Porto de LM no início - mastro dos sinais e prédio da "clarabóia" (32/)

A respeito do porto de porto de Lourenço Marques (LM), actual Maputo no seu início, concluirei aqui o sub-tema do seu mastro dos sinais começando com a foto seguinte que já avaliámos em detalhe aqui. Será de entre c. de 1904 (pois aparece o Capitania Buildings construído) e 1910 (pois não aparece o rinque do Varietá que abriu em Novembro de 1910 e que apareceria no canto inferior direito da foto). A foto foi tirada da "pirâmide" do Hotel Carlton e olhando para leste vendo-se a Ponta Vermelha ao fundo (da enseada da Maxaquene) para a esquerda e mais próximo estava o mastro dos sinais, na sua segunda posição dentro da Fortaleza, para o centro - direita da foto. 

FOTO 1 
Castanho claro: sobre a porta central na cortina da Fortaleza virada a W
Preto: parte inferior do mastro dos sinais dentro da Fortaleza
Castanho escuro: canto a NW do Capitania Building(s)
Azul claro: fachada principal da Capitania do Porto dessa época
Verdes tracejado: parte dos limites da praça 7 de Março
Verde escuro: rua que dividia a praça a meio, 
na continuação da Rua Araújo, actual de Bagamoyo
Rosa: linha de vista da torre do Hotel Carlton para o mastro dos sinais

Doutra foto pode-se concluir que o mastro foi mudado para dentro da Fortaleza antes do início da construção do Capitania Building(s) pois o espaço à sua direita que veio a ser ocupado por esse edifício estava ainda completamente vazio (parte nem estaria aterrado ainda). 
Ainda de referir que pelo que se vê nas fotos que têm mais detalhe parece que o mastro dos sinais teve sempre cesto. o qual parecia maior quando passou para dentro da Fortaleza (ele era equivalente a um mastro da gávea mas erigido em terra).
Junto agora ao tema do mastro dos sinais o do prédio a que tenho chamado da "clarabóia" (mais aqui) levantando a (vaga) possibilidade de ter havido relação funcional entre os dois. Nas duas montagens seguintes vê-se esse histórico prédio que se situava do lado leste da antiga praça Azeredo, depois Mac Mahon e actual dos Trabalhadores:

MONTAGEM 1 
à esquerda: cerca de 1905, o prédio com a construção tipo "clarabóia" no topo
à direita: em 1961, essa construção tinha sido retirada

Seguem-se duas fotos equivalentes às de cima e que estão num anexo da Dissertação de Mestrado em Arquitetura de Filipe Teixeira dos Santos "Maputo: uma cidade onde o icónico liga a terra e o mar : fusão entre o desenvolvimento urbano e a iconicidade de um edifício.- Lisboa, 2019" e que lhe foram cedidas por Jorge Saramago (na tese essas fotos servem simplesmente para ilustrar a cidade dos tempos antigos):
MONTAGEM 2
à esquerda: o prédio com a construção tipo "clarabóia" no topo
à direita: anos 50, essa construção tinha sido retirada

O objectivo duma clarabóia num edifício será de fazer com que no seu interior se receba mais luz e calor do que com uma cobertura totalmente opaca. Em LM havia abundância desses dois elementos naturais o que explicaria eu não ter visto clarabóias nas fotos antigas da cidade apesar de haver um lanternim para luz no telhado do edifício dos Correios dessa época. A função dessa construção no prédio de cima podia então ter sido outra e de facto  ela parecia ser mais uma torre de observação pois teria uma plataforma (rodeada por guarda-peito). A plataforma ficava bem acima da cumeeira do telhado e do que teria sido um quinto piso no prédio e seria acessivel por escada interior a partir do terceiro piso do prédio passando pelo sótão. 
Neste prédio da "clarabóia" estiveram instaladas algumas firmas do sector da navegação e já tinhamos colocado a hipótese dessa construção ser afinal um ponto de observação para o porto e para a estação dos caminhos de ferro. Mas como estes "alvos" lhe estavam próximos e seriam fácilmente observáveis a partir dos seus pisos superiores, à primeira vista não se justificaria muito ter-se adicionado essa torre, certamente cara e complexa. A possibilidade que aqui tento investigar é se o seu objectivo teria sido o de permitir que as firmas instaladas no prédio daí vissem o mastro dos sinais. 
A FOTO 2 seguinte de Mary Light Meader e de 1937 mostra-nos ao centro-esquerda o prédio que marco a "laranja" (numa altura em que já não tinha a "clarabóia") e na margem direita estimo a posição do mastro dos sinais na "circunferência preta" (tendo em conta a praça e a Fortaleza aqui no Google Maps). 

FOTO 2 (clique para aumentar)
Laranja: telhado do prédio da "clarabóia" 
Verde claro: fachada principal do edifício da administração na estação de caminhos de ferro do lado a oeste da praça onde estava o "clarabóia"
Castanho claro: posição estimada do canto a SW da Fortaleza 
(aqui após a "reconstituição")
Circunferência preta: posição estimada do mastro dos sinais na segunda posição
Linha vermelha: linha de vista do prédio da "clarabóia" para o mastro dos sinais
Castanho escuro: Hotel Carlton donde foi tirada a FOTO 1 (ver NB 1 ao fundo)
Linha rosa: linha de vista da torre do Hotel Carlton 
para o mastro dos sinais (como na FOTO 1)
Roxo: secção mais a leste da ponte-cais Gorjão face ao estuário, construída a partir de 1902
Azul escuro: Hotel Central, na esquina a NE da Rua Araújo com Salazar / da Mesquita
Amarelos: par de prédios idênticos na Rua Araújo, actual Bagamoyo,
pelo menos um deles foi da DB Lands Syndicate
Verdes tracejado: limites da praça 7 de Março, actual 25 de Junho
Verde escuro: rua que na altura dividia essa praça a meio, 
na continuação da Rua Araújo, actual de Bagamoyo

No que se refere às distâncias, a partir da FOTO 1 podemos dizer que do Hotel Carlton já não seria muito fácil a olho nú distinguir por ex. as bandeiras no mastro dos sinais (olhando pela "linha rosa"). Ora a distância do "clarabóia" ao mastro (olhando pela "linha vermelha") era quase o dobro da do Hotel e para se poder ver os sinais teria sido preciso utilisar uma luneta, a qual poderia estar permanentemente colocada na referida plataforma.
No que se refere às linhas de vista, como se vê na FOTO 1 a "linha rosa" da torre do Hotel Carlton para a parte superior do mastro estava bem desimpedida. Quanto à "linha vermelha" a partir do "clarabóia" = "laranja" passava pelos prédios do Hotel Central "azul escuro" e por um dos "amarelos" que como são do tempo do "clarabóia" (digamos que de por volta de 1905) poderiam ter impedido a vista para o mastro e temos de considerar as suas alturas. Como esses prédios "azul escuro" e "amarelos" tinham dois pisos (mais o telhado por cima desse) é muito provável que do chão do último (terceiro) piso do "laranja" (sem a "clarabóia" ou "torre de observação") não se conseguisse ver a metade superior do mastro pelo que teria sido necessário colocar a "clarabóia" ou "torre de observação" para o conseguir. E teria sido seria assim tão importante assegurar essa "linha vermelha" desimpedida? Se o sector económico alvo para vender ou alugar escritórios no prédio da "clarabóia" fosse o das firmas ligadas à navegação (como parece ter sido) talvez o tivesse sido. 
Esta hipótese de ter havido relação entre a "clarabóia" e o mastro dos sinais poderá ser reforçada pelo facto deste ter deixado de ser usado entre 1925 e 1931 dado que o código dos sinais ainda aparecia no LM Directory de 1925 mas já não no de 1931. Ora esse período parece coadunar-se com o momento em que a "clarabóia" ou melhor o "posto de observação" foi desmantelado pois a partir desta foto publicada em 1929 pode dizer-se que ele no máximo existiu até esse ano.
Óbviamente não sabemos se houve ou não alguma relação entre todos esses elementos ou se foi uma simples coincidência que aqui detectamos, mas com estas hipóteses pelo menos abarcamos um pouco melhor tudo o que poderia estar em jogo na configuração da Baixa da cidade em relação às instalações do porto e caminhos de ferro.
Série completa aqui sobre o desenvolvimento do porto até ao início do séc XX.

NB 1: Olhando na FOTO 2 para a "linha vermelha" a partir do prédio da "clarabóia" = "laranja"  com um pouco mais de pormenor vê-se que: 
a. Essa linha passava ligeiramente à direita = para sul do prédio do Hotel Carlton "castanho escuro". Dado que este tinha três pisos se ele tivesse estado um pouco mais para a direita teria sido um obstáculo "intransponível" a partir do "clarabóia" mesmo com a plataforma e o mesmo aconteceria se o "laranja* estivesse um pouco mais para a esquerda "norte" = para o lado da esquina com a rua Consiglieri Pedroso. 
b. Mas olhando para as posições efectivas do "laranja" e do "castanho escuro" vê-se que a plataforma no "laranja" teria de estar pelo menos do centro para a frente da sua cobertura de modo a evitar o Hotel Carlton "castanho escuro". Coincidência ou não facto é que isso era respeitado, estado a "clarabóia" chegada para a frente dessa cobertura. 

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