Lanchas canhoneiras em LM, Capelo (e Ivens) c. de 1895 (1/11)

Pela definição de Luís Miguel Bessa Pacheco no COLÓQUIO PORTUGAL E A I GUERRA MUNDIAL (1914-1918) "A lancha-canhoneira era um navio com um deslocamento de até 135 toneladas, 35 metros de comprimento, reduzida velocidade e reduzido calado. Este tipo de navios era utilizado na patrulha e fiscalização fluvial, estando dotados de uma ou duas peças de artilharia de pequeno calibre e metralhadoras. Em 1914, Portugal tinha sete lanchas-canhoneiras".
Como vimos neste artigo na campanha militar de Gaza contra Gungunhana / Gungunyane em Moçambque em 1895 participou directamente a lancha canhoneira Capelo (Capello) que vemos na foto seguinte

FOTO 1
Lancha canhoneira Capelo (com outra lancha a estibordo)

Como observaremos neste e nos artigos seguintes muitas destas lanchas eram parecidas. A da FOTO 1 tinha a cabine no deck superior longa, duas chaminés de maior secção e colocadas sobre a secção das fornalhas e caldeira a vapor e as rodas propulsoras com pás à ré. 
O site alernavios donde vem a foto de cima tem a seguinte informação sobre a Capelo: "Esta lancha-canhoneira da Armada Portuguesa fazia parte de uma série de navios ligeiros de 40 toneladas de deslocamento construídos em Inglaterra - nos estaleiros Yarrow - em finais do século XIX. As outras eram a «Ivens», a «Lacerda» e a «Serpa Pinto». A «Capelo» foi realizada em 1894 e terminou a sua actividade operacional no ano de 1908. Media 26,50 metros de longitude por 5,50 metros de boca. Concebida para operar em rios africanos submetidos ao regime sazonal de águas baixas, o seu calado era mínimo, não excedendo 0,50 metro. A sua propulsão era assegurada por 2 máquinas a vapor (horizontais) de alta pressão, desenvolvendo uma potência unitária de 36 hp; que lhe permitiam navegar à velocidade máxima de 8 nós. Dispunha de uma roda de pás à popa. Do seu armamento constavam: 2 peças de 47 mm e 2 canhões-revólver de 11 mm, para além das armas individuais dos atiradores de bordo. A lancha «Capelo» (e similares) tinha uma guarnição de 21 homens, entre oficiais, sargentos, praças e pessoal inferiormente qualificado. Foi destacada para servir no sul de Moçambique e esteve nomeadamente no rio Inharrime, que banha a província de Inhambane. Nela viajou, em 1895, o major Mouzinho de Albuquerque (que percorreu o Limpopo até à junção com o Changane) durante a campanha organizada contra os Vátuas do régulo Gungunhana; que foi capturado em Chaimite". 
Podiamos desde logo questionar como esteve a Capelo no rio Inharrime e apareceu depois no Limpopo, o que significaria que teria de atravessar uns 200 km de oceano o que seria arriscado de tentar com calado de 50 cm e sem quilha. Trata-se dum erro desse site cuja explicação, como veremos adiante, é que a Capelo foi prevista para ser usada no rio Inharrime (vê-lo aqui, desagua na lagoa Poelela e tal como escrevia Ivens Ferraz em 1903) mas nunca lá esteve e foi únicamente usada navegando autónomamente no Limpopo.
O autor luso-moçambicano Alfredo Pereira de Lima (APL) no livro "Pedras" descreve a «Capello»: desta forma: "lancha de 40 toneladas, de aço, imersão 0,3 cm, armada com 2 canhões-revólveres Hotchiss 37 na tolda avante do alojamento e 2 metralhadoras no «spar-deck», afora algumas carabinas de ordenança", o que a traços gerais coincide com a descrição do alernavios e com o que se vê nas fotos.
Museu da Marinha expõe um modelo desta embarcação:


FOTO 2
Lancha Canhoneira Capelo de roda de pás à popa

O site Marinha de Guerra Portuguesa (MGP) coincide com o alernavios na informação de que havia quatro lanchas do mesmo tipo da Capelo (15), sendo as outras três a Ivens (19), a Lacerda (20) e a Serpa Pinto (23), todas construidas na mesma altura. No entanto o site os rikinhus diz que em vez dessa única classe  havia duas, uma constituída pela Capelo e pela Ivens (classe Ivens) e outra pela Lacerda e pela Serpa Pinto (classe Lacerda), o que é representado no quadro seguinte. 

QUADRO de CARACTERÍSTICAS (os rikinhus)


De notar que neste quadro é dito que o calado da Capelo era de 0.3 m o que é também o valor dado por APL mas a que chama imersão, enquanto que o site alernavios diz que ele não excedia 0.5 m o que pode não ser contraditório mas é mais vago. Ivens Ferraz na memória de 1902 "Descrição da Costa de Moçambique" diz para a "Lacerda» que ela demandava apenas 0,50 m a 0,70 m o que pode ser os 0,30 m de calado mais uma  margem de segurança.
Para além desta questão do calado ou imersão, se olharmos para estes dados de os rikinhus da Capelo e comparamos com os do alernavios, há coincidência relativamente ao comprimento e boca, ao armamento, à propulsão e à guarnição. Mas diferem no deslocamento da Capelo pois para os rikinhus era de 21 t enquanto que o MGP e Pereira de LIma diziam ser de 40 t. Segundo os rikinhus as lanchas com 40 t eram só a Lacerda e a Serpa Pinto, mas sendo essas duas mais curtas e estreitas que a Ivens e a Capelo parece-me que estas é que deviam ser mais pesadas mas ... 
Cria-se assim certa dúvida sobre estes dados e até sobre se as legendas originais das fotos estarão correctas, pelo que compararei agora outra foto da Capelo (que veremos mais completa noutro artigo) com duas da canhoneira dita da mesma classe, a Ivens (e em princípio a identificação destas duas é fiável pois são do arquivo da marinha):


MONTAGEM 1 (classe Ivens, inclui Capelo)
Canhoneiras Ivens (duas fotos em cima) 
e Capelo (em baixo)

Concluo daqui que a canhoneiras Ivens e Capelo eram iguais e por isso que se a lancha da FOTO 1 não for a Capello pelo menos é igual a ela. No próximo artigo veremos as Lacerda e Serpa Pinto, primeiro para tentar saber eram iguais e depois para as compararmos com as Capelo e Ivens e posso já adiantar que se confirma a informação de os rikinhus de que havia duas classes para essas quatro lanchas.
Como disse aqui, durante a campanha de Gaza em 1895 no rio Limpopo, primeiro em missão autónoma da Marinha e depois em apoio às tropas terrestres, o comandante da lancha-canhoneira Capelo (ou Capello) foi Álvaro de Oliveira Soares de Andréa que podemos ver em foto do arquivo da Armada Portuguesa:

FOTO 3
Primeiro Tenente Soares de Andréa, comandante da Capelo

No próximo artigo desta série falaremos das canhoneiras Lacerda e Serpa Pinto.
Mais sobre a Capelo / Capello neste artigo.

Comentários