Porto de LM no início - ponte da Alfândega, canto no estuário e 1o. coberto (19/)

Vimos nos três artigos anteriores desta série sobre o porto de Lourenço Marques (LM), actual Maputo no início (artigos 1718 e 19) fotos do tempo da primeira Ponte da Alfândega (PA) construida em madeira a qual, certamente após o prolongamento referido por Alfredo Pereira de Lima no livro Pedras aparecia ainda desenhada na planta levantada em 1887 pelo Major António José Araújo.
Neste artigo e nos imediatamente a seguir vamos, olhando para mais fotos disponíveis, ver como evoluiu depois essa área à beira mar junto à Casa da Alfândega (CA) e que acabou por ser a primeira zona portuária de LM. O objectivo será perceber como para o final da década de 90 do século XIX estava ai construida em alvenaria a plataforma do Cais da Alfândega da qual saíam para sul a Ponte da Alfândega e a Ponte de Passageiros em madeira e metal, as duas aqui. Essas pontes estavam colocadas bastante mais para dentro do estuário do que a primeira PA que partia ainda de junto à praia natural.
Começamos pela FOTO 1 que se pode ver é posterior às dos três artigos anteriores dado que o edifício "gótico" da Casa da Alfândega aparece já recuado uns 70 metros da nova borda do estuário resultante da construção dum muro-cais que se vê para a esquerda (para NW). No espaço intermédio que foi aterrado tinha ficado soterrado o muro de suporte inicial que estava sobre a praia e distava uns 30 metros da frente desse edifício e tinha desaparecido a ponte de madeira inicial. Como se vê na foto a meia distância, nesse novo aterro tinha surgido o primeiro coberto para mercadorias da Alfândega e em primeiro plano estava avançada a construção duma plataforma em alvenaria que se projectava para dentro do estuário. Esta plataforma era perpendicular ao muro-cais `esquerda = para oeste que como veremos serviria para descarga de barcaças. 

FOTO 1
Foto de origem holandesa da zona frente à Casa da Alfândega
Legenda original: "Open goederenloods" = coberto para mercadorias

A fachada principal da Casa da Alfândega como se observa na FOTO 1 estava virada para o estuário e esta foto que a mostra mais próxima deve ter sido tirada sob o coberto para mercadorias que aparece na FOTO 1, mais própriamente no seu limite a norte. Do lado oeste da Casa da Alfândega (= para a esquerda da FOTO 1) estavam dois armazéns geminados e mais sob o comprido e do lado leste estava a conhecida árvore na borda da praça 7 de março, actual 25 de junho e que agora ficaria por aqui ao centro, do lado de cima da rua.
A FOTO 1 deve ser de cerca de 1889/90 pois nesse período o fotógrafo oficial português Manuel Romão Pereira (MRP) registou as mesmas construções. É o caso da foto seguinte que todavia parece mostrar uma situação um pouco anterior à FOTO 1.

FOTO 2 de c. 1889/90 (MRP)
Preto: Casa da Alfândega antiga em três volumes
Verde claro: lado sul e esquina a SW da praça, na direcção da frente do gasómetro 
Laranja claro: primeiro coberto da Alfândega, a sul desta, para oeste da praça
Púrpura - preto muro de suporte para novo aterro feito para sul da Alfândega 
funcionando também como muro-cais face ao estuário 
Linha carmesim (W): lado a poente = oeste da ponte / molhe em alvenaria e que 
viria a ser a faixa mais a oeste da futura plataforma do Cais da Alfândega (CA) 
Mancha carmesim: faixa a poente da plataforma do CA em execução nessa altura

A FOTO 2 mostra a construção duma ponte ou molhe em alvenaria perpendicular à terra firme para S - SE da Casa da Alfândega e que estava a começar pelos muros laterais (ver na FOTO 3 o muro oposto a este) e cujo interior (da caixa assim formada) iria ser preenchido com pedra e terra, como se vê estar a acontecer ao fundo da FOTO 2 e estava em estado muito mais avançado na FOTO 1. 
Não sei se ao tempo destas fotos havia já a intenção de se construir a plataforma do CA como ela veio a ser mas de qualquer forma o que aqui vemos acabou por fazer parte dela.  Foi no local destas FOTOS 1 e 2 que cerca de 1900 operavam os guindastes que içavam carga de barcaças fundeadas no ângulo recto formado entre a plataforma "carmesim" e o muro-cais "púrpura -preto". Pode-se então ver o local da foto de cima ao fundo nas FOTOS 2 e 3 do artigo 1 e particularmente o lado "carmesim" da ponte (aí já da plataforma do CA) nas fotos do artigo 4. Como as FOTOS 1 e 2 são de cerca de 1889/90 isso significa que o canto de estuário formado entre o muro-cais e a ponte em construção nessa altura não terá sido muito modificado depois disso e durante a última década.do século XIX (19).
Penso que MRP com a FOTO 3 seguinte MRP (do IICT) quis mostrar o que havia para a direita do que se via na FOTO 2. 

FOTO 3 (para norte) c. de 1889/90
Mancha carmesim: largura adicional do lado leste (E) da ponte / molhe
 em alvenaria de que se via o lado oeste (W) nas FOTOS 1 e 2
Azul claro: lado mais a nascente = leste dessa ponte / plataforma
Azul médio: quartel do batalhão número 4, depois primeira Capitania
Verde claro: lado sul da praça na altura, em frente ao gasómetro
Roxogasómetro, ficava perto do centro (no paralelo de E para W) da praça

Na FOTO 3 não se vê a esquina a SW da praça que marquei na FOTO 2 mas o gasómetro estava perto do centro (do paralelo de E para W) da praça e por isso podemos dizer que o lado a leste desta ponte ("azul claro" na FOTO 3) apontava talvez para a berma a leste da rua do lado oeste da praça, a chamada Rua da Alfândega (aqui podemos ver o local na direcção oposta , de terra para a ponte e por isso com o gasómetro visto pelas traseiras). Actualmente este lado "azul claro" na FOTO 3 mais ou menos devia estar onde está o lado à esquerda = W do museu das Pescas que se vê aqui. Com a FOTO 3 concluimos que a ponte / molhe em construção em 1889/90 tinha largura muito inferior ao que veio a ser a da plataforma do CA que veio a ocupar a totalidade do espaço a sul da praça, na distância indicada pela linha "verde clara" na FOTO 3. 
A foto seguinte também de MRP e da mesma época que as duas anteriores mostra essa zona em construção vista doutro ângulo e de mais longe. Presumo que foi tirada da ponte de Allen Wack sobre o estuário e já para leste da Fortaleza e por isso a zona da Alfândega onde decorriam os trabalhos estaria a uns 150 a 200 metros de distância. 

FOTO 4 (vista para oeste) de c. 1889/90
Azul claro: lado mais a nascente = leste da ponte / plataforma em construção
Vermelho: linha de costa / muros junto ao estuário para leste da Fortaleza
Laranja claro: primeiro coberto da alfândega, a sul desta, para oeste da praça 7 de março

Constata-se nesta FOTO 4 que não aparecia para sul = esquerda da ponte = molhe em alvenaria uma ponte em madeira e ferro, a PA que conhecemos bem das fotos de 1889/90 em diante, e que se 
projectava daí em direcção ao estuário. Pelas FOTOS 1 a 3 não conseguimos dizer se essa PA existia ou não em 1889/90 pois ela estaria fora do campo de visão mas a sua ausência na FOTO 4 faz crer que essa PA terá sido construída depois de 1889/90.
Podemos deduzir que o coberto "laranja claro" da FOTO 4 era o primeiro associado à Casa da Alfândega e que ficava a sul desta e para oeste da praça. Tinha de ser o mesmo que aparecia nas FOTOS 1 e 2 pois na FOTO 3 via-se que em por essa altura, em 1889/90, não havia outro coberto para leste desse, ou seja directamente a sul da praça. Um segundo coberto veio realmente ser aí instalado mas isso aconteceu depois de 1889/90 isto é depois do período das fotos deste artigo. 
Vimos então aqui em fotos o que se passava com as instalações portuárias em LM até cerca de 1889/90 digamos de frente à Casa da Alfândega até antes da direcção (meridiano) de meio da praça 7 de março, actual 25 de junho. No próximo artigo continuaremos a ver o desenvolvimento dessas instalações para sul, sudeste e leste da Casa da Alfândega.
No próximo artigo veremos o que se passava no lado sul da praça que se via para o fundo da FOTO 3 e na praia e estuário adjacente mas um pouco mais tarde do que aqui se observou.
Série completa aqui sobre o desenvolvimento do porto até ao início do século XX.

NB 1: Sublinho que entre as FOTOS 2 e 3 de cima que são de cerca de 1889/90 e as de c. de 1900 doutros artigos, a diferença maior é que a plataforma do CA em 1900 era muito mais larga do que a ponte em alvenaria que se via em construção em 1890. Por exemplo via-se nas duas fotos do art 9 que c. de 1900 a parte mais a leste da plataforma do CA estava alinhada com o lado a leste da praça 7 de março, enquanto que - como já vimos - o limite "azul claro" da ponte em alvenaria apontava para o lado a oeste da praça, quer dizer para uns 80 a 90 metros para oeste donde veio a apontar.

NB 2:  Como dissemos as FOTOS 1 a 3 deste artigo mostram que a ponte em alvenaria de c. 1889/90 era muito mais estreita do que veio a ser a plataforma do CA de c. de 1900. Todavia essas três fotos (e com a FOTO 4 também não será fácil fazê-lo) não permitem comparar o comprimento dessa ponte em alvenaria de 1889/90, medido na direcção de terra firme para o estuário mais profundo = para sul, com a dimensão da plataforma do CA de c. de 1900 nessa direcção. 

NB 3: Reforçando a localização do canto do estuário referida em cima, no meridiano do lado mais a leste da Casa da Alfândega, penso que o coberto que se vê nas FOTOS 1, 2 e 4 de c. 1889/90 (o primeiro da Alfândega) seria o mesmo que o que estava nessa posição em 1900 e que aparecia na foto do artigo sobre as munições para os boers. Ele era aí o que se via mais à esquerda, a estrutura para o telhado era a mesma nos dois casos mas presumo que depois de c. de 1890 o coberto original tivesse sido fechado lateralmente e nos topos.

NB 4: Alfredo Pereira de Lima (APL) menciona na "História dos Caminhos de Ferro" relativamente à primeira fase de construção do porto de LM que foi construida uma "ponte-cais em alvenaria, madeira e ferro com 6 m de largura e 121 m de comprimento atingindo na máxima baixa-mar 1 metro de profundidade". Isto quer dizer que no dia do ano em que a água estivesse mais baixa a ponte-cais ainda podia funcionar com barcaças de fundo inferior a 1 metro. APL diz também que essas obras aconteceram em 1885. Comparando com as realizações que se vê nas fotos de cima e que são do período 1889/90 questiono se: 
a. para os ditos 121 m de comprimento contava uma parte em alvenaria do lado de terra mais a ponte em metal / madeira que é de supor a prolongava para o lado do estuário? Mas se virmos bem APL não diz que havia essas duas estruturas separadas, nós é que podemos assumir esse facto tendo em conta o que conhecemos desse local à época das fotos do CA e PA (aqui por ex. nas 3 e 5) e tendo em conta que o comprimento total do CA mais o da PA não andaria muito longe desses 120 metros; 
b. seria a dita largura de 6 metros só dessa ponte final mais ligeira ou seria da parte mais larga e em alvenaria da ponte-cais? Pelo que se vê construído em alvenaria nas FOTOS 1 e 2 (e não se vê aí na totalidade) a largura dessa ponte seria bastante maior que os 6 metros que por isso se deviam referir à ponte final. 
c. estaria a data de 1885 referida por APL errada, mesmo que fosse só para o começo dos trabalhos? Julgo que para a feitura da ponte, dos muros-suporte e aterros e para o levantamento do coberto que se vê nestas fotos não teriam sido precisos 4 ou 5 anos, pelo menos em situação normal. 
Destes três pontos de discrepância entre o que se observa nas fotos e o que APL relata, em princípio concluir-se-ia que não haveria relação directa entre esses dois elementos mas de qualquer modo parece-me que haverá alguma ligação e daí que as fotos podem servir para "ilustrar" de certa forma o relato de APL (e vice versa).

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