Carros eléctricos: nas Praças, cruzamento na 7 de Março e volta na da Estação seguindo Salomão Vieira (4/6)

Continuando o artigo anterior sobre cruzamento ou desvios de vias na Av. Aguiar, depois D. Luis e actual Samora vamos ver aqui um desses pontos na rede dos carros eléctricos que Salomão Vieira (SV) no seu artigo disse que "parecia existir" no final da Rua D. Luis, depois Consiglieri Pedroso junto à Praça 7 de Março de Lourenço Marques, actual 25 de Junho de Maputo e mais própriamente no seu topo norte.
Entendo um tanto a reserva (o parece) de Salomão Vieira: primeiro no diagrama das linhas de 1906 esse cruzamento não aparece marcado mas acho que é por falta de detalhe do desenho, segundo é haver fotos onde não se nota duplicação de linhas mas penso que temos de considerar que estes carris não são salientes como os dos caminhos de ferro. Como se pode ainda imaginar a partir duma foto recente algures em Maputo trata-se dum carril de calha onde se insere a saliência da roda do carro e a parte superior do carril fica quase ao nível do pavimento pelo que bastava haver um pouco de areia no solo, a iluminação não ser boa ou a foto ter muito grão para ser difícil detectar-se aí o carril. 
Vejamos para começar duas fotos já conhecidas com a linha nesse local, cobrindo um período de tempo bastante largo pois a primeira será de c. de 1907 e a segunda de c. de 1929 e em que o cruzamento de vias parece bem visível:

FOTOS 1 e 2
Púrpura: marcas mostrando cruzamento (dois pares de vias paralelas)
na Rua Consiglieri Pedroso do lado norte da Praça 7 de Março, actual 25 de Junho

Via-se que o cruzamento terminava em frente ao kiosk Chalet pois nesse ponto a linha virava para norte já em via simples.
Na foto seguinte que é posterior a 1914 (esquadra da Polícia presente depois da Casa Amarela) vemos as linhas de carro eléctrico no mesmo local mas para as costas do que se via nas duas anteriores, o que nos permite ver o início do mesmo cruzamento de vias (nas FOTOS 1 e 2 via-se o seu fim, para quem seguisse no sentido da baixa para a Alta da cidade):

FOTO 3
Carro eléctrico ainda na via única a aproximar-se do cruzamento ou desvio
cuja continuação se via nas FOTOS 1 e 2

Este local da Baixa da cidade na antiga Rua D. Luis, depois Rua Consiglieri Pedroso (Revolução de Outubro?) é bem conhecido e por exemplo falámos dele neste e neste artigos.
Como vimos no artigo anterior, Salomão Vieira preparou uma planta esquemática das linhas na Baixa e centro da cidade que mostro a seguir e à qual acrescentei a cores as diferentes linhas e destaquei outros elementos da rede:  

ESQUEMA
Círculo púrpura: cruzamento de vias no topo norte da Praça 7 de Março, 
actual 25 de Junho visto nas FOTOS 1 a 3
Laranja: ponto na Rua Consiglieri Pedroso onde a linha 
mudava de lado na rua, do que vimos aqui na FOTO 2
Círculo roxo: Praça dos Caminhos de Ferro, actual dos Trabalhadores
onde a maior parte das linhas de eléctrico tinha o términus
Amarelo - verde: linhas para o Quartel do Alto Maé, em dois sentidos
Vermelho - azul: linhas para a Ponta Vermelha / Polana, em dois sentidos
Preto: linha para o Cemitério na Av. Pinheiro Chagas, actual Mondlane
Resto das cores: não é relevante agora

Passemos então do "círculo púrpura" do esquema para o "círculo roxo" respeitante à Praça dos Caminhos de Ferro, na altura Azeredo e depois Mac Mahon, agora dos Trabalhadores. Era daí que tinha saído o carro eléctrico que na FOTO 3 estava a chegar pela na altura Rua D. Luís. Falámos já de carros eléctricos nessa praça junto â estação dos Caminhos de Ferro aqui e recordo a seguir uma imagem muito antiga dela mostrando o que foi explicado neste artigo:

FOTO 4
Carro eléctrico na praça de Caminhos de Ferro 
 vista para leste = centro da Baixa a partir do lado da estação actual 

Passemos agora ao pormenor do esquema de cima relativo à linha do carro eléctrico na praça. O que vamos tentar seguir é se a linha dava a volta ou não à praça e o que isso implicava: 

ESQUEMA 1, pormenor da Praça dos Caminhos de Ferro em LM
Preto a cheio: linha inicial quando não dava a volta à Praça
Preto tracejado: parte necessária para a linha passar a dar a volta à Praça
Bola preta: paragem inicial para servir a estação existente até 1910
Bola preta e branca: paragem nova em frente à nova estação a partir de 1910
(mas primeiro só com a gare de passageiros que fica no interior) 
Bola laranja: por onde estava a passar o eléctrico da FOTO 4, 
no lado mais a leste da Praça, o do centro da Baixa
O que perceberemos melhor a seguir:
Vermelho: posição do trólei para o carro chegar à Praça
Verde: posição do trólei para o carro sair da Praça quando a linha não dava a volta 
e já na rua D. Luis, actual C. Pedroso para ir para o centro da Baixa
Verde e vermelho: posição do trólei do carro 
quando começou a poder dar a volta à Praça

Conforme SV escreveu no esquema, a e
stação dos Caminhos de Ferro inicialmente estava a sul da Praça e da forma como ele representou a linha (a preto a cheio) o carro parecia parar um pouco à frente dela (bola preta) e assim a linha (e os carros) não dava(m) a volta à Praça. Mais tarde a estação mudou para oeste da praça = esquerda no esquema e para a paragem ficar-lhe em frente (bola preta e branca), como se via nesta foto, foi necessário prolongar um pouco a linha inicial. Como a certa altura a linha passou a dar a volta à Praça (SV não sabe quando isso aconteceu) podemos supor que foi ao mesmo tempo que essa mudança de paragem, prolongando-se um pouco mais a linha a partir daí (preto a tracejado). 
Vamos também supor que quando a linha passou a dar a volta à Praça não se alterou o sentido inicial de chegada dos carros que entravam (e nesse caso saíam também) da Praça pelo seu topo a leste (bola laranja). Quer dizer que suponho que depois os carros terão continuado a entrar na Praça por aí mas a saír pelo seu lado oposto (o da estação nova).
É interessante analisar as duas situações, sem volta e com volta à Praça, e por isso acrescentei ao esquema os símbolos com os carros ("rectângulos" cinzentos). Conforme Fernando Pinheiro Martins explica na dissertação de mestrado para a FEUP sobre os carros eléctricos da cidade do Porto em Portugal "a corrente alimenta a linha aérea (catenária) que passa através do trólei para o circuito da instalação eléctrica da viatura escoando através dos rodados para os carris". Essa corrente (adaptado) "tem origem na catenária e passa através da roldana e da vara de trólei, para ser seccionada na aparelhagem do carro em duas instalações", uma para a luz e principal para os motores e pode ver-se o exterior da instalação na foto seguinte. 

FOTO 5
Guarda-freio (condutor) à frente, troléi com a base ao centro da carroceria
mas com a roldana na linha aérea de alimentação para trás

O trólei tem de estar sempre para o lado de trás do carro considerando o seu sentido de deslocamento e por isso represento-os no ESQUEMA 1 conforme esse sentido (em vez de  ter trólei e roldana pode ser um patim mas isso deve ser mais moderno). 
Estes carros normalmente são bi-direccionais i.e. têm posição para o guarda-freio à "frente" e "atrás" pelo que podem fácilmente fazer inversão do sentido de marcha numa linha única. No entanto é preciso o guarda-freio mudar a posição da vara de trólei, rodando-a para o lado oposto em torno da sua base no cimo da carroceria de modo a que a roldana que se encosta à linha de alimentação fique colocada para trás no sentido de deslocamento ("a manobra de colocação da vara de trólei no fio é executada por intermédio de uma corda que é recolhida num sarilho"). É isso que vemos a acontecer na foto seguinte ainda numa antiga linha de eléctrico da Cidade do Porto.

FOTO 6
O guarda-freio desapertou a corda da frente do lado de cá do carro, baixou o trólei
e está a mudar a sua posição do lado de cá para o lado de lá do carro

A roldana do trólei encosta-se à linha suspensa de alimentação pela força proporcionada por molas que estão na base da vara / haste do trólei. Estas molas fazem-na subir e por isso o guarda-freios na foto para além de se estar a deslocar tem que puxar a corda da ponta do trólei para baixo. Na FOTO 6 o carro tinha subido até ao alto dum monte onde era um fim de linha e por isso preparava-se a inversão do sentido de marcha para o carro voltar (para o lado de cá) para o centro da cidade. 
Manobra semelhnate quando o carro chegava à Praça dos CF em LM era também necessária quando a linha não lhe dava a volta. Mas quando a linha passou a circundar a praça, pode ver-se no ESQUEMA que o carro com o trólei "vermelho" da chegada logo a seguir passava a ser "vermelho-verde" e por isso podia continuar para norte e depois virar a leste e seguir pela Rua D. Luis, actual Consiglieri Pedroso já como se fosse o trólei "verde" como era aí requerido. Como deixou de ser preciso o guarda-freio fazer a manobra que se via na FOTO 6 quando a linha passou a dar volta à Praça o tempo de paragem dos eléctricos na Praça pode ter sido reduzido. 

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