Fortaleza, aqui no limite à direita
Localização geral:
Verde claro: 
espaço algures no lado sul da praça
Laranja claro (à direita): esquina a SW da Casa Holandesa vista pelo interior
Roxo: actual rua de Timor Leste, ia dar à praça onde fazia a esquina da Casa Holandesa 
Branco: actual rua da Imprensa, continuação da Av. Lenine, antiga Augusto de Castilho

O elemento mais surpreendente na FOTO 1 é o molhe "azul escuro", aparentemente paralelo a terra e ao coberto "rosa". A perspectiva da foto não dá bem ideia do seu comprimento mas não devia estar longe do desse coberto ou seja da largura da parte central da praça que como dissemos no artigo anterior seria duns 87 metros. A foto também não permite ver bem o que existiria do lado a oeste = à direita desse molhe "azul escuro" mas é provável que ele estivesse ligado à ponte a W da PCA referida em "a." em cima. 
A FOTO 1 não cobre o lado a leste da PDI ou seja a parte do estuário no meridiano do lado mais próximo do coberto "rosa" mas a observação atenta da foto seguinte traz novos elementos sobre o molhe "azul escuro" e o resto desse local por essa época (para a sua orientação em relação a terra veja-se a Igreja Paroquial ao fundo à direita). 

FOTO 2 com marcas (clique para aumentar)
Na ampliação / inserção:
Verde escuro: limite a sul da base do segundo coberto / armazém da Alfândega
Castanho escuro: estaria por aí o muro de suporte no limite a sul da plataforma entre terra e o estuário, mas não se consegue ver se estaria mais para cá = sul que o "verde escuro" ou não
Castanho: parece ser uma construção (pequeno molhe?) 
que não fechava totalmente a ligação de água entre o oeste = na PDI e o leste = estuário
Azul escuro: molhe que vem do lado oeste 
Azul médio: abertura para o estuário pelo canto a SE da PDI, 
como se "via" à esquerda da FOTO 1 também com a marca "azul médio"
Na foto original:
Esquina carmesim: abertura para o estuário no canto a SE da PDI ou molhes em ângulo recto que terá sido necessário construir para fechar a abertura
Rosa: segundo armazém da alfândega, ficava a sul da praça
Branco e vermelho: rua Tavares d'Almeida do lado leste da praça 7 de março 
Castanho claro: Ponte da Alfândega (CA)
Outras cores: menos relevante

Note-se que marquei a "azul escuro" na FOTO 2 o que seria o lado oposto do molhe que se via na FOTO 1 marcado com essa cor, de realçar que no seu extremo descia para o nível da água do estuário o que correspondia à escadaria que na FOTO 1 se via nessa posição. 
Sabemos que a PA "castanho claro" se projectava para o estuário a partir do canto a SW da PCA por isso na legenda da FOTO 2 estou a assumir que o molhe "azul escuro" coincidiu com a face sul da PCA que vimos por exemplo aqui cerca de 1900. Como se vê na FOTO 2 que esse molhe "azul escuro" era um pouco mais curto que o segundo armazém "rosa", fica também esclarecida a dúvida sobre o seu comprimento que a FOTO 1 tinha deixado. 
Juntando então o que se vê / intui nestas duas fotos ao que vimos aquiparece-me que a PDI estaria completamente fechada a oeste = lado de lá na FOTO 1 e a norte = lado de terra e que teria estado aberta para o estuário principalmente a leste e um pouco a sul devido ao molhe "azul escuro" ser um pouco mais curto do que a extensão da PDI no lado norte = de terra. A dimensão da abertura da PDI no que respeita à parte "azul escura" é visível na FOTO 2 mas no que respeita ao eixo norte - sul dependia da posição do muro de suporte "castanho escuro" e do o comprimento do molhe "castanho", dois elementos que não consigo avaliar. A "carmesim" indico assim genéricamente na FOTO 2 o que terá sido necessário construir para a PDI ser completamente fechada - de acordo com a hipótese que coloco aqui - de modo a que a PCA viesse a ter planta rectangular com a dimensão no eixo leste - oeste equivalente à do segundo coberto (cerca de 85 metros).
Como na FOTO 2 do seu lado a SE não aparecia a Ponte de Passageiros (PP) projectando-se para lado de cá = sul, a foto seria de ou anterior a 1901, a data máxima desta foto em que a PP já aparece. O facto de do lado esquerdo da FOTO 2 = a oeste já se ver a Ponte da Alfândega (PA) é compatível com o que se sabe dela ter sido anterior à PP.
A hipótese que coloco aqui - e que não se consegue comprovar pois as fotos que aqui vimos são parciais -  é então que na zona portuária em desenvolvimento a sul da praça actual 25 de junho e a sul do segundo coberto da Alfândega tivesse existido uma Pequena Doca Interior (PDI) até cerca de 1897/98. Depois o local terá rápidamente evoluido como indico na montagem seguinte de modo a que por volta de 1899/1900 a plataforma do Cais da Alfândega (PCA) estivesse concluida, incluindo por isso o seu canto a SE e o seu lado a leste, atingindo-se a situação que vimos por exemplo na foto com os exilados boer de 1899/90 à espera no corredor de acesso que ia de terra até à entrada na PP. 
Vejamos então como terá sido essa evolução segundo a hipótese do "molhe azul" pré-existente ter estado na origem da maior parte do limite a sul da PCA:
:
MONTAGEM Google Earth (clique para aumentar)
Linhas azul claro e preto: molhe inicial nesta zona a oeste, do lado da Casa da Alfândega
Verde escuro: limite a sul da base sobre o qual foi montado o segunto coberto
a sul da praça 7 de março, actual 25 de junho (o"rosa" na FOTO 1)
Castanho escuro: limite a norte da PDI, não sei em que 
posição exacta terá estado e como ela variou ao longo do tempo
Castanho: molhe do lado leste da PDI 
Azul escuro: possível molhe no estuário paralelo a terra e que se veria na FOTO 1 
e que terá estado na origem da maior parte do lado sul da PCA
Carmesim: desenho final da PCA
Púrpura - preto: muro-cais no meridiano da Casa da Alfândega 

O muro-cais "púrpura - preto" está desenhado na posição aproximada que teria c. de 1900,e que presumo viria de 1890 a qual viria a ser modificada daí para 1903 pois aparece na carta de Salm desse ano em posição aparentemente mais para sul. 
Para se atingir o desenho final da PCA, como do lado a Oeste ele estava definido desde cerca de 1889/90, suponho então que depois da situação da FOTO 1 se tenha aumentado um pouco para leste o molhe "azul escuro" a sul, feito a sua ligação a um molhe novo construído a leste e depois preenchido o espaço interior. As setas "castanha escura" e "azul claro e preto" que mostro na MONTAGEM para dois dos limites da PDI sinalizam que não sei bem em que posição eles estariam, é até possível que a sua posição tivesse sido gradualmente modificada. 
Não sei que dimensões exactas teria o molhe "castanho" mas seria relativamente curto e estreito. Para mais assumo que o limite a leste da PCA tivesse ficado um pouco para leste do que ele e de modo a ficar alinhado com a rua Tavares d'Almeida. Assumo então que o limite a leste da PCA terá sido integralmente construido de norte a sul quando se decidiu fechar a PDI e criar a PCA. 
É precisamente sobre esse lado a leste antes da PCA ter sido concluída que nos focaremos no próximo artigo. As fotos que veremos reforçam a hipótese que seguimos aqui de que a PDI esteve a certa altura parcialmente fechada a sul pelo molhe "azul escuro" mas no fundo isso é um pormenor na compreensão global do que por aí se passou por volta de 1900.
Série específica aqui sobre os três armazéns da Alfândega.
Série completa aqui sobre o desenvolvimento do porto até ao início do séc XX.




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