Porto de LM, 1a doca: edifício do relógio e os muros na direcção N-S na zona (L/)

Prossigo a série sobre a estrutura antiga a que chamei Primeira Doca (PD) do porto de Lourenço Marques (LM), actual Maputo, e que foi referida em 1907 num artigo de revista como sendo a "doca das barcaças".
Ligarei neste artigo o que se tinha visto nas fotos de entre 1903 e 1907 de artigos anteriores (caso da MONTAGEM 1 do artigo G) à situação actual da área e olhando principalmente para os dois muros de vedação que foram levantados nessa altura que foram marcados na FOTO 2 dessa montagem a "azul escuro" e "azul escuro - carmesim". Na parte interna da esquina que eles formavam foi construído pouco tempo depois dessa fotos o edifício do relógio e como ele ainda está de pé serve de referência muito concreta às posições do que por aí existiu antes. Por exemplo vê-se aqui o edifício do relógio na esquina entre esses dois muros e pode-se confirmar ser essa a esquina NE da PD tendo em conta a sua posição olhando para esta foto do artigo A desta série.
Vejamos então a zona actualmente tomando como referência esse edifício do relógio (que parecendo que não tem uns 110 anos de vida) e que aparece aqui com o telhado vermelho e aplicando-lhe marcas relativas ao passado que vêm dos artigos anteriores sobre a PD e em que se falava da nova Ponte de Passageiros (PP) feita com a PD e do novo terrapleno que complementou esses trabalhos e referindo-nos à situação antecendente em que ainda se falava da PP inicial e da Plataforma do Cais da Alfândega (PCA) que vimos do lado de terra nas duas fotos deste artigoOutra referência na zona é a antiga rua Tavares de Almeida (Td'A) com a qual o limite a leste da PCA estava alinhado em terra firme mas dela falaremos com mais pormenor noutros artigos (rua Td'A):

MONTAGEM 1 (Google Earth actual com referências do passado 
e inserção de planta de 1925/26)
Circunferência azul: em torno do edifício do relógio
Azul escuro: posição de muro com vedação metálica, na direcção E-O, 
levantado onde tinha estado uma fiada de pedras durante os trabalhos da PD
Azul escuro-carmesim: posição de muro na direcção N-S, perpendicular ao anterior, construído onde tinha estado o lado a leste da PCA "carmesim"
Carmesim: lado a leste da PCA que no decorrer das obras da PD 
estava ainda parcialmente visível (mesma MONTAGEM 1 do artigo G)
Vermelho e branco: posição da berma a oeste, do lado da praça, da rua Td'A original
Castanho claro: limite a leste do terrapleno feito 
na sequência dos trabalhos para a PD (novo muro de suporte)
Laranja claro: estimativa da posição dum muro inicial na direcção N-S do tempo da PCA
Seta preta: corredor de acesso à Ponte de Passageiros inicial
Castanho escuro (quadrado): posição aproximada 
do antigo Capitania Building (DBDC na planta)
Mancha azul claro: canto a NW da Doca da Capitania

Quanto à "mancha azul claro" que aparece na parte inferior das imagens da MONTAGEM 1 ela não existia ao tempo da PD, de facto a sua construção que ocorreu cerca de 1915 esteve relacionada com o fecho da PD (ver NB 1 em baixo).
Para a imagem de GE de cima representar melhor o que lá existia cerca de 1904 faltaria a posição do segundo armazém do porto que esteve colocado logo abaixo da praça e sobre o que é agora a Av. M. de Inhaminga, situação que se pode ver nesta imagem com "rosa" no telhado. Esse armazém terá sido desmantelado pouco depois da PD ter sido construída mas nesta imagem ele ainda aparece para o fundo ou seja para norte da PD e a sul da praça, que aí estava escondida.
Pela posição do edifício do relógio que serve de ligação entre o passado e o presente pudemos então marcar na imagem de GE a posição do muro "azul escuro - carmesim" que ficava na direcção N-S e que com a conclusão das obras da PD passou a separar o recinto portuário própriamente dito do corredor público de acesso à nova PP da PD. Esse muro nos anos 50 ainda devia estar nesse sítio pois separaria aí o porto (cujo acesso era restringido aos funcionários e às visitas autorizadas) da parte da Doca da Capitania que era acessível ao público em geral. Pode ver-se essa zona restrita do porto cerca dos anos 50 neste artigo e por ex nesta foto vê-se a esquina entre os dois muros "azul escuro" em frente ao edifício do relógio e penso que ainda uma parte muro "azul escuro - carmesim" que seguia dessa esquina para sul. A entrada estreita e a entrada mais larga que estava da esquina para a esquerda = leste terão sido criadas ao tempo da construção da Doca da Capitania e para controlar o acesso a ela, note-se que essas duas entradas ficaram para leste da direcção do muro "azul escuro" original e cortando de Leste a Oeste o que tinha sido o novo terrapleno aí  criado com a PD e nova PP e que ia até à linha "castanho claro". Quanto à actualidade e pelo que se vê nesta foto, pelo menos a parte que fazia a esquina a NE do edifício do relógio desses dois muros foi derrubada, não sei se suas partes mais para sul e para oeste dessa esquina existirão ainda. 
Voltando mais para o passado, isto é à situação anterior à da PD, desse lado das instalações portuárias havia ainda a PCA com o seu limite "carmesim" e na borda da qual estava o corredor de acesso à PP inicial (seta preta na MONTAGEM 1). Era esse corredor que se via para NE na foto dos exilados boer de cerca de 1900 (anterior às obras da PD que só começaram depois de 1903) e que estava entre um muro "laranja claro" a oeste, que se vê nessa foto com grade de ferro no canto inferior esquerdo, e o limite da PCA a leste que estaria nessa foto à direita por onde se vê a última linha de pessoas. Na MONTAGEM 1 marco então a "laranja claro" aproximadamente onde teria estado o muro de vedação dessa foto e que separava o resto da PCA, que lhe ficava para a esquerda = oeste pois tinha o limite a leste na linha "carmesim", do corredor de acesso à PP inicial. 
Vê-se também esse corredor nesta foto também de exilados boer em situação semelhante mas vistos no sentido contrário. À direita neste segundo caso está o muro com grade e à esquerda = leste vê-se no limite da PCA uma protecção contra as quedas para o estuário, o qual estaria uns 4 a 5 metros mais abaixo do nível da PCA e seu corredor de acesso à PP inicial. Existe ainda esta foto que é também do tempo da PP inicial onde se vê para o fundo à direita (para SW) o muro com vedação metálica por cima que era o mesmo das duas fotos com os exilados boer.
Pode-se ver então na montagem seguinte as três referidas fotos mostrando o lado a leste da PCA da qual se vê o seu limite a leste onde estava o corredor de acesso de terra firme à PP inicial e o muro de vedação que dividia esse corredor das instalações portuárias do Cais da Alfândega que ficavam a oeste dele.

MONTAGEM 2 (clique para aumentar)
Carmesim: limite a leste da PCA inicial (no topo dum muro de suporte com 4 a 5 m de altura)
Laranja claro: muro com grade a oeste desse corredor e a leste das instalações portuárias
Branco: PP inicial (limite a leste na foto do canto superior direito 
e início do tabuleiro na de baixo)

Na foto do canto superior direito da MONTAGEM 2 não se consegue ter a certeza se a grade do muro era a mesma da das outros duas fotos mas pode ver-se que os candeeiros junto à linha "carmesim" eram pelo menos do mesmo tipo o que é mais um indicador de que é o mesmo local nas três fotos.
Saltamos agora de novo um pouco para o futuro, para o tempo em que tinham sido executados os trabalhos para a PD tendo sido aterrada uma faixa de estuário com uns 30 metros de largura para leste da linha "carmesim". Esse aterro foi daí até à linha "castanho claro" e ao fundo, a sul, da faixa assim criada foi construída a nova PP por isso para leste da PP inicial. Nessa latura foi então construído um novo muro para limitar o novo corredor de acesso à nova PP e é esse que marco a "azul escuro - carmesim" na MONTAGEM 1 (o muro do tempo da PCA e PP inicial era o "laranja claro"). Por alguma razão foi decidido que esse muro ficasse onde tinha sido o limite a leste da PCA e em consequência o novo corredor de acesso à nova PP ficou com uns 30 m de largo enquanto que o corredor inicial, tendo em conta o que se vê as 3 fotos da MONTAGEM 2, teria só cerca de 12 m de largura.
Já com a PD e nova PP concluídas, o que terá acontecido entre c. de 1903 e 1907, esse muro "laranja claro" do tempo da PCA passaria a estar dentro das instalações portuárias (pois o limite destas a leste tinha sido deslocado até à linha "carmesim") e por isso esse muro deve ter sido demolido nesse período. Esse muro inicial "laranja claro" já não se via nas fotos da MONTAGEM 1 do artigo anterior em que deveria aparecer para "dentro = oeste" do novo muro "azul escuro-carmesim" (confirmar isso na MONTAGEM 3 seguinte). 
O caso aqui explanado parece então bastante claro mas o historiador luso-moçambicano Alexandre Lobato (AL) escreveu no livro Xilunguíne de 1970 a respeito da foto do canto superior direito da MONTAGEM 2 (a FOTO 61 nesse livro) "ao longo da ponte de passageiros já em 1893 corria o gradeamento da vedação do porto, no limite que ainda conserva". O que nós concluímos agora neste artigo é que esse primeiro gradeamento tinha estado na linha "laranja claro" e que cerca de 1907 ele tinha desaparecido daí. Então quando AL escreveu esse livro o limite mais a leste do recinto portuário vedado estava na linha "azul escuro - carmesim" pelo que me parece que AL se equivocou numa distância duns 12 metros. Assim na MONTAGEM 3 seguinte, para se ver melhor a evolução dos muros na direcção N-S do lado leste do porto de LM, volto a usar uma foto que já vimos no artigo anterior e que será de 1906/07 a que junto uma foto de 1913. Ao tempo destas duas fotos a PD e a nova PP estavam concluídas, todavia ao tempo de AL tinha havido mais alterações na zona com o fecho da PD e a construção da Doca da Capitania (para a esquerda = leste da linha "castanho claro - verde" e do seu lado mais a sul) e que marquei na MONTAGEM 1 com a "mancha azul".   

MONTAGEM 3
Laranja claro: posição aprox.do muro que inicialmente limitava o recinto portuário a leste mas mas que c. 1907 e por isso ao tempo de AL tinha já desaparecido
Azul escuro - carmesim: o que passou a ser muro a leste 
das instalações portuárias depois das obras da PD
Círculo azul claro: onde foi construído o edifício do relógio (que devia existir
 ao tempo da foto de baixo em que estaria mais para a direita)
Castanho claro e verde: limites a leste das instalações portuárias e acesso à PP 
entre cerca de 1906/7 e 1915

Está assim explicado onde tinha estado em 1893 o "gradeamento da vedação do porto" na linha "laranja claro" e onde passou a ser o limite do porto a partir de 1906/1907 e se manteve até 1970 na linha "azul escuro-carmesim" e por isso o que parece ter sido um erro de avaliação de Alexandre Lobato.
Relembro que foi dito no artigo G que o terrapleno que surgiu na zona mais a leste das instalações portuárias e entre digamos 1903 e 1906 tinha os seguintes limites:
- a leste pelo muro de suporte a leste está marcado na MONTAGEM 3 a "castanho claro";
- a sul pela nova PP;
- a norte pela faixa com cerca de 5 m de largura que tinha sido aterrada sobre o estuário para S - SW da Fortaleza para possibilitar a construção do Capitania Buildings (CB) e 
- a oeste, mais do lado sul, pela linha "azul escuro - carmesim" por onde tinha estado o muro de suporte a leste da PCA e que do lado de terra se alinhava com a berma a oeste da rua Td'A (aqui seria na linha "carmesim" de cima). Note-se que para norte desse muro ou seja mais para o lado de terra passou a ser o cruzamento do prolongamento da rua Tavares de Almeida (Td'A) com uma nova avenida nova, que inicialmente foi chamada Teixeira de Sousa mas que depois terá passado a ser Cândido dos Reis e que ocupava o que tinha sido a faixa mais a norte da plataforma do Cais da Alfândega (PCA). Foi o terrapleno, essas novas vias e a parte a leste da futura praceta de António Enes que fizeram com que o muro de suporte a leste da PCA "azul escuro - carmesim" tivesse ficado soterrado entre 1903 e 1906/07.

Ver série completa no HoM sobre a primeira doca.

NB 1: Se o que desenhei na MONTAGEM 1 estiver exacto, para se abrir a Doca da Capitania ter-se-ia tido de desaterrar um pequena faixa que uns anos antes tinha sido aterrada nos trabalhos da PD. Essa faixa que terá voltado a ser aquática corresponde à parte da Doca da Capitania que vai da linha "castanho claro" para a esquerda = oeste até à superfície cimentada e que teria uma largura de cerca de 5 metros. Voltaremos a esse ponto no artigo seguinte.

NB 2: Quem depois da conclusão dos trabalhos da nova PP e da PD olhasse para o seu resultado do lado da Fortaleza para SW a partir de 1906 / 07, ou seja para o que se vê na MONTAGEM 3, não teria notado grande diferença em relação ao que existia antes e que se via na foto do canto superior direito da MONTAGEM 2 (e que eram o muro de suporte a leste da PCA e a PP inicial que se via aqui retro-implantada com o "L branco" na PD). De facto nesses dois casos aparece à esquerda junto à água um muro de suporte em alvenaria e para o fundo = sul desse muro uma ponte em madeira penetrando no estuário, mas como explicamos em cima estas construções não eram as mesmas e as da MONTAGEM 3 estavam uns 30 metros para leste das anteriores da MONTAGEM 2. Esses 30 metros seriam a distância entre a linha "azul escuro - carmesim" e a linha "castanho claro", os limites a leste das construções na zona portuária antes e depois das últimas construções. 

Comentários