Tal como no artigo anterior combinararei neste artigo fotos da Missão Suíça (DMO) que são disponibilizadas no site da Universidade Southern California (USC) com a "Descrição da Costa de Moçambique de LM ao Bazaruto" escrita por Guilherme Ivens Ferraz (GIF) e que se encontra aqui.
Essas fotos e o texto sobre o porto de Lourenço Marques (LM), actual Maputo serão mais ou menos relativos aos anos em torno de 1900 e no geral devem corresponder-se mutuamente. Começamos com uma vista do estuário do Espírito Santo, actual de Maputo para o lado da Matola com veleiros, vapores e certamente navios mistos aí fundeados. Esta foto é similar às duas primeiras do artigo anterior, principalmente a esta, aparecendo aqui o mesmo vapor da chaminé com as duas listas e mais distante o mesmo veleiro grande, dois navios que tinhamos ai destacado.
FOTO 1
Viajantes na baía (USC) |
Segue-se uma foto que presumo tenha sido tirada da praia na enseada da Maxaquene para o estuário e com a costa da Catembe ao fundo, aproximadamente de norte para sul. A mesma foto aparece com duas legendas na USC como está em baixo indicado:
FOTO 2
Photograph of ships in Maputo harbour (USC) Embarkation of missionaries (USC) |
A segunda legenda da foto de cima contém ainda o texto: "Swiss missionaries boarding a ship in Maputo Bay. In the foreground, the beach". As legendas da foto não acrescentam então muito ao que já se conhecia mas fica-se com a ideia de que para as viagens nas águas protegidas do estuário e da baía feitas nestas embarcações tradicionais o ponto de partida era a praia (de que vimos aqui a FOTO 1 mais próxima da Baixa cidade, a FOTO 2 um pouco mais para a frente = para NE e a FOTO 3 tirada mais longe da Baixa e no ponto da enseada mais para o interior) e não o porto que tomandom como referência esta FOTO 2 ficava para a sua direita / fundo, geográficamente para SW. Dessa zona e em local próximo da de cima podemos ver no site da DSC dos missionários suíços outra foto aqui olhando-se também para sul = Catembe, aqui, aqui e aqui um desses barcos tradicionais navegando para a Catembe e aqui um deles na costa da Catembe.
Por fim outra foto da DSC de pior qualidade mas com perspectiva interessante, aparecendo a costa da Catembe (Ponta Mahone) para o fundo do lado direito. Vê-se dois veleiros ou navios mistos pelo que dá ideia de ter sido tirada para SE da Baixa da cidade:
FOTO 3
Vista do estuário para a baía, aproximadamente de NW para SE |
Essa posição no estuário segundo o que GIF escreveu e a CARTA de 1906 mostrava devia ser para os navios de guerra, mas penso que não seria o caso da maioria dos navios nessa foto.
Passamos então a mais elementos sobre o porto de LM extraidos do relatório de GIF e que outros autores ou desconheceriam e/ou não lhes terão dado importância e que as fotos da época, por si só, não deixam ver.
"Pontes: Há em Lourenço Marques uma ponte para desembarque de passageiros illuminada de noite a luz eléctrica; a esta seguem-se a arruinada ponte da alfândega e a ponte do caminho de ferro que pouco valem; mais a montante, fica a antiga ponte da companhia do caminho de ferro Neerlandesa, que é melhor, e ao fundo do porto há a ponte do Syndicato Lingham, que é a melhor de todas. Actualmente está em construcção um cães acostável a grandes navios, entre as pontes do caminho de ferro e da alfandega."
Quanto ao aspecto da iluminação embora não seja seguro que fosse eléctrica, pode ver-se aqui a ponte da alfândega (PA) e aqui a ponte para desembarque de passageiros (PP) e constata-se que as duas tinham candeeiros, não era só a PP que os tinha.
Vejamos a carta de 1903 dessa zona do porto mas que representa ainda a situação de cerca de 1901 que GIF descrevia no relatório e que era anterior à construção nessa zona da ponte-cais Gorjão que estava só planeada
CARTA de 1903 (Salm)
Guilherme Ivens Ferraz (GIF) dizia que a PA estaria em mau estado cerca de 1902 e de facto passado pouco tempo ela desapareceu absorvida pela construção da nova ponte-cais (ver aqui ao fundo da primeira doca onde a PA tinha estado).
GIF fala também da ponte do caminho de ferro de que falámos no artigo 8 e da ponte holandesa de que falámos aqui e todas elas mais o local onde estaria a também referida ponte de Lingham estão representadas na carta seguinte do Arquivo Histórico Ultramarino de 1897 (a zona junto à Alfândega foi marcada com cores iguais à da carta de cima):
CARTA de 1897 do AHU (clique para aumentar)
Linha preta: Ponte de desembarque de Passageiros (PP), mas de facto não estava aí desenhada, deve ter sido posterior a 1987 Castanho claro: Ponte da Alfândega (PA) Carmesim: Cais da Alfândega, plataforma de alvenaria donde saíam essas pontes Circunferência preta: edifício da Alfândega antiga Rectângulo verde: praça 7 de março, actual 25 de junho Amarelo: embarcadouro ou desembarcadouro Rosa: cais num muro de suporte entre a PA e o embarcadouro ou desembarcadouro, ficava mais perto de terra firme que o Cais da Alfândega "vermelho" Castanho escuro: ponte do caminho de ferro Laranja: ponte ou cais holandês Vermelho: terreno de F. R. Lingham, mais tarde chamada zona das estâncias de madeira Rectângulo cinzento: espaço livre onde está agora o Mercado Central Rectângulo azul escuro: quartel do Alto-Maé Preto e branco: linha de caminho de ferro partindo da primeira estação (rectângulo preto) |
Como se pode ver na CARTA de 1897 a PA ficava na direcção mas para sul do lado oeste da praça 7 de março, actual 25 de junho. A PP ficava do lado leste dessa praça, digamos uns 100 metros para leste = nascente da PA. Ambas saíam da plataforma de alvenaria chamada Cais da Alfândega penetrando daí para o estuário mais profundo.
O embarcadouro ou desembarcadouro "amarelo" (que GIF não refere no relatório) seria uma pequena ponte colocada uns 150 metros para oeste da PA e que aparece nas FOTOS 3 a 5 deste artigo.
Quanto à ponte do Sindicato Lingham que GIF refere como sendo "a melhor de todas" não aparece desenhada na CARTA de 1897 mas é de supor que saísse do terreno marcado a "vermelho" para dentro do estuário. Como a carta é de 1897 até GIF ter publicado o seu relatório em 1902 pode ter havido essa e mais evoluções nos cais de LM e já referimos o início da construção da ponte-cais Gorjão que se pode ver na CARTA de 1903 onde estava planeada e aproximadamente acabou por ficar. Ela foi construída mais ou menos à profundidade de 8 metros e como na CARTA de 1897 está marcada a linha dos 10 metros podemos estimar que um pouco para cima dela = para norte = para o lado da praia estivesse a linha dos 8 metros e seria mais ou menos na direcção da extremidade da PA "castanho claro".
Continuaremos o tema no próximo artigo.
Série completa aqui sobre o desenvolvimento do porto até ao início do século XX.
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