D. António Barroso, prelado católico de Moçambique para o final do século XIX (fotos ACTD e wikipedia) |
D. António Barroso chefiou a igreja católica de Moçambique entre 1891 e 1897 (mas terá regressado a Portugal em 1895) embora nominalmente fosse bispo de Heméria, a sede dum bispado antigo no Levante. É considerado o responsável pelo ressurgimento missionário em Moçambique, em vontade conjugada com o alto-comissário António Enes, como vimos aqui relativamente às
missões nas terras de Maputo.
Bispo D. Antonio Barroso (com a cruz) em visita à Zambézia com membros do clero católico local |
Como se diz na publicação missionária além mar D. António Barroso tinha um espírito reformador para as missões e missionários que deviam combinar os esforços de expansão da fé cristã e de desenvolvimento educativo, económico e social das populações pelo exemplo e como professores, o que pelo que era descrito pelo Padre Boavida estava a ser posto em prática na região do Maputo ou terra dos Tembe.
Nessa linha escreveu D. António o seguinte e em 1889, ainda antes de ter ido para Moçambique: "O missionário deve levar em uma das mãos a Cruz, símbolo augusto da paz e da fraternidade dos povos, e na outra a enxada, símbolo do trabalho abençoado por Deus. Deve ser padre e artista, pai e mestre, doutor e homem da terra; deve tão depressa pôr a sua estola, […] como empunhar a picareta para arrotear uma courela de terreno; deve tão depressa fazer uma homilia, como pensar a mão escangalhada pela explosão duma espingarda traiçoeira».
No capítulo do ensino feito pela igreja católica, diz-se aqui que D. António Barroso inaugurou em Lourenço Marques (LM), actual Maputo em 1892 a missão suburbana de S. José de Lhanguene e que fundou o Instituto de Ensino Rainha D. Amélia, em 1893 que como sabemos foi instalado na Casa de Ferro pouco depois. Na publicação Portugal Missionário de 1928 aparecem duas fotos de escolas da igreja em Lourenço Marques mas custa-me distinguir seriam de instrução geral ou de catequese:
Era certamente embuído do espírito do Bispo Barroso e com vontade de ajudar novos missionários a encarar logo na formação os problemas da sua missão no Ultramar que o Padre Boavida escrevia em 1928 na introdução ao seu texto retrospectivo na publicação Portugal Missionário de 1928:
"Ao chegar a Lourenço Marques, notei logo a insuficiência do meu saber, sendo a minha desilusão maior, quando, passados alguns mezes, fui encarregado de lançar as bases desta missão, que tinha de ser religiosa e patriótica, e acentuadamente agrícola. Foi então que, tendo de organizar sozinho o registo paroquial e os livros de escrituração de contas; de dar execução a pequenas obras de construção; de fazer variadas experiências agrícolas; de manter as necessárias relações oficiais com diferentes autoridades, e de me entender quotidianamente com indígenas completamente ignorantes da lingua portuguesa, mais desoladoramente verifiquei quão dificiente era ainda a bagagem dos conhecimentos que trazia, e da experiência que não tinha.
Fazendo das tripas coração, não sem grandes e acabrunhadoras dificuldades, fui-me persistentemente preparando para a vida prática; mas quantos desânimos, quantos incómodos não experimentei e quão precioso tempo não perdi ! "
Não desejo que a ninguém suceda o que me sucedeu a mim e por isso aos novos missionários aconselho que não desperdissem o tempo em cousas, ou conversas inúteis, que o aproveitem todo aváramente, abroquelando-se para a viva luta que nas missões terão de sustentar, com a couraça feita de variadíssimos conhecimentos práticos, e com um forte e sincero amor a Deus e a Portugal.
"A todos os conhecimentos que forem adquirindo, devem dar uma feição prática, aprendendo a resolver não só os intrincados casos da consciência;a fazer exercícios práticos do registo paroquial; estudar escrituração; a treinar-se na enfermaria do Colégio e na farmácia; estudar topografia, desenho e música; a informar-se do funcionamento de várias oficinas; estudar as regras mais necessárias da construção civil, mas também a aprender tudo o que de prático puder, relativo á agricultura.
Torna-se também muito necessário adquirirem-se alguns conhecimentos de fotografia. Será o missionário só por si que terá de dirigir superiormente as suas oficinas; de levantar as construções da sua Missão; de curar ou ensinar a curar os doentes que pedirem a sua assistência; de ensaiar os cânticos religiosos de que o indígena tanto gosta; de dirigir os serviços agrícolas, e de fazer toda a escrituração escolar e de contas da Missão. Por isso, se não vier praticamente encaminhado em todos estes serviços absolutamente indispensáveis, a sua entrada na vida missionaria será uma serie de desilusões e de desenganos cruéis, embora venha pejado de brilhantes e profundas teorias.
As Missões são pobres e as mais das vezes não teem senão um missionário e alguns auxiliares indígenas, que o missionário vai preparando, por isso é quasi sempre ele que tem de fazer tudo e de vigiar por tudo. Não é fácil aprender ahi bem as linguas indígenas das nossas colónias; mas será muito conveniente que, distribuídos os alunos no 1.° ano de teologia para as colónias que terão de servir, comecem logo a estudar as principais, para que depois, quando se lhes tornarem necessárias, o seu estudo não seja fastidioso e feito atabalhoadamente, e ás apalpadelas".
E continuava o Padre Boavida o seu texto na publicação para quem estiver interessado em mais, embora a linguagem usada possa por vezes chocar actualmente. Para além das especificidades da missão de Maputo, o padre Boavida descreve aí pormenorizadamente os principais elementos da região em termos de populações, seus usos e costumes, linguas, geografia, fauna, flora, agricultura, indústria, economia, vias de comunicação (como já referimos neste artigo), etc. que podem ser uma boa fonte de estudo para quem queira por exemplo traçar a sua evolução nos últimos cem anos ou mais.
Nessa linha escreveu D. António o seguinte e em 1889, ainda antes de ter ido para Moçambique: "O missionário deve levar em uma das mãos a Cruz, símbolo augusto da paz e da fraternidade dos povos, e na outra a enxada, símbolo do trabalho abençoado por Deus. Deve ser padre e artista, pai e mestre, doutor e homem da terra; deve tão depressa pôr a sua estola, […] como empunhar a picareta para arrotear uma courela de terreno; deve tão depressa fazer uma homilia, como pensar a mão escangalhada pela explosão duma espingarda traiçoeira».
No capítulo do ensino feito pela igreja católica, diz-se aqui que D. António Barroso inaugurou em Lourenço Marques (LM), actual Maputo em 1892 a missão suburbana de S. José de Lhanguene e que fundou o Instituto de Ensino Rainha D. Amélia, em 1893 que como sabemos foi instalado na Casa de Ferro pouco depois. Na publicação Portugal Missionário de 1928 aparecem duas fotos de escolas da igreja em Lourenço Marques mas custa-me distinguir seriam de instrução geral ou de catequese:
Escola paroquial de LM |
Grupo de alunas de Lhanguene - escola referida aqui |
"Ao chegar a Lourenço Marques, notei logo a insuficiência do meu saber, sendo a minha desilusão maior, quando, passados alguns mezes, fui encarregado de lançar as bases desta missão, que tinha de ser religiosa e patriótica, e acentuadamente agrícola. Foi então que, tendo de organizar sozinho o registo paroquial e os livros de escrituração de contas; de dar execução a pequenas obras de construção; de fazer variadas experiências agrícolas; de manter as necessárias relações oficiais com diferentes autoridades, e de me entender quotidianamente com indígenas completamente ignorantes da lingua portuguesa, mais desoladoramente verifiquei quão dificiente era ainda a bagagem dos conhecimentos que trazia, e da experiência que não tinha.
Fazendo das tripas coração, não sem grandes e acabrunhadoras dificuldades, fui-me persistentemente preparando para a vida prática; mas quantos desânimos, quantos incómodos não experimentei e quão precioso tempo não perdi ! "
Não desejo que a ninguém suceda o que me sucedeu a mim e por isso aos novos missionários aconselho que não desperdissem o tempo em cousas, ou conversas inúteis, que o aproveitem todo aváramente, abroquelando-se para a viva luta que nas missões terão de sustentar, com a couraça feita de variadíssimos conhecimentos práticos, e com um forte e sincero amor a Deus e a Portugal.
"A todos os conhecimentos que forem adquirindo, devem dar uma feição prática, aprendendo a resolver não só os intrincados casos da consciência;a fazer exercícios práticos do registo paroquial; estudar escrituração; a treinar-se na enfermaria do Colégio e na farmácia; estudar topografia, desenho e música; a informar-se do funcionamento de várias oficinas; estudar as regras mais necessárias da construção civil, mas também a aprender tudo o que de prático puder, relativo á agricultura.
Torna-se também muito necessário adquirirem-se alguns conhecimentos de fotografia. Será o missionário só por si que terá de dirigir superiormente as suas oficinas; de levantar as construções da sua Missão; de curar ou ensinar a curar os doentes que pedirem a sua assistência; de ensaiar os cânticos religiosos de que o indígena tanto gosta; de dirigir os serviços agrícolas, e de fazer toda a escrituração escolar e de contas da Missão. Por isso, se não vier praticamente encaminhado em todos estes serviços absolutamente indispensáveis, a sua entrada na vida missionaria será uma serie de desilusões e de desenganos cruéis, embora venha pejado de brilhantes e profundas teorias.
As Missões são pobres e as mais das vezes não teem senão um missionário e alguns auxiliares indígenas, que o missionário vai preparando, por isso é quasi sempre ele que tem de fazer tudo e de vigiar por tudo. Não é fácil aprender ahi bem as linguas indígenas das nossas colónias; mas será muito conveniente que, distribuídos os alunos no 1.° ano de teologia para as colónias que terão de servir, comecem logo a estudar as principais, para que depois, quando se lhes tornarem necessárias, o seu estudo não seja fastidioso e feito atabalhoadamente, e ás apalpadelas".
E continuava o Padre Boavida o seu texto na publicação para quem estiver interessado em mais, embora a linguagem usada possa por vezes chocar actualmente. Para além das especificidades da missão de Maputo, o padre Boavida descreve aí pormenorizadamente os principais elementos da região em termos de populações, seus usos e costumes, linguas, geografia, fauna, flora, agricultura, indústria, economia, vias de comunicação (como já referimos neste artigo), etc. que podem ser uma boa fonte de estudo para quem queira por exemplo traçar a sua evolução nos últimos cem anos ou mais.
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