"Casa das Tias" de Eugénio Lisboa e evolução no Alto Maé (1/2)

Este artigo que republico adaptado agora e o seguinte que elaboro de novo são a minha modesta e sentida homenagem póstuma a Eugénio Lisboa que faleceu no dia 8.4.2024. Sobre o acontecimento o jornal português Público publicou um obituário sub-entitulado "Ensaísta, crítico literário e o maior especialista português em José Régio morreu em Lisboa aos 93 anos".
Da obra de Eugénio Lisboa só conheço a sua autobiografia em 3 volumes mas presumo que fosse o luso-moçambicano com mais cultura clássica de sempre. Embora dotado de extrema inteligência e conhecimento parece-me que Eugénio Lisboa nunca deixou de ter os pés bem assentes na terra e manteve a simplicidade de rapazinho do Alto-Maé, como veremos aqui falando um pouco da sua infância e juventude na Lourenço Marques de antanho. 
Esta evocação será feita em torno dum edifício que fica que localizado no primeiro (grande) quarteirão da Av Mondlane, antiga Pinheiro Chagas do lado sul e por isso na parte mais antiga desse antigo bairro da cidade, perto da antiga Cervejaria Imperial, agora Xima, cuja construção que deve ser um pouco mais recente. 
Em 2007 o edifício parecia estar condenado à demolição mas foi reabilitado depois o que foi um final relativamente feliz para quem vê a evolução duma cidade como uma combinação de modernização com a conservação do seu património cultural, histórico, social, natural e edificado. Como Eugénio Lisboa passou neste edifício momentos marcantes da sua vida a sua reabilitação permite recordá-lo e tentarmos fazer um flash-back sobre como era a zona nos seus anos de formação. 
Primeiro sobre o edifício:
Edifício em Junho de 2012 com as obras ainda não totalmente terminadas

Uns anos antes o edifício tinha estado neste estado lastimoso:
"Casa das Tias" em 2007

Voltando ao edifício com as obras concluidas. Nota-se aqui melhor que tinha telha nova na cobertura, presumo que originalmente tivesse tido telhado mas que entretanto tivesse colapsado. 
Edifício recuperado visto do lado sul  da Av. Mondlane, antiga Pinheiro Chagas
foto original do HoM - clique para aumentar

Focando-nos agora em Eugénio Lisboa (1930-2024), nas suas recordações laurentinas da infância e adolescência "Acta Est Fabula" - volume I (1930-1947) ele fala bastante desta casa pois passava lá muito tempo dado lá viverem as suas tias e tio do lado paterno, pessoas com gostos culturais avançados para a época e que por isso contribuiram para o seu despertar intelectual. Presumo que a casa tivesse sido construida para a família e por isso seja dos anos 10 ou 20 do século XX.
Eugénio nasceu e cresceu em diversas casas antigas junto ao antigo Largo Albasini (actual praça do Alto-Maé B), do lado da Rua dos Irmãos Roby, presumo que para a esquerda de onde está agora este prédio dos anos 50 ou 60. Por isso Eugénio vivia a poucas centenas de metros deste local e como ele destaca tinha uma relação próxima com as suas tias (e tio), especialmente com a mais nova.  
Curiosamente Eugénio menciona também no seu livro que era frequentador assiduo do Cinema Variedades no prédio Rajá de 1934. Como ficava em frente a esta casa, nos intervalos (entre filmes das sessões múltiplas comuns na altura, presumo) ele costumava atravessar a avenida para ir lanchar com as tias. 
Com manifesto pesar Eugénio Lisboa escreveu que chegou a ver a casa muito modificada e delapidada, nomeadamente uma escadaria em madeira entre os pisos que o seu tio marceneiro de profissão tinha cuidadosamente executado. Presumo que essa observação tenha sido feita em visita a Maputo posterior a 1976, ano em que deixou a cidade e daí esta reabilitação, mesmo que imperfeita, deve ter-lhe dado alguma satisfação mas não sei se a referida escadaria foi mantida ou não.
Noto que na primeira foto por trás da casa se vê a vivenda castanha na rua do Bispo Barroso de que falo neste artigo
Continuarei a falar desta casa, da sua zona e de Eugénio Lisboa no artigo seguinte

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